Ao contrário do que habitualmente se apregoa, os exames
dão uma falsa imagem de igualdade de oportunidades. Isto, porque o sistema
meritocrático não se preocupa com os critérios e as consequências
da atribuição do mérito, sendo por isso urgente inverter
esta lógica e defender a avaliação multi-referencial. A
ideia foi defendida por Almerindo Janela Afonso no primeiro dia do seminário
"Avaliação e Formação: balanço e perspectivas",
que decorreu nos dias 8 e 9 de fevereiro na Faculdade de Psicologia e de Ciências
da Educação da Universidade do Porto, organizado em conjunto pelo
Centro de Investigação e Intervenção Educativas
e pela Associação de Desenvolvimento e Formação.
Aquele investigador da Universidade do Minho criticou ainda
o facto de a formação de professores ser centrada nas didáticas,
"porque o que interessa é o professor produtor de resultados", frisou,
para lembrar que o liberalismo (e, por isso, o Estado liberal) "está
apenas interessado em conectar a educação com as necessidades
da economia social". Por oposição, lembrou o falso discurso que
associa mais tempo na escola a maiores probabilidades de emprego. "Os jovens
sabem que isto é mentira", disse, para lamentar ser sobre os professores
que, como grupo mais vulnerável, "caem todas as críticas". Ao
longo da sua intervenção, Almerindo Janela Afonso tocou ainda
noutro ponto sensível, a criação de uma Ordem de Professores,
que apelidou de "simplista e perigosa".
Por seu lado, João Barroso, da Universidade de Lisboa,
advertiu para o facto de a avaliação não se compadecer
com uma visão dicotómica, afirmando que "não há
a boa e a má avaliação", podendo esta constituir-se, em
última análise, como um "excelente instrumento regenerador da
democracia". De acordo com este autor, a avaliação não
funciona por si só, podendo ter várias finalidades, das quais
se destaca o carácter político-simbólico da avaliação,
entendido como ritual de racionalização, que muitas vezes serve
apenas para dar "uma imagem de eficiência".
Barroso referiu-se ainda à variedade de processos que
podem enformar a avaliação, destacando a avaliação
participativa como forma de respeitar as perspectivas e interpretações
dos diversos actores nela envolvidos. Além disso, insistiu no facto de
a avaliação não se dever confundir com "processo de decisão",
lembrando que é preciso "dar voz aos avaliados", na perspectiva de que
o avaliador é apenas um "mediador". Uma "avaliação emancipatória",
a que se referiu Manuel Matos, baseada na construção da justiça,
que tende a introduzir um novo factor: a intersubjectividade. Caso contrário,
concluiu Matos, a avaliação "transforma-se num processo de indignação".
Para Rui Canário, da Universidade de Lisboa, a avaliação
assistiu a um processo de ascenção e queda meteórica, fruto
do paradoxo de se enfatizar a sua importância mas, ao mesmo tempo, ignorar-se
os seus resultados. Assim, na sua opinião a avaliação "não
tem por objectivo avaliar, mas antes legitimar políticas educativas".
Para ilustrar esta afirmação, Canário socorreu-se do exemplo
da experiência dos Territórios Educativos de Intervenção
Prioritária, cujo processo de acompanhamento e avaliação
não teve efeitos práticos e do qual se desconhecem ainda os resultados.
Canário referiu-se ainda ao papel actual da escola -
que "já não é uma escola das promessas, mas das incertezas",
pondo a tónica no facto de a questão central da educação
ser hoje "não um problema de meios, mas de fins". No final, um recado
para os professores, que na sua opinião só podem resolver o "mal
estar docente" se encararem os alunos como aliados e não como adversários.
"É preciso dar sentido ao trabalho escolar, e isso passa pela maneira
como encaramos os alunos. Não são projectos e políticas
educativas que farão a mudança".
Texto de Ricardo Jorge Costa (apoiado por Rogério
Ribeiro)
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