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Revogabilidades

Há no Código do Procedimento Administrativo um artigo o 141º, que tem uma epígrafe misteriosa: 'revogabilidade dos actos inválidos'. Neste como noutros mistérios existe sempre alguma utilidade. O caso é que temos vindo a descobrir as virtualidades desta norma e a obter alguns ganhos de causa quando a Administração pretende revogar algumas suas anteriores decisões, sejam por exemplo de integração em escalões, de posicionamento na carreira, de resultado de concursos ou coisas semelhantes.

Diz o nº 1 do dito artigo: 'Os actos administrativos que sejam inválidos só podem ser revogados com fundamento na sua invalidade e dentro do prazo do respectivo recurso contencioso ou até à resposta da entidade recorrida'. O que vale por dizer, no essencial, que os actos praticados pela Administração, mesmo quando sejam inválidos, ilegais, só podem ser por ela revogados dentro de um determinado prazo, qual seja concretamente o prazo de um ano. A evidência prática da norma torna-se patente quando um professor que tenha sido, por exemplo, integrado num determinado escalão há três anos atrás, recebe uma comunicação informando-o que essa integração foi incorrecta e que em consequência, não tem direito a progredir ao escalão seguinte quando esperava e até, quem sabe, vai ter que repor um dinheiro que recebeu antecipadamente.

A defesa, num caso desses, está exactamente em invocar que a Administração só podia ter revogado essa integração, mesmo que incorrecta, no prazo de um ano, pelo que, não o tendo feito, tal integração se consolidou e é agora, portanto, insusceptível de ser revogada. E a razão de ser de tal princípio resulta, antes de mais, de algum bom senso pretendendo-se assim estabilizar a situação jurídica e a expectativa dos interessados. Não pareceria defensável que Administração pudesse vir quando muito bem entendesse alterar anteriores decisões suas, invocando a respectiva invalidade (a qual, sublinhe-se, só a ela será imputável...), mesmo que já tivesse decorrido uma década sobre o acto em causa e ainda que daí resultassem (como provavelmente resultariam), consequências em cascata que seguramente afectariam o interessado. Mas por outro lado, há aqui também razões de reciprocidade em relação à posição dos interessados. É que estes quando pretendem reagir a uma qualquer invalidade que os afecte por via de um recurso hierárquico ou contencioso têm que o fazer dentro de um determinado prazo findo o qual o acto em causa se torna insusceptível de impugnação consolidando-se assim de forma em princípio, irreversível.

Daí que a regra imposta à Administração, numa maré normativa que pretendeu tutelar os interesses dos particulares e estabelecer alguma igualdade e reciprocidade de posições, estabeleça que a revogação de um acto inválido, por muito atendíveis que sejam as respectivas razões, também tem que ter regras e limites.

Rui Assis


  
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Autoria:

Rui Assis
Jurista
Rui Assis
Jurista

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