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Superiores Decisões

Uma questão frequente ao nível do pessoal docente do Ensino Superior diz respeito às decisões dos júris constituídos no âmbito dos concursos necessários à própria progressão na carreira. Um aspecto particular dessas decisões é que elas são irrecorríveis, excepto quando arguidas de vício de forma. É esse o sentido das normas do artº. 29º do Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico e do artº. 62º do Estatuto da Carreira Docente Universitária. Ambas dizem, concretamente, que só quando estiver em causa um vício de forma (ou seja, quando no processo decisório tiver sido preterida alguma formalidade essencial) é que será possível recorrer da decisão.

O sentido destas normas resulta da chamada discricionaridade técnica dos júris, a qual traduz uma realidade prática fácil de entender. Estando em causa apreciações de mérito supostamente baseadas em juízos de valor científico e pedagógico (traduzidos, por exemplo, no currículo apresentado pelos candidatos) bem se compreende que o júri disponha da dita discricionaridade, até porque muitas vezes nos situamos em áreas científicas muito específicas, relativamente às quais será impossível, por exemplo, que um Tribunal se possa pronunciar quanto ao nível científico ou pedagógico de um candidato.

O problema coloca-se quando essa discricionaridade técnica resvala para uma 'arbitrariedade pseudo-técnica'... E então podemos encontrar - podemos mesmo! - júris que excluem liminarmente candidatos alegando apenas que o respectivo currículo não reveste nível científico ou pedagógico compatível com a categoria a que concorrem. É evidente que decisões deste género confiam na citada irrecorribilidade!... Contando, para além disso, que ou o candidato consegue descortinar na decisão alguns dos tais vícios de forma ou não tem grandes hipóteses de reagir, por muito injusta, perversa ou arbitrária que ela seja.

Daí que me pareça que a moda da flexibilização que parece seduzir os processos de revisão dos Estatutos da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior (Universitário e Politécnico), acentuando tendências de desregulamentação, é um jogo pelo menos arriscado... Se já assim as coisas são como são e se já assim se encontram processos de concursos que são manifestamente utilizados como ajustes de contas entre coutadas...

Dando por assente que os júris terão que dispôr sempre de um poder discricionário de natureza técnica nos processos de apreciação e decisão relativamente aos candidatos a concurso, parece-me verdadeiramente imprescindível que se acentue a necessidade de expressa e cabal fundamentação das decisões proferidas no âmbito do tal poder, evitando-se assim que um júri considere que um candidato não tem nível científico tão só e apenas porque não tem nível científico, e vinculando-se os júris à finalidade de natureza institucional que deve presidir a tais processos decisórios. Só assim será possível minimizar os riscos da pura arbitrariedade e só assim será possível dispôr de um revelador para as situações de típico desvio de poder. E por isso julgo que este plano deveria ser objecto de alguma negociação.

Rui Assis

 


  
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Autoria:

Rui Assis
Jurista
Rui Assis
Jurista

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