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Ratio scripta

Faz ideia do que têm em comum os professores licenciados estagiários que não conseguiram ainda ver reconhecido o seu índice de vencimento, os professores que aguardam a contagem do seu tempo de serviço relativo ao ano de 74/75 e os professores aposentados que se viram, em dado momento, compelidos a trabalhar até final do ano lectivo?

Fique connosco, porque vale a pena ... Passo a explicar e garanto desde já que os três casos são merecedores de referência obrigatória num qualquer manual da arte ministerial de bem cavalgar todo o problema.

O ponto de partida é simples, como aliás convém. Nas três situações, os visados procuram, desde há um bom par de anos, ver reconhecido um direito que lhes assiste por via da consagração que encontram em normas concretas nas respectivas matérias. São questões que transitaram já de outros governos, foram discutidas e re-discutidas nos serviços do Ministério da Educação, foram também, em alguns casos, levadas a tribunal, com vantagem para os professores, obtiveram pareceres - igualmente favoráveis a estes - do Provedor de Justiça e até do Procurador-Geral da República!

Até aqui, a semelhança é completa mas a novidade não é nenhuma. O espantoso vem depois. Nos três casos, o Ministério da Educação descobriu uma nova forma de tratar a evidência! O M.E., perante a evidência que os anos só reforçaram, em lugar de reconhcer a razão dos professores em causa, entendeu por bem DAR essa razão aos professores...

E se assim o pensou, melhor o fez! O M.E., nos três casos e sempre através do S.E.A.E., resolveu a situação com um despacho, por via do qual, sensata e solenemente, dá razão aos professores em causa. Mas porque acha que a dá, e porque acha que tem o poder supremo de a dar, faz esta coisa notável: diz que o despacho só produz efeitos a partir daquela data, o que vale por dizer que quem andou anos a porfiar, fica a ver navios.

Ora o que importará reter desta sinistra história da carochinha é a autêntica fraude à lei por parte do M.E., que continua a achar que pouco importam as normas e os estatutos, assim como pouco importam os direitos que elas consagram. O que vale mesmo são os despachos, essa "ratio scripta" de qualquer governante que se preze, e os inúmeros problemas - até orçamentais, pasme-se! - que assim se resolvem... Mesmo que - como é o caso, nos três casos - o tempo já tenha resolvido grande parte dos problemas (excepto os orçamentais) e que, por isso, os despachos se destinem já a conjuntos vazios!

Ou que, como também é o caso - os ditos despachos só possam ter, patentemente, natureza interpretativa, daí resultando que só a imbecilidade jurídica permite sustentar a pretensa produção de efeitos. Os despachos não conferiram direitos nenhuns, porque esses já os professores os tinham há muito tempo!

Rui Assis


  
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Autoria:

Rui Assis
Jurista
Rui Assis
Jurista

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