Conclusões de um estudo sobre as razões da (não-)participação
A dissertação de mestrado que elaborei (Ricardo, 2006) foi dedicada à participação dos professores não-efectivos numa Escola secundária nas actividades que animam o Projecto Educativo de Escola (PEE). A sua pertinência poderá justificar-se através da elevada percentagem (30%) de professores não-efectivos existente representando uma enorme fatia no que respeita à animação de toda a vida escolar. São também "sempre os mesmos" levando-me a ter a pretensão de inferir os resultados para a generalidade dos professores não-efectivos, pois, como eles próprios referiram, "os problemas não se alteram ano após ano". A participação que se abordou foi a que envolveu, efectivamente, esses professores nas acções. Excluí-se assim a participação nas tomadas de decisão e/ou fazer-se parte de um órgão. Teve como objectivo principal tentar encontrar as causas e as motivações que os leva a envolverem-se nas actividades do Plano Anual de Actividades (PAA). Tentei perceber deste modo as motivações, o grau de envolvimento, assim como as razões evocadas por esses professores. Procurei ainda saber se nas actividades propostas existia a necessária coerência entre o PEE e o PAA. Foi usada uma triangulação entre a metodologia quantitativa e qualitativa com uma primeira parte da investigação a ser elaborada num contexto extensivo, "fotografando-se" a Escola e levantando-se as eventuais causas do problema. Estes primeiros resultados orientaram a segunda parte que teve um cariz mais etnográfico tendo em conta os objectivos do trabalho. Encontrei, assim, 12 razões que explicaram a "participação" e 28 razões a "não-participação". A participação foi justificada por: (1) possibilidade de se contabilizarem aulas através dessa participação (cursos profissionais); (2) "baixo rendimento dos alunos" permitindo que estes se interessem por outros motivos pois "só desta maneira é que mostram alguma alegria"; (3) aproximação aluno-professor criando-se uma espécie de tréguas; (4) "fuga às aulas" no sentido de descompressão; (5) gosto pessoal que têm em algumas particulares actividades; (6) sociabilidade que permite cimentando amizades recentes e "optimiza o clima"; (7) existir alguma ligação afectiva à Escola; (8) pedido que lhes é dirigido por parte dos colegas, solicitando-lhes ajuda, com frases do tipo "só participo se me convidarem"; (9) "existir algum interesse para os alunos, caso contrário, não participo"; (10) disponibilidade de tempo, pois alguns encontram-se fora de casa durante toda a semana, "ajuda a passar o tempo"; (11) facilitar no que respeita ao cumprimento dos conteúdos programáticos, pois só conseguem leccionar uma "determinada matéria em actividades fora de aulas, de outro modo não consigo"; (12) à "realização profissional" numa atitude de carácter ético.
Por outro lado, a não-participação justificou-se por: (1) não se considerarem "(?) pertença da Escola (?), estou de passagem", fazendo com que não exista qualquer ligação afectiva; (2) indisciplina e desinteresse dos alunos; (3) instabilidade profissional; (4) dúvidas levantadas sobre como o fazer em termos organizacionais dentro de cada departamento; (5) mal-estar provocado pelas exigências das novas tarefas emanadas pela recente legislação; (6) falta de tempo provocada com estas novas obrigações; (7) falta de tempo devido aos níveis exigentes que lecciona, pois os "programas não contemplam o tempo que se despenderia nessas actividades"; (8) falta de tempo para a família; (9) distância a casa provocando um "desgaste extra"; (10) mal-estar provocado por uma remuneração inadequada face "à importância do trabalho que desenvolvo comparativamente a outros sem tanto relevo"; (11) horários incompatíveis entre colegas de um eventual projecto impossibilitando o trabalho em equipa; (12) mau horário lectivo; (13) falta de locais sossegados na Escola; (14) clima relacional entre os professores não ser considerado o adequado; (15) falta de recursos materiais; (16) burocracia que essas actividades acarretam para as levar a efeito; (17) aulas que perderiam contrariando os compromissos de cumprirem os conteúdos programáticos; (18) muito trabalho que já têm na Escola; (19) departamento onde estão integrados ser considerado "sossegado" onde "não é exigida participação (...) e não vou ser eu a ter essa iniciativa"; (20) falta de divulgação das actividades; (21) dificuldade em integrar-se nas relações sociais da Escola; (22) consideração que fazem sobre os órgãos de administração e gestão quando dizem "que não conseguem impor ordem e disciplina nos alunos"; (23) má situação profissional em que se encontram; (24) colocação tardia na Escola; (25) terem feito propostas de actividades e o departamento não as ter inserido por dúvidas levantadas sobre a sua operacionalidade; (26) comparação que fazem com outros colegas, pois "se eles não participam, não vou ser eu a participar"; (27) não lhes é solicitado, pois "ninguém me pede nada"; (28) ineficácia produtiva de algumas actividades, não dando qualquer "gozo".
De realçar que, maioritariamente, as razões mais fortes para justificar a participação e a não-participação foram, respectivamente, as quatro primeiras e as três primeiras razões. Pode então considerar-se que os professores não-efectivos não participam nas actividades do PAA sendo que as motivações extrínsecas são mais determinantes que as intrínsecas no que respeita à participação. No entanto, existe uma pequena minoria que participa sem esperar receber qualquer recompensa material. Nesta problemática da participação, e apesar de se constatar que quando se planeia uma qualquer actividade não é verificada a coerência com o PEE, algumas conseguem enquadrar-se nesse projecto global, não sendo difícil obter-se uma relação para que essa inclusão seja conseguida. Em jeito de descobertas marginais, constatou-se que a indisciplina dos alunos e o aparente desinteresse destes, estão na base de grande parte do mal-estar docente. A distância a casa surge como um factor importante no que respeita à não participação e também, em menor grau, à participação. Surge, ainda, como um factor de desmotivação para todas as funções docentes. Outro dos aspectos, que se verifica não existir, é a formação de apoio face aos novos paradigmas: formação ao nível da planificação e avaliação de projectos, ao nível administrativo (de forma a saber-se estar nos órgãos colegiais através da clarificação das suas competências) e ao nível de saber lidar com a indisciplina dos alunos. A este respeito e numa lógica de "poupar" os professores, os processos disciplinares deveriam ser mais céleres de modo a não se arrastarem por reuniões infindáveis. Parece-me que enquanto os professores ocuparem o seu tempo com irracionalidades burocráticas não se dedicarão a outras actividades que lhes dão mais gozo e que mais valorizam, como por exemplo, preparar e dar aulas. Falta também uma maior atribuição de responsabilidade. Exagera-se na tal irracionalidade burocrática quando qualquer decisão de menor importância tem de passar por vários órgãos a fim de ser ratificada. É necessário dar mais "voz" aos professores não-efectivos e aproveitar todo o seu potencial de conhecimento adquirido com a experiência da passagem por inúmeras escolas. Conhecem as virtudes e os defeitos dos outros. Têm uma visão liberta da actual escola apercebendo-se melhor das "rachadelas na parede" que "os da casa" ignoram ou não conseguem ver. A grande maioria não vive na cidade onde trabalha devendo haver alguma compreensão no que respeita à distribuição de horários e tarefas, pois, têm os salários mais baixos da Europa não lhes permitindo fazer grandes e/ou muitas viagens.
Referência bibliográfica
- RICARDO, Luís - A Participação Obrigatória na Escola ? Perspectiva do Professor Não-efectivo. Porto: Universidade Portucalense (diss. mestrado policopiada), 2006
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