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Narrativas e conhecimentos tecidos nos cotidianos

Nos caminhos que percorremos onde achamos que nossas escolhas são de nossa inteira responsabilidade, situações que fogem ao nosso controle acontecem e descobrimos ou reconhecemos caminhos diferentes. Uma dessas situações que vivenciamos ocorreu durante uma entrevista feita para um projeto de monografia de conclusão do curso de Pedagogia.
Nosso intuito era conversar sobre a influência das aulas que essas alunas participaram no curso de formação de professores em um componente curricular que se chama PPP (Pesquisa e Prática Pedagógica).
Dentre os diversos assuntos abordados durante a gravação, tais como as dificuldades em entrar para a universidade, permanecer nela e os desafios que se colocam diante de nós à saída do curso, a pessoa que entrevistávamos lembrou do que aconteceu com sua família durante seu curso de graduação: um dia, conversando com sua mãe, sua maior incentivadora e mantenedora, se deu conta de que ela ainda não sabia ler e escrever. Diante desta descoberta, nossa entrevistada nos contou que seus sentimentos foram muitos - um misto de vergonha e constrangimento quando, junto com seus irmãos, percebeu que apesar de alguns estarem na universidade, apesar dela e sua irmã serem professoras, sua mãe ainda não sabia ler e escrever.
Eis o desafio que essa colega, nossa entrevistada resolveu enfrentar! Alfabetizar sua mãe que trabalhava diariamente como 'camelô' ? vendedor ambulante de rua - de 8 às 22 horas. Impressionou-nos a narrativa de como trabalharam e da força de vontade de sua mãe. Todos os dias ela propunha atividades a sua mãe para que resolvesse durante o período em que trabalhava, na rua. Nossa entrevistada nos disse que, a cada dia, quando chegava da faculdade (por volta das 23 horas), sua mãe já estava dormindo, mas tinha deixado, ao lado do dinheiro da passagem de ida e volta à faculdade, o caderno para que ela fizesse a correção dos exercícios feitos e para que elaborasse outros exercícios para serem feitos no dia seguinte, nas mesmas condições. Aos domingos, seu único dia de folga, as dúvidas que surgiram durante a semana eram esclarecidas e iniciava-se um novo ciclo.
Atualmente, depois de mais de um ano, sua mãe compra jornais e revistas e mantém os filhos atualizados sobre as notícias que lê. Além disso, ela está ansiosa para votar nas próximas eleições pois pela primeira vez assinará seu nome durante a votação.
Para nós, muitas foram as aprendizagens durante este processo. Histórias de vida narradas, histórias de luta, tristezas, alegrias que são silenciadas, esquecidas e que nos traz à reflexão a respeito de como os conhecimentos são tecidos nos cotidianos e nos múltiplos contextos de nossa formação (ALVES,1998).

Referencias bibliográficas

  • ALVES, Nilda. Trajetórias e Redes na formação de professores. Rio de Janeiro: DP&A,1998.
  • CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano - artes de fazer. Petrópolis: Vozes, 1994.

Isabel Machado
Maria Cecília Castro


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 179
Ano 17, Junho 2008

Autoria:

Isabel Machado
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Laboratório Educação e Imagem (www.lab-eduimagem.pro.br). "As redes de conhecimentos em educação e comunicação: questão de cidadania".
Maria Cecília Castro
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Laboratório Educação e Imagem (www.lab-eduimagem.pro.br). "As redes de conhecimentos em educação e comunicação: questão de cidadania".
Isabel Machado
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Laboratório Educação e Imagem (www.lab-eduimagem.pro.br). "As redes de conhecimentos em educação e comunicação: questão de cidadania".
Maria Cecília Castro
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Laboratório Educação e Imagem (www.lab-eduimagem.pro.br). "As redes de conhecimentos em educação e comunicação: questão de cidadania".

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