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Qual é a melhor forma de avaliar?

A pertinência da realização de exames nacionais no final do ensino básico e do ensino secundário tem sido alvo de um intenso debate. Afinal, os exames são ou não a melhor forma de avaliar as aprendizagens dos alunos? E contribuirão, de facto, para a melhoria do sistema educativo? As opiniões sobre esta matéria naturalmente divergem.
Para tentar perceber o que pensam alguns dos principais actores educativos em Portugal, a PÁGINA recolheu depoimentos da Confederação das Associações de Pais e das associações de professores de Matemática e Português, bem como declarações retiradas da imprensa do primeiro-ministro, José Sócrates, e da ministra da tutela, Maria de Lurdes Rodrigues.
Destaque ainda para um depoimento de Santana Castilho, professor da Escola Superior de Educação de Santarém, e para uma entrevista com Almerindo Janela Afonso, professor da Universidade do Minho.

Opiniões sobre exames nacionais divergem

A primeira fase dos exames nacionais do 12º ano decorreu até ao início deste mês. Mais de 96 mil estudantes estavam inscritos nos exames regulares do final do ensino secundário, 56 mil alunos do 11° prestaram provas em disciplinas bienais, aos quais se juntaram cerca de 24 mil provenientes dos ensinos profissional, técnicoprofissional, recorrente, vias profissionalizantes e equivalências. Esta foi a primeira vez que foram postos à prova os novos currículos do ensino secundário, iniciados em 2004/2005, e que se experimentou um novo modelo de avaliação.
No 9º ano, foram cerca de cem mil os alunos que prestaram provas de conclusão do ensino básico. Introduzidos no ano passado, os exames vieram substituir as provas de aferição e valeram 30 por cento para a classificação final dos estudantes às disciplinas de Português e de Matemática, mais 5 por cento do que no ano lectivo anterior.
De acordo com o Ministério da Educação, os novos exames pretendem que a avaliação externa dos alunos deixe de ter como referência um ?conjunto de competências de ordem geral? para se centrar no conjunto de ?competências específicas que melhor definem o percurso realizado pelo aluno ao longo do ensino secundário?.
Independentemente dos novos pressupostos que orientam este conjunto de provas, um número significativo de professores e de investigadores defende que a realização de exames não corresponde necessariamente a uma avaliação mais rigorosa das aprendizagens e consideram mesmo contraproducente pretender avaliar o trabalho desenvolvido ao longo de todo o ensino secundário através de uma única prova.
Também os pais e encarregados de educação, através da Confederação das Associações de Pais (CONFAP), defendem o fim dos exames no ensino secundário e o regresso das provas de ingresso feitas pelas próprias universidades.
Essa, pelo menos, é a opinião expressa pelo ex-presidente desta estrutura associativa, Albino Almeida, que ainda recentemente afirmava que ?os exames nacionais a três disciplinas específicas são um mal menor que se deve manter enquanto o ensino superior não criar provas de admissão?.
A PÁGINA procurou ouvir a nova presidente da direcção da CONFAP, Maria José Viseu, mas os contactos revelaram-se infrutíferos. Perante esta impossibilidade, optamos por citar este ex-dirigente, que reclamava igualmente um ensino secundário ?terminal e certificante? assente em ?provas finais internas?.
No mesmo sentido, a Associação de Professores de Matemática (APM) defende que os exames estão fundamentalmente associados a uma função de ?seriação e de exclusão?.
Apesar de reconhecer que nem todos os associados da APM se possam rever nesta afirmação, Isabel Rocha, presidente desta estrutura associativa, refere o exemplo dos exames do 9º ano às disciplinas de Português e de Matemática para dizer que estes ?põem em causa a própria lógica de ciclo e de integração curricular que está previsto no currículo nacional.?
?É um processo que nos parece contraditório com os princípios que orientam o currículo, em que se dá um grande valor à avaliação formativa enquanto processo regulador. Os exames podem continuar a existir se o ministério considerar que existem outras funções para o exame, mas eles não ajudam à resolução dos problemas com que se confronta a disciplina?, diz Isabel Rocha.
A APM é, no entanto, favorável à realização de provas de aferição no final do ensino básico e secundário que ajudem as escolas a reflectir sobre os resultados obtidos, diagnosticar os problemas dos alunos e procurar resolvê-los através de estratégias concertadas. ?Excluir os alunos através de exames é que não resolve o problema?, conclui.
A Associação de Professores de Português (APP), por seu lado, afirma num parecer disponível na sua página da Internet que ?não é aceitável que se considere um exame nacional como o instrumento que garante que todo o programa é ensinado pelos professores e que garante que mais programa é aprendido pelos alunos?.
?As melhores garantias?, diz ainda a APP, ?parecem-nos poderem ser dadas pela diversificação dos instrumentos de avaliação ao longo do ciclo de ensino, por uma formação inicial adequada baseada em perfis pré-definidos, por uma formação contínua de professores regulada pela avaliação das suas necessidades e do impacto dessa formação nas aprendizagens dos alunos, pela selecção de manuais complementada pela sua certificação prévia, pelo cumprimento dos programas, por melhores equipamentos e por turmas mais pequenas.?
No entanto, a APP admite que, no quadro do acesso ao ensino superior, sejam realizados ?exames de admissão que garantam que todos os candidatos são sujeitos a um mesmo crivo e que todos têm alguns dos conhecimentos e competências considerados indispensáveis pelo ensino superior.?
Apesar de se ter pronunciado favoravelmente pela manutenção do exame final de Português no 12º ano ? contrariando a intenção manifestada pelo Ministério da Educação e pela APP -, o Conselho Nacional de Educação (CNE), em parecer emitido no final do ano passado, afirma que ?mais do que a avaliação sumativa externa, é o reforço da qualidade das práticas de ensino e de aprendizagem que pode garantir adequados níveis de desempenho por parte dos alunos."
Referindo-se em concreto aos exames do 12º ano, o CNE afirma que ?sempre tem defendido a necessidade de salvaguardar a identidade do ensino secundário, separando-o dos mecanismos específicos de acesso ao ensino superior.?
No entanto, nem todos partilham destas opiniões. A começar pelo próprio governo. No discurso proferido pelo primeiro-ministro no debate mensal na Assembleia da República, exactamente há um ano, José Sócrates afirmava estar ?bem consciente da importância dos exames para a avaliação do sistema educativo e para o percurso escolar de cada um dos alunos.?
A ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, reconheceu numa entrevista à revista Visão de Junho último serem ?necessários instrumentos de avaliação, como as provas de aferição (...) ou os exames.? Tudo, afirmou, como forma de ?monitorizar a qualidade do sistema de ensino.?
Numa outra entrevista ao Diário de Notícias, a ministra admitia, no entanto, que ?os exames são concebidos em função das necessidades do acesso ao ensino superior? e que tal situação ?não pode acontecer?.
Nuno Crato, presidente da Sociedade Portuguesa de Matemática e autor de ?O Eduquês em Discurso Directo?, assume-se como um dos principais críticos da ?ideologia romântica? que, na sua opinião, ?acabou com o rigor das escolas?.
Numa entrevista publicada na revista ?Sábado?, Nuno Crato afirmava que a progressiva extinção dos exames ao longo dos diferentes ciclos ?baixou os níveis de exigência?.
Para inverter esta tendência, Crato defende que ?os exames do 9.º ano devem regressar nas disciplinas todas? e que ?deve haver outros, anteriores; se não na 4.ª classe, pelo menos no 6.º ano", defende este professor, para concluir que ?só num sistema competitivo o ensino pode melhorar.?
Também num artigo de opinião redigido para este dossier, Santana Castilho, professor do ensino superior e director da revista ?Pontos nos ii?, defende que, apesar de existirem desvantagens num sistema de classificação, como é o exemplo dos exames, eles constituem um ?elo de ligação e de certificação insubstituível entre a escola e a restante sociedade.?
Manifestando uma posição contrária, Almerindo Janela Afonso, professor da Universidade do Minho, refere que ?os exames nacionais não são, nem podem ser, a única forma de avaliar os conhecimentos dos alunos, nem são, nem podem ser, a forma mais adequada de avaliar o próprio sistema educativo? (opiniões para ler neste dossier nas páginas seguintes).


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 158
Ano 15, Julho 2006

Autoria:

Ricardo Jorge Costa
Jornalista do Jornal A Página da Educação
Ricardo Jorge Costa
Jornalista do Jornal A Página da Educação

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