Página  >  Edições  >  N.º 152  >  Articular, clarificar e formar

Articular, clarificar e formar

Educação especial

Na altura em que escrevo está iminente a criação de um quadro de docência na área da Educação Especial. Uma medida que, na sua essência, é pacífica, pois faz parte dos anseios dos professores desta área há muitos anos. Chegados a este ponto terá que se definir um modelo de Educação Especial, um conjunto de conceitos e a respectiva operacionalização, pois não podem manter-se os desencontros entre os diversos diplomas legislativos, que hoje começam a ser mais um entrave no trabalho diário nas escolas, do que propriamente um conjunto de soluções.
O Decreto Lei 6/2001 que define Necessidades Educativas Especiais, mas de Carácter Prolongado, NEECP, remete para regulamentação que nunca chegou a sair, criando uma situação de limbo, onde reinam as interpretações muito diversas sobre o objecto, os intervenientes e as medidas da Educação Especial.
Por isso, é fundamental definir de forma inequívoca pelo menos sete pontos essenciais:
1- Deixar muito claro que Portugal é um país onde se pretende construir uma Escola Inclusiva, aberta a todos os alunos sem excepção e onde a escola pública regular é o espaço dessa construção. Nenhuma criança deve ficar de fora da rede de pré-escolar e do ensino básico, não sendo admissível olhar alguns alunos como um ?corpo estranho? com um dossier paralelo.
2- Estabelecer a articulação com todos os diplomas legais que consubstanciaram as mudanças no sistema de ensino em Portugal nos últimos anos, sem deixar espaço para ambiguidades, duplas interpretações ou ?pontas soltas?. Que fique claro o que é a Educação Especial, a quem se destina, como se põe em prática no actual panorama educativo e quem a vai levar a cabo.
3- Clarificar quais as medidas e recursos ?especiais? a implementar e como estas se articulam, quer com o currículo comum, quer com o sistema de avaliação, quer ainda com as outras medidas de flexibilização e apoio pedagógico entretanto já legisladas.
4- Equacionar a reformulação da Portaria 1102, possibilitando as parcerias com uma rede mais vasta de organismos locais com vista à criação de equipas multidisciplinares, definindo a participação nas escolas de técnicos de intervenção específica, incluindo os Serviços de Psicologia e Orientação.
5- A definição de NEECP, carece igualmente de regulamentação, como por exemplo: o que são graves problemas cognitivos ou emocionais, quem avalia a ?gravidade?, quem decide em última instância e com que critérios.
6- E as ECAE?s são estruturas para funcionar em que moldes e com que poderes? Com as recentes alterações introduzidas no Despacho Conjunto 105/97, o seu papel de formação, gestão e supervisão técnico-pedagógica parece reforçado. Embora a prática recente tenha demonstrado que esses ?poderes?, nomeadamente do ponto de vista técnico-pedagógico, continuam a ser muito voláteis quando confrontados com alguns órgãos de decisão das escolas, onde, por vezes, o conhecimento na matéria não é proporcional ao imenso e inquestionável poder de decisão, com prejuízos óbvios para os alunos. Quando estão em causa os interesses dos alunos e suas famílias, por vezes não chega a ?colaboração? e a ?diplomacia?, há que estabelecer uma correspondência entre responsabilidade técnico-pedagógica e capacidade efectiva de intervenção e decisão.
7- Para qualificar o sector torna-se essencial reflectir a formação dos docentes, quer inicial, quer especializada.
Desde logo deve ser definido qual o perfil para o docente especializado, que competências deve ter e também quem estabelece os critérios dos cursos, os aprova e os avalia.
Está por saber, embora a prática recente não nos tranquilize, se a proliferação de cursos de especialização, contribuiu para uma melhoria na capacitação dos docentes de Educação Especial.
Por outro lado os cursos iniciais devem, desde logo, prever uma preparação dos futuros professores do ensino regular para uma escola heterogénea e para as dificuldades diversas dos alunos. Não são os docentes do ensino regular, em primeira linha, os responsáveis e os principais educadores dos alunos com Necessidade Educativas Especiais?
Ora se a Inclusão é a permanência de todos os alunos nas escolas e nas turmas regulares, então não é apenas uma questão da Educação Especial, mas que deve contaminar de forma transversal todo o sistema ensino, devendo ser claro o papel de todos os professores neste processo. Grande parte das soluções para a Inclusão das crianças com NEECP residem no ensino regular no seio da turma. A Escola Inclusiva nunca poderá ser construída de fora para dentro. Medidas como, por exemplo, a flexibilização do currículo para uma oferta mais diferenciada, a formação dos docentes do regular, a redução de alunos por turma, o ensino em parceria, a par de uma diferenciação pedagógica na sala de aula; são muito mais importantes para promover a Inclusão, do que propriamente a presença de um docente especializado.


  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Edição:

N.º 152
Ano 15, Janeiro 2006

Autoria:

Jorge Humberto Nogueira
Mestre em Educação Especial
Jorge Humberto Nogueira
Mestre em Educação Especial

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo