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Universidade Popular do Porto Saber sem diploma

A "turma" acomoda-se para assistir à aula de Viver em Forma. Sérgio Vinagre, cuja vida profissional se move na área da Medicina é o "professor". O burburinho das conversas entre os "alunos" ainda se ouve quando Sérgio, aproveitando os ânimos, pergunta se há algum tema que a "turma" queira discutir na "aula". Uma voz sobressai. "Como é possível ainda existirem sobreviventes tantos dias após a tragédia do tsunami". No quadro Sérgio escreve a palavra sobrevivência.
Com 25 anos de existência, a Universidade Popular do Porto é, nas palavras do também director da instituição, Sérgio Vinagre, "a experiência com maior longevidade e actividade" na sua área de intervenção. Espaço de ensino não formal as universidades populares nascem com o objectivo de corresponder às necessidades de aprendizagem da época. A sua origem histórica aparece associada aos movimentos sindicais e operários do século XIX. Sempre ligadas à ideia de democratização do acesso ao ensino estas "organizações de pessoas" reuniram intelectuais e operários.
"Designaram-se universidades porque o seu objectivo foi sempre o de colocar o conhecimento, ao mais alto nível, ao dispor das pessoas, independentemente da sua formação de base", explica Sérgio Vinagre. Essa diversidade de formações, para o director da UPP, "aumenta a responsabilidade em termos científicos de quem organiza e desenvolve o curso". O formador ou dinamizador, nomes que substituem a designação de "professor", conta com os conhecimentos dos "alunos" para a construção de novos saberes. O que leva Sérgio Vinagre a concluir que "o êxito de qualquer curso dependerá das próprias participações dos alunos e da sua autenticidade".
"Quem sobrevive?", questiona Sérgio deixando o quadro branco onde escrevera a palavra-chave da aula. A turma irrompe em discussão. "Os mais bem nutridos", atira um aluno. E logo alguém acrescenta: "Mas não os mais gordos?" Em poucos minutos surgem mais variáveis que supõem a sobrevivência. "Resistência física, capacidade de adaptação?" Sérgio vai registando tudo no quadro deixando os alunos à vontade para dizer o que pensam. E quando parece consensual que "resistem os mais saudáveis", Sérgio comenta: "Um indivíduo com um metabolismo como o do diabético aguenta mais a fome". A discussão está relançada.

Necessário mas não creditado

O ensino não formal tem de corresponder às necessidades das pessoas. É desta ideia que parte toda a acção de ?militância cultural? da UPP. O leque formativo varia. Os cursos podem consistir em acções específicas e elaborados a pedido de organizações, nomeadamente sindicatos, ou autónomas, partindo da universidade para os mais diferentes públicos.
Aos alunos não lhes é dado nenhum diploma ou certificação que reconheça as competências adquiridas nos cursos. As acções de formação não são creditadas: ?Não queremos que o papel tenha um reconhecimento externo, se não haveria uma alienação da própria acção em si que seria vista só como algo para pôr no currículo?, comenta Sérgio Vinagre. Pelos mesmos motivos não é feita qualquer tipo de avaliação. ?Nos cursos não existem professores e alunos, mas uma equipe de pessoas que junta e desenvolve no tempo previsto uma formação de forma autónoma, podendo alterar o método usado para melhor atingirem os objectivos propostos.?
A propósito da não acreditação das formações, Sérgio Vinagre lamenta o facto de professores serem ?obrigados? a acumular créditos com a formação. ?Notamos que as pessoas deixaram de procurar a UPP.? O mesmo se passa com os jovens: ?A pressão do mercado de trabalho aumenta a procura de diplomas.? E numa acção em especial de ensino do português a imigrantes, a regra quebrou-se. A certificação impunha-se ?para garantir a oportunidade de emprego em iguais circunstâncias com quem aprendeu o idioma pela via formal?, esclarece. No entanto, o director da UPP insiste que a lógica da formação em virtude das necessidades do mercado deve ser contrariada. ?A educação tem de ser permanente mas sempre em função da pessoa e da cidadania.?


  
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Edição:

N.º 142
Ano 14, Fevereiro 2005

Autoria:

Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação
Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação

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