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Diário de um jogador de piões

O meu nome é João Pedro Oliveira dos Santos. Tenho seis anos e ando no infantário. O meu melhor amigo é o Tiago. Gosto muito de jogar os piões com ele. Mas a minha educadora não quer que os meninos brinquem com os piões porque eles rodam de força e podem magoar. É mesmo duh!!! A minha mãe compra-me os piões nos chineses. Eu tenho mil piões em casa. Agora na minha rua há uma loja de chineses mas eles não vendem piões.
No outro dia fui à médica e ela disse que eu estava gordochinho e ralhou à mãe. A mim disse-me para não comer lambarices. Agora não posso comer pudins flan nem batatas fritas dos pacotes. Mas é só até ficar magrinho. A médica disse também que eu devia ir para a piscina. Mas o meu pai diz que ela é rica e ele não.
Para o ano eu já vou para a escola. O meu vizinho André já anda na terceira classe. Eu sei fazer o A e o N e já conto muitos números. Mas o André diz que isso é pouquinho. E que na escola dele ele teve de aprender muitas mais coisas. Muitas letras, muitas contas? Eu vou dizer à minha mãe que não quero ir para essa escola do André. Gosto mais de fazer desenhos. Gosto de desenhar o Dálmata, o Rex, o cão polícia, e o coelhinho da Páscoa.
Dantes eu não era amigo do André. A minha mãe não gosta muito da mãe dele. Diz que ela não é boa da cabeça. Mas o André vem sempre jogar futebol para o meu corredor e a minha mãe tem pena dele estar ali sozinho e deixa-me ir brincar com ele. O meu pai é que não pode saber. Se o meu pai sabe mata a minha mãe. Ele não gosta que eu esteja no corredor a gastar a luz do prédio. A minha sorte é que ele está sempre para fora. Quando ele está em casa eu digo que não gosto do André. Mas é a fingir. O André é muito meu amigo. Deixa-me brincar com os piões dele e ensina-me a marcar golos.
Quando o meu pai está e casa eu vou com ele e com a minha mãe ao café. O meu pai precisa de ir todos os dias ao café comprar tabaco. Eu gosto muito de ir ao café. Tenho lá uns amigos que jogam comigo aos piões. E no Verão como sempre um gelado. Os gelados não engordam.
Os meus avós já morreram todos. E quando os meus pais morrerem eu vou ficar com a Lola. Gosto muito da comida que ela faz. Quando chego do infantário vou sempre para casa da Lola. A minha mãe diz que ela tem mais paciência para me aturar porque o filho dela já é grande.
O filho da Lola chama-se Jorge e já trabalha. Ele é muito meu amigo. Brinca comigo. Deixa-me mexer no computador. E leva-me a passear no parque da cidade nos fins-de-semana. O Jorge diz que quando eu for grande vou ser muito inteligente, como ele. E que vou ganhar muito dinheiro, como ele. E ter um carro, como ele. Se eu tiver muito dinheiro, quando for grande, vou à China e compro um camião cheio de piões.
O Jorge também diz que eu vou ter muitas mulheres, como ele. Mas eu acho que não quero assim tantas. No infantário, a Bia, as gémeas e a Bruna andam sempre atrás de mim. E eu tenho de fugir porque elas são muito chatas. A Bruna gosta muito da minha t-shirt do Harry Potter. Foi a Lola que me deu essa t-shirt nos meus anos.
Quando eu for grande quero ser pai. A minha mãe diz que um dia que eu queira ter filhos tenho de pedir à minha namorada. A Bruna anda sempre a dizer que é minha namorada. Então amanhã eu vou-lhe pedir para ela ter um filho para me dar. Quero um filho muito magrinho. E inteligente, como eu.


  
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Edição:

N.º 135
Ano 13, Junho 2004

Autoria:

Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação
Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação

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