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A Escola da Ponte?

OS RESULTADOS DA AVALIAÇÃO EXTERNA FEITA Á ESCOLA DA PONTE COMPROVAM A EXCELÊNCIA DO TRABALHO REALIZADO. OS PAIS DAS CRIANÇAS DEFENDEM-NA. OS PROFESSORES SENTEM-SE DEFRAUDADOS. O QUE JUSTIFICA A DECISÃO MINISTERIAL?

Porque é que o Ministério da Educação pretende impedir todas aquelas crianças da Escola da Ponte, que irão transitar para o 3º Ciclo, de prosseguirem aí o seu percurso escolar, desrespeitando o compromisso anteriormente assumido perante um projecto que desde o início se encontrava assim configurado ?
Os resultados da avaliação externa a que a escola foi submetida comprovam a excelência do trabalho realizado. Os pais das crianças defendem-na de forma devotada. Os professores sentem-se defraudados apesar do intenso trabalho que aí desenvolvem quer com os alunos quer ao nível do conjunto das tarefas de gestão curricular e pedagógica que são obrigados a assumir num projecto de intervenção educativa tão inovador e exigente como aquele em que se encontram envolvidos. O que é que justifica então, face a este cenário tão prometedor, uma tal decisão ministerial ?
Não é este ministério, que agora não se coíbe de espezinhar a opinião e a vontade dos encarregados de educação, o mesmo que no ano passado, a coberto de tal opinião e de tal vontade, protagonizou uma campanha de descrédito contra as educadoras de infância ? Não é este o mesmo Ministério que proclama a excelência académica como objectivo da sua política educativa mas ignora napoleonicamente o processo de avaliação a que a Escola da Ponte foi submetida? Porque é que o Ministério que acusa os sindicatos de impedirem a avaliação dos professores e das escolas não utiliza, neste momento, a experiência da Ponte para afirmar e demonstrar a justeza da perspectiva que defende ? Porque é que esse mesmo Ministério, sempre disposto a acusar os sindicatos de impedirem uma abordagem mais flexível do processo de colocação dos docentes, não aproveita o facto de uma parte dos professores da Escola da Ponte terem o estatuto de requisitados para demonstrar como uma política menos burocrática a esse nível poderia gerar efeitos educativos mais positivos ?
Se fôssemos ingénuos estaríamos boquiabertos com a inépcia de uma equipa ministerial que não costuma desprezar oportunidades destas para fazer de conta que governa em função dos interesses dos portugueses e do país. Como não somos, só nos resta constatar a perturbação dessa mesma equipa perante uma experiência isolada de sucesso no seio de uma escola pública. Uma experiência da qual poderia obter alguns  benefícios mostrando à opinião pública nacional como as lideranças firmes e esclarecidas e o profissionalismo daqueles professores que trabalham 35 horas por semana superam todas as contrariedades e carências que as escolas possam sentir. Porque é que não o fez?
Não cremos que os dirigentes do Ministério da Educação andem assim tão distraídos porque, de facto, não andam. Para eles, a Escola da Ponte não é o exemplo de escola que a direita no poder pretende exaltar. Formar os alunos como pensadores livres e cultos é um objectivo mal-visto por aqueles que exaltam a liberdade apenas como uma figura de retórica poderosa ao serviço de um liberalismo que, afinal, a impede. É a política em todo o seu esplendor que se afirma através deste ataque ao projecto da Ponte obrigando-nos, porventura, a acordar para reconhecer como aí o político se foi afirmando, desde há um quarto de século, através do pedagógico. Porque é de política que se fala quando valorizamos as Assembleias da Escola da Ponte ou a abertura à participação activa dos encarregados de educação na sua vida quotidiana. É de política que se fala, também, quando enaltecemos o  modo como aquelas crianças se relacionam com o saber, assim como é a política que está presente quando se assiste à criação do ambiente de cooperação e partilha que naquela escola tanto se valoriza. Também não deixa de ser política o facto daquele espaço se assumir como uma comunidade cultural, assim como, definitivamente, é política o facto daquele projecto tanto incomodar a direita. Daí que sejamos forçados, por isso também, a entender como uma obrigação de carácter político a defesa do projecto da Ponte. Será que somos capazes ? Será que estamos interessados ?


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 127
Ano 12, Outubro 2003

Autoria:

Ariana Cosme
Fac. de Psicologia e Ciências da Educação, Univ. de Porto
Rui Trindade
Faculde de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto
Ariana Cosme
Fac. de Psicologia e Ciências da Educação, Univ. de Porto
Rui Trindade
Faculde de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto

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