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Sinais de vida (uma leitura sobre índices de desenvolvimento)

A Noruega encabeça este ano os indicadores das Nações Unidas sobre o Índice de Desenvolvimento Humano, um estudo realizado anualmente pelo Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (PDNU), que classifica 162 países segundo critérios como a expectativa de vida, o índice educacional, a alfabetização e o rendimento per capita. A Noruega e Austrália superaram o Canadá, que liderou a lista durante os últimos seis anos, em resultado das suas novas cifras em relação à expectativa de vida e nível de escolaridade. Os Estados Unidos caíram do terceiro para o sexto lugar, apesar de o seu rendimento per capita (cerca de 6400 contos) ser o segundo a nível mundial, depois do Luxemburgo (8600 contos). Os Estados Unidos, o país mais poderoso do mundo, ficaram no 12º posto no que se refere a índices de escolaridade e no 24º em relação à expectativa de vida, atrás de países como a Grécia ou o Chipre.


Pobreza

De acordo com os números apresentados neste estudo, cerca de 1200 milhões dos cerca de 6000 milhões de habitantes do planeta vivem com menos de 200 escudos (1 euro) por dia e 2800 milhões com menos de 400 (2 euros). A proporção da população que vive com menos de 200 escudos é de 46% na África sub-sahariana - cujo rendimento médio per capita é de 448 dólares, cifra exígua em relação à média mundial de 6.980 dólares - e 40% na Ásia meridional, comparadas com os 15% na ásia Oriental, Pacífico e América Latina. Os 28 países com os mais baixos indicadores situam-se todos em África. Somente quatro países da América Latina - Argentina, Uruguai, Chile e Costa Rica - figuram entre os primeiros 50 países classificados pela ONU. Recentemente, um relatório internacional deste organismo afirmava que, apesar de alguns avanços, o ponto mais vulnerável da América Latina continuava a ser a concentração de rendimentos, geradora de fortes desigualdades, que é maior aqui do que em qualquer outra parte do mundo.

Mas as privações económicas não se limitam aos países em desenvolvimento. Nos países membros da OCDE mais de 130 milhões de pessoas são consideradas pobres e 34 milhões estão desempregadas. Em 20 países da África, Europa do Leste e ex-União Soviética houve mesmo retrocessos em relação a anteriores indicadores. A Rússia, a Roménia e o Zimbabwe, por exemplo, tiveram indicadores mais baixos do que em 1980 e os da Zâmbia são mais baixos do que em 1975, em parte por causa da pobreza e da epidemia de Sida que reduziu dramaticamente a expectativa de vida nesses países.


Saúde

A saúde, aliás, é uma das principais preocupações dos países em vias de desenvolvimento, cujo investimento, apesar disso - de acordo com números da Organização Mundial de Saúde -, decresceu relativamente a 1990. A epidemia mundial de Sida constitui, sem dúvida, a principal ameaça, já que no final do ano 2000 afectava 36,1 milhões de homens, mulheres e crianças, dos quais 30% são jovens com menos de 25 anos. Só no ano passado, 5,3 milhões de pessoas foram contaminadas e 3 milhões morreram vítimas da doença. Se a epidemia continuar neste ritmo, o crescimento económico das nações mais afectadas vai reduzir-se em 25%, prevêm estudos sobre esta matéria. A aplicação de programas de prevenção e cuidados médicos no continente africano custará pelo menos 3 mil milhões de dólares anuais.

Apesar de o relatório sublinhar que os avanços no combate à doença têm crescido substancialmente, alerta-se para o facto de a indústria farmacêutica se sentir tentada a orientar a investigações no sentido de satisfazer interesses empresariais mais do que o interesse público, dirigindo os seus esforços para a investigação comercial em lugar da investigação de cuidados básicos. Kofi Annan, secretário geral das nações Unidas, referia recentemente que "o acesso ao tratamento continua desigual entre países ricos e pobres", onde os doentes morrem por falta de cuidados. Apesar de a investigação pública estar a diminuir relativamente à investigação privada, ainda de acordo com o relatório, a primeira continua a ser a "principal fonte de inovação" para grande parte do que se poderia denominar como a "tecnologia dos pobres".

Mas não é apenas a sida que preocupa o mundo. A desnutrição, o paludismo ou a tuberculose são outras das enfermidades para as quais o relatório alerta ser necessário desenvolver formas de tratamento eficazes e acessíveis aos países mais pobres, lembrando que 11 milhões de crianças morrem anualmente de doenças facilmente previníveis. Além disso, 968 milhões de pessoas não têm acesso a fontes de água potável, 2400 milhões não possuem saneamento básico e 2,2 milhões morrem de doenças relacionadas com a contaminação do ar.

A maior expectativa de vida pertence ao Japão, o único país onde se supera os 80 anos. No outro extremo, um menino nascido na Serra Leoa provavelmente morrerá antes de chegar aos 39 anos. Aliás, a esperança de vida na África sub-sahariana é de apenas 48 anos, comparativamente com os 60 anos das restantes regiões mundiais. Os estados árabes foi quem conseguiu maiores progressos nos últimos 30 anos, já que a esperança de vida aumentou 14 anos e a taxa de mortalidade infantil diminuiu em cerca de 85%. De um modo geral, as crianças que nascem hoje têm uma esperança média de vida de mais oito anos relativamente há três décadas e quintuplicou-se a percentagem de famílias rurais com acesso a água potável.


Ambiente

Apesar de o relatório sobre o IDH não conter informações substanciais no capítulo ambiental, é sabido que o actual ritmo de aumento da população mundial põe em perigo os recursos naturais, o que por sua vez ameaça a saúde pública e o desenvolvimento económico e social. Estas informações constam do relatório "População e Meio Ambiente: o desafio planetário", recentemente publicado pela Universidade John Hopkins, de Baltimore, nos Estados Unidos, onde se pode ler que "um desenvolvimento viável exige a desaceleração do crescimento da população", que se multiplica actualmente mil milhões de habitantes a cada 13 anos.

"A maioria dos países desenvolvidos consome os seus recursos mais rapidamente do que a reprodução destes", sublinham Don Hinrichsen e Bryant Robey, investigadores daquela universidade. E a maioria de países em desenvolvimento, com um crescimento acelerado da sua população, enfrenta necessidades urgentes para melhorar as suas condições de vida, recorrendo, por isso, aos seus recursos naturais, que sofrem danos irreparáveis, ocasionando a falta de água, o esgotamento dos solos, a perda de florestas, a poluição do ar e da água e a degradação do litoral.

"Se não se seguir as regras para um desenvolvimento sustentável, a humanidade enfrentará um ambiente que se deteriorará e poderá causar um desastre ecológico", destaca ainda aquele relatório. Para ambos os autores, entre as medidas que devem ser postas em prática pelos governos figuram o uso mais prudente da energia, uma melhor gestão das zonas urbanas, a protecção da água, um maior controle da exploração das florestas e a preservação das terras de cultivo.

Ricardo Jorge Costa


  
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Edição:

N.º 106
Ano 10, Outubro 2001

Autoria:

Ricardo Jorge Costa
Jornalista do Jornal A Página da Educação
Ricardo Jorge Costa
Jornalista do Jornal A Página da Educação

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