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Prisca Diedrich, animadora sócio-cultural

Duas Culturas, Duas Educações

A animação sócio-cultural é uma área profissional pouco enraízada no país e . Dirigida para o desenvolvimento de actividades de carácter lúdico e sócio-pedagógico, a sua intervenção é reconhecida nos países desenvolvidos, desde há décadas, como uma área fundamental da aprendizagem. Porque aprender, também é saber jogar e brincar.

Quando era pequena, com apenas oito anos, Prisca gostava já então de organizar actividades de animação, jogos e 'olimpíadas' no local onde vivia. Como tinha muitos vizinhos que gostavam de participar nas brincadeiras, por vezes 'chegavam a juntar-se mais de vinte crianças', recorda. Ao longo da adolescência continuou a trabalhar e a acompanhar crianças e jovens, guiada pelo gosto em conviver e travar conhecimento com os mais novos.

Quando fez dezanove anos visitou Portugal pela primeira vez e gostou. Atrairam-na a melodia da língua, a suavidade do clima e a atitude de vida mais descontraída dos portugueses. Pensou que um dia teria de ali voltar.

Originária de Karlsrhue, no sul da Alemanha, Prisca prosseguiu os estudos e mudou-se para perto de Hannover onde se licenciou em 'SozialPedagogik' (pedagogia social), pela Universidade de Bielefeld. Um curso cuja componente de formação, embora vocacionada para a animação sócio-cultural, combina igualmente uma aprendizagem dirigida à assistência social.

Cinco anos depois de terminar os estudos, viajou até Curitiba, no Brasil, cidade onde pode pôr em prática as suas aprendizagens. Seis meses de estágio numa escola de surdos e mudos, naquela que considera ter sido uma experiência enriquecedora, vivida muito emocionalmente, é certo, mas proporcionando-lhe uma oportunidade para aprender e praticar português. O regresso tornou-se inevitável pela situação de ruptura financeira e de algum stress psicológico em que se encontrava.

Estudou ao longo de mais quatro anos, trabalhando em diversas associações e centros sociais, sobretudo na área de pedagogia teatral e expressão criativa. O seu último emprego permitia-lhe ganhar razoavelmente, gozava de bastante autonomia no seu trabalho e a sua vida estava organizada.

Uma decisão emocional

 

'Talvez por estar tão organizada, o sonho de ir para Portugal mantinha-se vivo', diz. Doze verões mais tarde, com trinta anos, resolvia iniciar uma nova fase da sua vida e tomar uma decisão que muitos considerariam aparentemente absurda. Para isso, ao longo de uma ano foi reunindo contactos com diversas instituições de serviço social públicas e particulares, organismos não governamentais, igrejas e outras. Quando chegou, há três anos, trazia duas malas com roupas e livros, dinheiro para viver doze meses e muita vontade em começar.

'Mais do que uma decisão racional, vir para Portugal foi uma escolha do coração. Pesa também o facto de serem raros os técnicos qualificados na minha área. Pensei que a minha experiência pudesse ser útil no desenvolvimento de projectos novos e diferentes e na partilha e troca de práticas e conhecimentos'.

A integração no meio social e profissional, porém, não foi tão fácil quanto julgava. Percorreu a zona Sul e Lisboa em busca de um emprego, mas as portas fecharam-se-lhe. 'A apresentação do curriculo e do trabalho que tinha desenvolvido anteriormente não pareciam impressionar ninguém. Percebi, então, que não conhecia as pessoas nos lugares certos'.

Aconselhada por algumas pessoas com quem, entretanto, travara conhecimento, veio para o Porto, onde se alojou numa hospedaria 'pouco convidativa'. Esteve para desistir de procurar quando contactou a Associação de Ludotecas do Porto (ALP). Começou por trabalhar quinze horas por semana em 'part-time' e realizou projectos de animação de encontros e festas através da expressão corporal, dramática e plástica, bem como temas festivos em vários bairros do Porto. Ao princípio, no entanto, ganhava pouco e não conhecia praticamente ninguém.

Choque de culturas

Com o tempo, começou a sentir-se acolhida. 'As pessoas eram simpáticas e eu sentia que existia uma grande abertura no convívio e nos contactos pessoais. No meio profissional, porém, não sentia o mesmo respeito', explica.

A estrutura onde se integrara não se pautava pelo modelo de organização à qual estava habituada no Norte da europa: a inexistência de trabalho em equipa e falta de comunicação entre os elementos do projecto. Além disso, o relacionamento entre monitores e administração era baseado num sistema de 'respeito autoritário', onde nunca se sabia com o que contar em termos de prazos.

Aos poucos, a situação foi-se deteriorando e a ALP esteve, até há poucos meses, em risco de encerrar. 'Uma nova direcção e um projecto reformulado podem, agora, voltar a dinamizá-la', diz com um certa esperança.

A sua área de licenciatura e a especialização em pedagogia teatral e dramática e expressão corporal permitem-lhe desempenhar a coordenação técnica de outras iniciativas, como é o caso dos projectos 'Desenvolvimento Comunitário do Centro Histórico de Gaia' e o 'Ser Criança', em Massarelos.

Desde 1995 orienta igualmente um curso semanal de dança oriental e expressão corporal e 'workshops' de fim-de-semana em várias organizações no Porto e em Lisboa.

É ainda responsável pela orientação de acções de formação, através da monitoria destinada a profissionais na área da Educação, Pedagogia, acompanhamento de toxicodependentes e animação sócio cultural, das quais se poderão destacar 'Dinamização de Ludotecas e Comunicação através da Expressão Corporal, plástica e Dramática' ou 'Métodos de Expressão Criativa no Ensino Escolar'.

A relação de proximidade com a escola e o ensino é, aliás, uma das principais facetas do seu trabalho. No seu país, estes técnicos são desde há muito tempo elementos imprescindíveis nas equipas que coordenam estruturas de apoio às crianças e jovens e as actividades desenvolvidas são reconhecidas como um elemento de complementaridade educativa.

'Em Portugal existem ATL's, cujo princípio de funcionamento é em muito semelhante ao das ludotecas. O princípio pedagógico aplicado é que é diferente'. Nos primeiros, explica, 'sente-se de certa forma a omnipresença da escola e do sistema formal a si associado. Não há lugar para a libertação de energias e aproveitamento das capacidades criativas. Eles precisam de utilizar os sentidos para explorar e entender o mundo'.

Na sua opinião, o sistema de ensino português só teria a ganhar ao proporcionar esta aprendizagem global aos alunos, para que estes desenvolvam equilibradamente os factores emocional e cognitivo. Existe inclusivamente um ditado resumindo este pensamento e que constitui como que um lema para Prisca: 'Explica-me e eu vou esquecer, mostra-me e eu vou relembrar, deixa-me participar e eu vou saber.'

Ricardo Jorge Costa


  
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Autoria:

Ricardo Jorge Costa
Jornalista do Jornal A Página da Educação
Ricardo Jorge Costa
Jornalista do Jornal A Página da Educação

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