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"hikikimori" é doença nova

(AFP)

Recusam-se a ir à escola e ficam fechados em casa durante meses, por vezes anos: o japão está alarmado com o crescente número de jovens que decidem cortar a ligação com o mundo exterior. Ninguém sabe ao certo quantos são os que sofrem de "hikikimori", ou "isolamento da sociedade", mas estima-se que esse número possa atingir as centenas de milhar no arquipélago nipónico.
"Não há uma única turma onde não se encontre um aluno que se recuse a ir à escola", afirma Chizuko Nakajima, professora do liceu Ichikawa-Nishi. "Estes alunos trancam-se no quarto e alguns ficam por lá durante dois, três, por vezes mesmo dez anos", diz.
"É um problema crescente no seio da juventude japonesa, com consequências que vão para além da escola", refere, por seu lado, Junsuke Kegayama, especialista em violência juvenil do Instituto de Tecnologia de Tóquio. Estes jovens "fecham-se sobre eles próprios com medo de se confrontar com a realidade, que contraria a virtualidade do seu mundo infantil", refere este investigador.
Pressionada pelos peritos e pelas associações de pais, o governo japonês decidiu lançar recentemente um estudo à escala nacional, com a ajuda de 650 centros sociais, para determinar com exactidão a amplitude do "hikikimori".
Masahisa Okuyama foi um dos encarregados de educação que lançou o alerta. O seu filho, de 25 anos, não sai de casa há quase sete anos. Esta recusa de socialização transtornou a vida à família. "Fomos obrigados a mudarmos de casa porque tinha-se tornado muito perigoso conviver com os acessos de violência dele", afirma M. Okuyama, de 56 anos.
Apesar das tentativas dos pais, a comunicação entre eles e o filho é quase ausente. "Eu tento encontrar-me com ele pelo menos uma vez por semana e ter uma conversa normal, mas é muito difícil. Ele fala de uma maneira insultuosa e por palavras ininteligíveis", explica o pai. "Nessas alturas tenho medo, porque ele é mais forte do que eu".
As vítimas do "hikikimori" dirigem-se violentamente contra aqueles que os rodeiam, explica o professor Kegayama, já que "a família é a única entidade sobre quem eles ainda conseguem exercer algum poder".
Desprovidos de uma ajuda eficaz por causa da ausência de apoio dos serviços sociais, o senhor Okuyama fundou na região de Saitama, próxima de Tóquio, uma associação à qual já aderiram mais de 170 famílias confrontadas com este problema. "Não é fácil, porque os pais têm vergonha de admiti-lo", refere. A associação fez chegar recentemente ao ministério dos Assuntos Sociais uma petição onde se exige um apoio mais eficaz, em particular na criação de estruturas de acolhimento, mas também em forma de ajuda de ajudas financeiras, já que "os serviços de aconselhamento são muito dispendiosos".
Mas os especialistas alertam para o facto de as soluções serem complexas e exigirem reformas profundas, nomeadamente na educação, porque se trata fundamentalmente de um "problema civilizacional", sublinha o professor Kageyama. "Os japoneses", explica "respeitam em demasia o sistema educativo e crêem que o sucesso na escola é a única forma de promover o seu estatuto social". Os jovens ficam de tal forma submetidos ao estudo que não têm tempo para reflectir. Assim, por vezes, a fadiga extrema exprime-se neste tipo de atitude", opina a socióloga francesa Muriel Jolivet, autora de "Homo Japonicus", um livro que, como indica o título, analisa os homens nipónicos numa perspectiva sociológica.

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Edição:

N.º 94
Ano 9, Setembro 2000

Autoria:

AFP
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