Página  >  Edições  >  N.º 94  >  Diversificação da Oferta Formativa no Secundário

Diversificação da Oferta Formativa no Secundário
A compreensão de como e porque surgiram as Escolas Profissionais é inseparável entre outros factores da evolução e da crise que atravessa o ensino secundário no seu conjunto.

É sabido que ao longo dos últimos 50 anos o ensino secundário sofreu profundas alterações estruturais, quer na sua duração que passou de 7 para 3 anos, quer na sua estrutura. Começando por ter duas vias distintas (o ensino liceal e o ensino técnico), evoluiu no sentido da sua unificação, até ao inicio dos anos 80, passando a partir de 1983 (com o lançamento do ensino técnico-profissional), a assumir novamente uma natureza cada vez mais diversificada, reforçada a partir de 1989, com a criação das escolas profissionais.

Entretanto, em apenas uma década, entre 1985/86 e 1995/96, o número de alunos no ensino secundário duplicou, chegando a atingir os 450.000 alunos, transformando-se num ensino de massas, correspondendo a uma taxa de 70% da população deste nível etário.

O modelo pedagógico caracteriza-se pela pedagogia colectiva (ensinar a todos como se fosse um só), pela compartimentação rígida dos saberes em disciplinas, pelo exame como mecanismo de sobre determinação das práticas pedagógicas.

As suas funções, no fundamental, parecem poder reduzir-se a duas: preparação para o ingresso no ensino superior e, para utilizar uma expressão polémica, mas muito sugestiva de Joaquim Azevedo, a função de "parqueamento juvenil", enfatizando as altas taxas de reprovação neste grau de ensino.

É, pois, numa conjuntura, em que o ensino secundário estava predominantemente focado para o ingresso no ensino superior, em que a formação profissional dos jovens estava pulverizada em pequenas acções de formação, sem um modelo coerente, e em geral o sistema educativo estava de costas voltadas para o sistema económico e de emprego numa conjuntura de grande carência de quadros intermédios que surgem as escolas profissionais.

Com a criação das Escolas Profissionais procurou-se assim realizar três objectivos:

1- Diversificar a oferta de formação de nível secundário, alargando as oportunidades de formação pessoal, social e profissional, trazendo para este grau de ensino sectores da população que antes de saberem se vão ou não para o ensino superior querem ter uma formação profissional e que não se reconhecem no curriculo liceal.

2- Estruturar a formação profissional inicial dos jovens, dando-lhes consistência, organização e enquadrando-a nas finalidades educativas definidas na Lei de Bases do Sistema Educativo.

3- Construir um subsistema alternativo do ponto de vista institucional, apelando à iniciativa da Sociedade Civil e à inovação curricular e pedagógica, utilizando o grande potencial oferecido pela possibilidade da autonomia pedagógica das Escolas.


Esta institucionalização das Escolas Profissionais com base em parcerias locais- contratos programas entre os seus promotores e o Ministério da Educação gerou alguma controversa e foi vista nalguns sectores como uma cedência à ideologia neo-liberal que apostava na privatização da educação. Somos de opinião que esta visão peca por ser excessivamente simplista e esquece que, nomeadamente, no contexto da época em que o sistema de ensino regular não estava em condições de dar resposta à necessidade de quadros e não tinha e creio que ainda hoje não tem flexibilidade para avançar com outro modelo pedagógico e outra perspectiva curricular, como o subsistema do ensino técnico-profissional leccionado nas Escolas de ensino regular demosntrou. Para além disto este modelo institucional, permitiu recorrer a meios financeiros da Comunidade Europeia.

Creio que o êxito relativo do ensino profissional se deve em grande parte à sua capacidade de implementar um modelo pedagógico inovador, de que destaco três fundamentos:

1. Um plano curricular com uma componente socicultural, uma componente científica e uma componente tecnológica e que, por isso, não reduz a formação ao saber prático imediato.

2. A estrutura modular dos programas aliada à utilização da metodologia do trabalho de projecto tem possibilitado quebrar a excessiva compartimentação disciplinar, havendo Escolas que exploram muito esta faceta;

3. A aproximação entre a Escola e o tecido empresarial e as comunidades locais que permitiu o reconhecimento social progressivo deste sub-sistema.


Os resultados são animadores:

1. Taxas de conclusão superiores a 85%, taxas de empregabilidade em muitos casos de quase 100%, havendo igualmente um número significativo de alunos que também prosseguem estudos no ensino superior.

2. As Escolas Profissionais têm-se tornado progressiva e rapidamente como uma primeira opção, pós-ensino básico no quadro das estratégias familiares e dos jovens. Aliás é incompreensível as dificuldades do alargamento desta oferta dado o grande número de candidatos que não conseguem o seu ingresso nas Escolas Profissionais.

No entanto a vida de muitas escolas profissionais não tem sido nada fácil e desde logo porque o modelo de financiamento que vigorou durante muito tempo foi concebido para apoiar acções de formação de curta duração e não escolas de formação continuada, criando enormes problemas de tesouraria o que, gerou instabilidades e apreensões quanto ao futuro.

Uma das consequências mais graves deste modelo de financiamento manifestou-se na forma de recrutamento, no vínculo dos professores.

A esmagadora maioria dos docente encontravam-se numa situação de "recibo verde", sem contrato de trabalho e, poucas eram as escolas que tinham um corpo docente próprio, o que é absolutamente indispensável para que se possa desenvolver um Projecto de Escola.

Nos últimos dois anos, depois da publicação em 1998 da legislação que veio clarificar o estatuto jurídico das Escolas Profissionais, registam-se importantes melhorias, nomeadamente, ao nível da contratação dos professores.

Esperamos que estas medidas conduzam a um reforço da massa critica das escolas profissionais e que nos próximos Seminários e Congressos organizados pela Associação Nacional das Escolas Profissionais (ANESPO) possamos ter mais professores destas Escolas a reflectirem sobre as suas próprias experiências.

José Rui Ferreira
Escola Profissional Bento de Jesus Caraça - Porto


  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Edição:

N.º 94
Ano 9, Setembro 2000

Autoria:

José Rui Ferreira
Escola Profissional Bento de Jesus Caraça, Porto
José Rui Ferreira
Escola Profissional Bento de Jesus Caraça, Porto

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo