Página  >  Edições  >  N.º 91  >  Continuamos Amarrados no Velho Sonho de que "A Escola nos Redimirá"?

Continuamos Amarrados no Velho Sonho de que "A Escola nos Redimirá"?

Sempre que nos referimos à exploração do trabalho infantil em Pernambuco, situamos a Mata Pernambucana. Nessa região, o processo de colonização promoveu a destruição da Mata Atlântica, que, aliada à monocultura da cana, gerou uma política de exclusão social deteriorando o patrimônio cultural e ecológico. Também, limitou o conhecimento dos trabalhadores na perícia de plantio e de colheita e no uso de diversas tecnologias. Acanhou as necessidades de conhecimentos da população, inibindo seu acesso aos artefatos contemporâneos e a sua condição para preservar a herança cultural.
Nesse cenário, é preciso não perder de vista as repercussões desse processo nas condições adversas de vida e de trabalho de crianças, jovens e adultos.
Particularmente, no desenvolvimento afetivo, cognitivo e social das crianças que vêm sendo exploradas no trabalho. São crianças cuja atividade cognitva é estimulada apenas, no momento do trabalho, quando têm que se cuidar para evitar os acidentes possíveis com instrumentos de trabalho ? calculando a velocidade da foice, do tempo e distância para chegar aos engenhos ou, ainda, quando calculam quantos molhos de cana já cortaram, entre outros. Trata-se no entanto, de formas de mobilização cognitiva e afetiva insuficientes e inadequadas para a criança, comprometendo sua integridade física, assim como, impedindo que a mesma ocupe o espaço ? tempo escolar que estimularia sua atividade cognitiva, afetiva e estética na diversidade do conhecimento curricular e o espaço ? tempo estruturador da brincadeira. O espaço ?tempo de construção de sua cidadania.
Contraditoriamente, essa região, hoje, apresenta-se muito rica em potencialidades que se expressam em indicadores econômicos e culturais importantes. Entre estes, citam-se: abundância de recursos hídricos, qualidade do solo, experiências com produção agrícola alternativa; a organização política dos trabalhadores em sindicatos rurais e em movimentos sociais na Luta pela Reforma Agrária, e a forma como o povo festeja, revelando sua capacidade de resistir e sonhar. Forma singular de expressão de suas idéias sobre o mundo ? nos espetáculos populares do Fandango, das Cirandas, dos Maracatus, das Cavalhadas. Tais práticas culturais se apresentam como espaço de possibilidade para problematização permanente no que diz respeito aos seus problemas e as políticas públicas propostas para região.
Nesse particular, faz-se necessário uma atitude crítica em relação aos sentidos que vã sendo instituídos a partir dos discursos que fundam os projetos voltados da superação do trabalho infantil na região.
Não se pretende discutir o valor em si do programa bolsa escola, ação que o Partido dos Trabalhadores imprimiu em suas gestões publicas e, inserido nas políticas sociais do governo federal em vários estados do país, e que busca a superação do trabalho infantil.
Sabe-se dos seus efeitos imediatos na melhoria da qualidade de vida das crianças e pais envolvidos nesse tipo de programa. No entanto, é preciso refletir sobre onde está fundado o lastro utópico desse programa ? na idéia da escola como redentora? É bom lembrar que, a alternativa educacional para o problema do trabalho infantil vem sendo implementada desde a revolução industrial na Inglaterra.
Talvez repensar o significado da preocupação do professor Paulo Freire ao colocar que "a educação sozinha não pode fazer todas as coisas, embora sem ela as coisas todas não podem ser feitas".

Rosângela Tenório de Carvalho
Professora do Centro de Educação ? UFPE ? Brasil
Rosan@npd.uf?pe.br


  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Edição:

N.º 91
Ano 9, Maio 2000

Autoria:

Rosângela Tenório de Carvalho
Professora do Centro de Educação ? UFPE, Brasil
Rosângela Tenório de Carvalho
Professora do Centro de Educação ? UFPE, Brasil

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo