Página  >  Edições  >  N.º 83  >  Óscar Lopes - o Prazer da Leitura e a Aventura do Saber

Óscar Lopes - o Prazer da Leitura e a Aventura do Saber

Através da vasta e metódica obra de crítico, ensaísta e historiador literário, Óscar Lopes tem prosseguido, em mais de sessenta anos, uma intensa e profícua actividade que se consolidou em trabalhos de grande fôlego ensaístico e de investigação literária. Por isso, se deve saudar o início da publicação das suas "Obras" com estes 5 Motivos de Meditação, ou seja, um conjunto de ensaios, espalhados por outras fontes, sobre Camões, Eça, Raul Brandão, Aquilino e Pessoa, reunidos de forma metódica e criteriosa e acompanhados de importantes notas bibliográficas.
Desde há muito que Óscar Lopes é justamente reconhecido como um dos mais lúcidos e profundos estudiosos da nossa literatura e que sempre se preocupou, numa linha de coerência ideológica muito rigorosa e equilibrada, em determinar mais do que um método de crítica as próprias linhas de força essenciais de um pensamento crítico actuante, interpretativo e judicativo, patente em muitas das suas obras e em especial na prática crítica que nos anos 50 a 70 pôde exercer nas colunas de O Comércio do Porto. Sempre em busca de um sentido literário ou da melhor síntese literária possível, na clara atitude de ser acima de tudo «um leitor que pensa e fala para os outros», Óscar Lopes tem alargado, de forma persistente, esse corpo crítico que pôde erguer no conhecimento e interpretação de obras e autores de todas as épocas, não por ser por vocação um grande estudioso de literatura, mas antes por ser de sua condição evidenciar um prazer de leitura que o faz ser essa "imagem em múltiplo" de que fala Isabel Pires de Lima no prefácio desta edição, que «encontra agora um espaço de irradiação que evidenciará o seu papel iluminante na reflexão, na interrogação, na problematização, em suma, no ensaísmo tal como Óscar Lopes o entende - uma aventura do saber».
Na metodologia crítica desde sempre adoptada no sentido de decifrar e configurar as vertentes primordiais da literatura portuguesa, é verdade que Óscar Lopes nunca deixara de dialogar e determinar de forma pessoal os seus próprios gostos e opções literárias, mas sempre nesse sentido de revelar o seu próprio modo de ler textos e autores que foram de ontem e são de hoje, interpretados e estudados à luz de outros postulados estéticos, como se pode observar nas decifrações feitas em redor de Camões, no determinar do sonho na ficção narrativa de Eça, na rotura feita com o realismo queirosiano por parte de Raul Brandão, na questão do paraíso e do pecado em Aquilino à luz de uma nova leitura interpretativa da grandeza do autor de Terras do Demo, ou ainda no exercício de intróito a Pessoa e as construções dilemáticas do ortónimo.
Na abordagem ensaística feita a estes autores, ou nos motivos da sua meditação crítica, Óscar Lopes uma vez mais se afirma como um dos nossos maiores ensaístas e historiadores da literatura portuguesa e redescobre noutra perspectiva os motivos do seu prazer de leitura de grandes nomes da nossa cultura e à sua maneira, como afirma em relação aos outros, se torna também poeta em companhia de quem percorre outros sentidos e redescobre novos horizontes (e nós com ele), porque, como declara no final da sua Explicação Preliminar, «poeta será aquele que, mediante certa disciplina, nos torna a todos poetas, que solta em dadas circunstâncias as palavras aparentemente inertes e as faz viver ao ritmo de um poema, que vivendo dessas palavras, as anima, para qualquer outro tempo, tempo em que o seu tempo se propaga, e em que tudo é novo».E, como atitude aberta de decifrar todos os universos literários, nessa declarada aventura do saber, Óscar Lopes seduz e entusiasma o próprio leitor dos seus textos e transmite assim o mesmo prazer de leitura que se observa nas variantes e sinuosidades do seu discurso crítico. Ontem e hoje, sim, como primeira e exemplar lição de como se deve entender e praticar a crítica literária.

Serafim Ferreira
crítico literário

ÓSCAR LOPES
5 MOTIVOS DE MEDITAÇÃO
(Ensaios sobre Luís de Camões, Eça de Queirós,
Raul Brandão, Aquilino Ribeiro e Fernando Pessoa)
Ed. Campo das Letras / Porto, 1999.


  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Edição:

N.º 83
Ano 8, Setembro 1999

Autoria:

Serafim Ferreira
Escritor e Crítico Literário, Lisboa. Colaborador do Jornal A Página da Educação.
Serafim Ferreira
Escritor e Crítico Literário, Lisboa. Colaborador do Jornal A Página da Educação.

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo