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Para se Pensar o Desenvolvimento Sustentável

Desde a culminação da revolução industrial até os dias atuais, o modelo de desenvolvimento implantado pelas nações sempre foi idealizado sem se levar em conta o respeito à natureza, à qualidade de vida da humanidade e do impacto causado por este sobre a realidade e as condições sociais das populações envolvidas, levando o nosso planeta a atual situação de degradação e devastação ambiental, pobreza e miséria, espalhando assim um imenso caos, principalmente nos países subdesenvolvidos, que ao longo da história foram explorados por tecnologias ambientalmente poluentes e desastrosas, pensadas e testadas pelos países exploradores nessas nações pobres, que diante das suas restrições, foram utilizadas como "cobaias" durante todo este século que agora se encerra.

Ao se pensar em um modelo de desenvolvimento que não repita os males e práticas ainda existentes e que possa amenizar os danos causados ao planeta terra no decorrer da história, temos que colocar acima de tudo e principalmente, o Ser Humano, o Ambiente e a Sociedade, pois só assim poderemos atingir os outros aspectos que permeiam todos estes (o social, ambiental, econômico, político, institucional, tecnológico e o cultural), utilizando-os como referenciais e pontos de partida, já que são as ferramentas e elementos necessários que devem ser considerados na construção de qualquer modelo de desenvolvimento sustentável que sirva para todas as gerações, não deixando que apenas as gerações atuais usufruam dos seus frutos, mas que estes também sejam garantidos aos que ainda estão por vir, possibilitando a continuidade dos recursos naturais disponíveis e consequentemente da vida em nosso planeta.

A relação Ser Humano x Ambiente deve ser realizada de maneira a ter-se sempre como meta os limites de cada um e as possibilidades de sustentabilidade entre ambos, não apenas se restringindo ao momento, às necessidades urgentes, ao local, etc., mas ao futuro, e à escassez dos recursos, principalmente os esgotáveis e vendo o meio como um grande sistema que não se esgota apenas em si mesmo, no local, mas que reflete num todo que é o nosso planeta.

A luta pela construção de uma mentalidade voltada para o respeito a natureza e a garantia da qualidade de vida não deve encerra-se apenas nos movimentos e organizações ecológicas e ambientalistas, mas exige-se um pacto mais que urgente e necessário com a sociedade moderna da nossa atualidade, uma vez que o mundo social, com todas as suas instituições e consequentemente atribuições concretizam em si um papel por demais importante e que de fato deve ser cumprido, que é o de formar uma mentalidade hoje, aqui e agora comprometida com os caminhos do futuro (os homens mulheres, crianças, jovens e adultos) que com exemplos claros e práticos, através da família, da escola, dos grupos formais e informais a que têm acesso na sociedade atual, comecem desde já a construírem as bases da sociedade sustentável do futuro. Considerar num projeto de desenvolvimento os aspectos político, econômico, institucional, tecnológico e cultural que permeiam a sociedade, é compreender a ligação existente entre cada deles e que só poderemos traçar, esboçar e colocar em prática uma sociedade com olhares para a atualidade e voltada para o futuro, quando de fato entendermos o emaranhado que se constituem as diversas realidades sociais e culturais existentes em nosso país.

Observando o sistema educacional brasileiro, o quanto os "pacotes" não condizem com o real, principalmente agora com os PCN (Parâmetros Curriculares Nacionais) elaborados em gabinetes por mentes tidas como iluminadas e distribuídos (quando os são, pois em muitos casos estão jogados nos depósitos empoeirados das secretarias municipais de educação, servido de alimento para as traças) para o batalhão de professores muitas vezes despreparados que nem sequer chegam a ler e quando isso acontece, em alguns casos se perdem no confronto entre o teórico e o prático, já que diante das dúvidas na aplicação da receita a equipe que a elaborou não está presente para discutir ou elucidar as interrogações, pois continuam nos seus gabinetes, esperando que da força de vontade e do dinamismo dos soldados deste exército educacional surja a novidade do deu ou está dando certo, uma vez que não existe por parte do governo um compromisso com o acompanhamento destes docentes, no sentido inclusive de desenvolver uma política de valorização profissional e salarial bem como de convencimento de que a luta e o direito a uma vida e um ambiente saudável deve ser um direito de todos; além de que, da maneira como os PCN's são apresentados, para uma país rico em diversidades e pluricultural os mesmos trazem uma visão uniforme da realidade, não privilegiando só para ilustrar, a diversidade sistêmica que é mundo rural.

Se a escola se constitua numa instituição por demais importante e que não pode se negar diante da construção de um projeto de sociedade sustentável já que está intrinsecamente ligada aos mais diversos contrastes existentes nesta, até por ser fruto dela, deve se comprometer com a formação dos seus alunos dentro de uma lógica de sistema enquanto complexidade como diz Edgar Morin(1) "...esta ordem se alimenta da desordem para a sua própria organização, sem nunca esgotá-la totalmente, é, isso mesmo o sinal, o índice, da complexidade...". Portanto, compreender a nossa realidade local, o nosso mundo como um grande universo complexo e cheio de inter-relações é também um dos caminhos para entendermos o papel a ser desempenhado pela educação dentro de um modelo de desenvolvimento nestes moldes.

Assim como a educação, sabemos que a economia, a saúde, as relações sociais, o papel das instituições diversas e as tecnologias utilizadas em um país nascem das decisões políticas que norteiam os destinos de uma nação, sendo então mais que necessário, uma mudança de mentalidade dos que compõem esta parte da sociedade para que só então se possa desenvolver uma nova cultura , a cultura da ecologia humana., das relações humanas, do ambiente preservado, da educação ambiental, das cidades limpas, do saneamento ecológico, da preservação e uso racional dos recursos naturais, do controle de emissão de gases poluentes, do tratamento dos esgotos das fábricas e dos hospitais, da convivência harmônica do homem com a natureza, da criação de tecnologias não agressivas ao meio ambiente, da mudança de hábitos ecologicamente errados usados pela população, da possibilidade de se desenvolver uma boa qualidade de vida para todos, explorando ecologicamente as nossas potencialidades locais, criando e aproveitando as oportunidades que nos são dadas, defendendo-nos das ameaças, evitando os abusos do capital, exercendo a plenitude da cidadania, e enfim desfrutando dos bens nascidos do esforço e vontade de se construir o novo que vem a ser o desenvolvimento sustentável viável.

Edmerson dos Santos Reis
edmerson@lkn.com.br
Bahia / Brasil

(1) MORIN, Edgar. O Paradigma Perdido - A natureza Humana, 3a edição.
Publicações Europa -América/Biblioteca Universitária, Lisboa.

Jornal a Página da Educação nº 83 - Setembro de 1999, pg. 7


  
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Edição:

N.º 83
Ano 8, Setembro 1999

Autoria:

Edmerson dos Santos Reis

Edmerson dos Santos Reis

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