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TEIP 1, TEIP 2, TEIP 3... Serão realidades semelhantes?

Os primeiros Agrupamentos de Escolas a serem selecionados como Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP) na área da ainda existente Direção Regional de Educação do Norte foram, na altura, na cidade do Porto, Areosa (com a escola do Bairro de S. João de Deus), Ramalho Ortigão (que incluía a escola do bairro do Lagarteiro que agora não sei por que razão passou para o Cerco…), Cerco, Miragaia, Amial (com a escola do bairro de S. Tomé), Viso e Leonardo Coimbra Filho; também Pedrouços (com escolas entre a Maia e Gondomar) e Fânzeres em Gondomar; Perafita, Matosinhos Sul e Matosinhos, neste concelho; e D. Pedro I, Inês de Castro (ambas em Canidelo), assim como Vila d’Este, tudo em Gaia. Imagino que não seja necessário ser-se professor para ter a maior parte destes nomes no ouvido, quer devido a problemas de natureza social, quer por causa de notícias que por vezes irrompem nos jornais por rixas nas escolas, assaltos, vandalismos. Sou professor há mais de 30 anos, iniciei a minha carreira no primeiro ciclo, e lembro-me bem de projetos realizados por educadoras e professoras em S. Tomé, em S. João de Deus, no Cerco e noutras escolas, heroínas do tempo em que não havia computadores nem telemóveis e em que as cópias se tiravam em tabuleiros de gelatina, à mão, uma a uma.

Tentações dos professores

Têm hoje os professores, os funcionários, os encarregados de educação e os alunos de uma escola TEIP um sem número de recursos que não podem desprezar: técnicos especializados (psicólogo, educador ou assistente social, animador cultural, professores de apoio, recursos económicos, etc.). Não é eticamente permitido a nenhum professor acabado de ser colocado numa escola TEIP, dizer eu não sou professor TEIP, não faço parte deste projeto. É uma questão de cidadania. A partir do momento em que se foi trabalhar para uma escola com determinadas características, ou se aceita o emprego, ou não. E é impensável que um professor efetivo numa escola que se candidatou a TEIP na 1ª fase (TEIP 1) ou na 2ª fase, ou na 3ª, pense que pode viver à margem disso; que pode esbanjar o dinheiro confiado pelos fundos europeus ao povo português, ao seu belo prazer. Muito menos a um docente com responsabilidades no Conselho Pedagógico seria permitida tal proeza. Uma escola TEIP que não assume e cuida o projeto que ela própria pediu e de cujos privilégios vive, não existe, seria uma perturbação do sistema.
Tudo o que os TEIP têm como objetivos, corresponde exatamente à razão de existir de um professor: melhorar a qualidade das aprendizagens para que o sucesso educativo dos alunos seja maior; combater o abandono escolar prematuro e o absentismo. É evidente, porém, que mesmo com todos os recursos que os professores das escolas TEIP têm à mão, as coisas não são nada fáceis.
Por isso têm muito trabalho nas suas escolas, por isso as coisas são difíceis, talvez mais do que noutras escolas. Certamente. Mas não é razão para abandonar o barco. É razão para agir no sentido da eficácia. Por isso há técnicos especializados para estabelecerem protocolos com instituições que podem ajudar a escola e com que esta pode interagir. Há articulações que se podem estabelecer, com os parceiros sociais do terreno e com outras instituições de formação que ajudem na transição dos nossos jovens para a vida ativa com qualificação.
E quando se fala aqui do Professor (com maiúscula, claro), não se fala de A ou B, de cicrano ou de fulano. Fala-se do conjunto de professores de uma escola que deve saber trabalhar em grupo. Organizar-se. É preciso ir falar com uma instituição? Vai a Educadora Social, mas pode bem fazer-se acompanhar de alguns docentes. Trabalho em grupo! Todos somos um recurso! Todos temos valor!

Tentações da administração

Em 2008/2009, surgiu uma 2ª fase de escolas TEIP, já mais descentralizadas da grande metrópole portuense, de cujo elenco de formação inicial fiz parte, e que foram: Darque (Viana do Castelo), Pedome e Calendário (Famalicão), Francisco Sanches e Maximinos (Braga), S. Torcato (Guimarães), Calendário, Peso da Régua, Diogo Cão (Vila Real) e Cristelo (Paredes).
Estas escolas tinham também dificuldades, naturalmente. Haveria poucas escolas, analisadas que fossem em tempo e espaço dos últimos vinte anos em Portugal, que não tivessem problemas. Mas em relação às escolas TEIP 1 os problemas começavam a ser mais especificáveis nestas TEIP 2: adaptação ao modus vivendi da etnia cigana; desemprego na zona têxtil; alcoolismo; descaracterização rural. Era preciso tratar da reorganização da escola, da utilização dos recursos, da sua seleção, de como rentabilizá-los. Era preciso pensar na inovação e na eficácia. Recriar a escola, sempre.
Não sei quais as características das escolas TEIP 3.
Mas nas TEIP 2 estávamos já longe das escolas TEIP 1 em que qualquer situação é, de facto, um problema e precisa ser “pegada de caras”, sem rodeios. Não pode a administração dar-se ao luxo de dormir descansada só porque foi assinado um contrato. É preciso estar atento e fazer com que as coisas sejam realizadas. Cumpridas com alegria, dando continuidade às esperanças criadas no seio dos profissionais que se dispuseram a investir tudo por crianças com imensas dificuldades nas suas vidas, na escola e lá fora onde a vida cresce sem esperança e faz voltar ao aconchego por vezes minimamente resignado de uma sala de aula. E é desse tão pouco conformado que é preciso fazer nascer a alegria, o prazer da realização, o sucesso, com inovação, no caminho da utopia que conduz ao real.
Numa escola TEIP 1 o sucesso escolar é feito de afetos. Mede-se em sorrisos e abraços. É preciso saber se a indisciplina sabe a fome, a frio, a violência doméstica, a estratégias inadequadas, a professores mal colocados, a falta de meios. Numa escola TEIP 1, se baixa o abandono, é a maior vitória que se possa imaginar: é como o tema bíblico do regresso do filho pródigo. Se os alunos vêm à escola para tocar cavaquinho e não ficam a ver a “casa dos segredos da incultura e da parvoíce” isso também deve ser mensurável como os exames nacionais: em dados oficiais. De resto, há assessores, há todo o tipo de recursos e o que pretendemos, para além do carinho que lhes é devido, é fazer com que estes meninos cheguem ao mesmo nível de sucesso de todos os outros. E para isso, a administração tem que:
- Fornecer todos os recursos necessários a estas situações extremas e não os mesmos que a outros que não precisem tanto.
- Estar atenta aos modos como as escolas se organizam no sentido da inovação e da eficácia e como usam na realidade os recursos que lhes são fornecidos.
O que não faz sentido nenhum é dizer para o ar que se estas escolas não têm muito sucesso mensurável, não faz sentido continuarem a ser apoiadas, como ouvi aqui há pouco mais de um ano. Com que sentido e baseado em que avaliação?

Este texto está escrito em português de Portugal. Só conheço esta escrita, que é a que uso obrigatoriamente enquanto docente, em qualquer documento oficial e no quotidiano e serve-me muito bem, como aconteceu com tantas outras ao longo da minha vida.

José Rafael Tormenta


  
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Edição:

Edição N.º 199, série II
Inverno 2012

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