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Imagem e desafios da profissão docente

A missão pedagógica dos professores reveste-se de grande complexidade humana, dada a responsabilidade antropológica que lhe é inerente. Trata-se, afinal, de trabalhar com pessoas e numa perspectiva de promover a sua personalidade e humanidade.

Tal como sublinha Isabel Baptista, “a relação entre educador e educando, que sustenta a experiência educativa, constitui uma modalidade de encontro humano que, de forma muito particular, contribui para a realização do projecto antropológico”. Deste modo, o professor é colocado face a novos reptos que, para além dos saberes inerentes à profissão, exigem um conjunto de competências sociais e humanas sem as quais se torna inexequível o exercício de uma nova profissionalidade configurada pelos desafios do século XXI. Na mesma linha de raciocínio, os professores são convidados a desenvolver e a liderar “um processo de transformação social” (Roberto Carneiro).
No entanto, ainda hoje, como refere Andy Hargreaves, “a imagem popular do trabalho do professor retrata-o como uma actividade desempenhada com crianças no interior de salas de aula – fazer perguntas, emitir orientações, dar conselhos, manter a ordem, apresentar materiais, aliviar o trabalho das crianças ou corrigir os seus erros. Estas actividades e a preparação que é necessária para as organizar constituem, para a maior parte das pessoas, a própria definição do ensino”. Mas a verdade é que poucos não acreditam que ser professor e ensinar é uma tarefa cada vez mais complexa e mais exigente. Ora, tendo em referência a nova realidade da profissão docente, julgamos que importa reflectir a prática docente no quadro de uma sociedade educativa, desejavelmente solidária e justa, contrariando a posição de alguns investigadores que recorrentemente admitem “a morte do professor” (Jean-François Lyotard, António Teodoro). No seguimento do que já foi afirmado, a emergência do tempo contemporâneo reclama um professor pedagogo, capaz de compreender, de intervir e de contribuir para o aperfeiçoamento humano. Nesse sentido, será decisivo educar para a compreensão, (des)construindo o significado da informação, encontrando a melhor forma de a utilizar como benefício, acautelando um sentido de responsabilidade individual e colectivo na educação e no sucesso dos alunos. Por isso, espera-se, sobretudo, que o professor privilegie o pensamento dos alunos, os ajude a pensar criticamente, contribuindo para a construção hermenêutica do seu conhecimento no sentido de lhes facultar a transição da informação para o conhecimento e do conhecimento para a sabedoria. Entendemos, por isso, que o seu papel está longe de se esgotar. Parafraseando Roberto Carneiro, “os professores são cada vez mais necessários”, porque a matriz humana na Escola prevalece sobre o mito tecnológico.
Nesta perspectiva, num estudo recente, procurámos evidenciar os factores que desafiam a profissionalidade docente no quadro da nossa contemporaneidade e que influenciam a imagem social da profissão [«Professores e Escolas: a imagem social dos professores do ensino básico no Portugal contemporâneo, 1973-2005»].
Os resultados permitem-nos concluir que a percepção geral dos cidadãos face à profissão professor é claramente traduzida por uma imagem social valorizada, no dizer da maioria de inquiridos, quando consideram que “ser professor” é exercer uma profissão de prestígio social (64,3%). Por outro lado, quando perguntamos “o professor é para si”, sugerindo oito possibilidades, averiguámos que a imagem social percepcionada é, ainda, associada ao papel tradicional de “um transmissor de conhecimentos” (96,7%) e que na “primeira qualidade para ser professor” evidenciam a competência técnica/científica (39,3%), contrariando os desafios do trabalho do professor no mundo contemporâneo, que sublinham o seu papel como formadores, como mediadores, como construtores do conhecimento e “como profissionais da relação e agentes privilegiados da relação humana” (Isabel Baptista). Constatamos, ainda, que, apesar de frequentemente ser evidenciada uma imagem negativa (difundida por alguns), em contraponto, emerge neste estudo uma imagem pública positiva (quando a sociedade é convocada a opinar). Parece-nos que entre estas duas realidades existe o questionamento e o conflito permanente das sucessivas tutelas e de alguns fazedores de opinião pública, cujo acesso facilitado à Comunicação Social permite a divulgação das suas ideias, construindo e desconstruindo imagens com efeito público imediato. Assim, confirmando o que foi dito, revemo-nos nas palavras de Gimeno Sacristán, quando afirma que “podría decirse que su función es muy importante, pero las figuras que lo desempeñan, no tanto“. Pretendendo representar os desafios do trabalho do professor do Ensino Básico no século XXI, recorremos a três metáforas: – professor-arquitecto, no sentido de que desenhará os alicerces da educação básica de cada aluno ao contribuir para a construção hermenêutica do seu conhecimento; – professor-influenciador, porque lhe caberá motivar, com o seu exemplo, a personalidade humana, o reforço dos direitos humanos, favorecendo a tolerância e compreensão entre todos; – professor-construtor, porque lhe caberá juntar as peças do puzzle, respeitar a singularidade de cada um e edificar o futuro, juntando a memória do ontem e a oportunidade do amanhã.

Evangelina Bonifácio


  
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Edição:

Edição N.º 188, série II
Primavera 2010

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