Página  >  Edições  >  N.º 183  >  O Professor (Indiana) Jones

O Professor (Indiana) Jones

Para quem não se lembra, o personagem Indiana Jones é conhecido no lugar onde ganha o ordenado por Professor Jones. É professor de Arqueologia numa austera e formal escola britânica e usa laço e fato completo quando dá aulas.
Num voo de longo curso que fiz agora nas férias vi, no vídeo do avião, o último filme das aventuras do Professor Jones. Nada de muito novo, mas houve uma cena que me prendeu a atenção. Quando Indiana acabou de esmurrar com inusitada competência e eficácia uns malandros que o queriam apoquentar, um jovem que andava com ele nesta aventura, olhou-o entre o admirado e o desconfiado e disse: "Professor, hem??. O Professor Jones não se desmanchou e respondeu: "Só a meio tempo?".
Bom, a pergunta que logo me assaltou foi o que é que o Professor ("Jones") faz no outro meio tempo? Se ele só ensina a meio tempo o que faz ele ao outro meio? Eu acho que a resposta é evidente: "No meio tempo em que não ensina ele? aprende." De facto, o que seria do Professor Jones se não tivesse um tempo para, assumindo-se como Indiana, correr o mundo nos cenários mais hiper-reais que se pode imaginar; vendo, vivendo, recolhendo, analisando, enfim, aprendendo o que lhe é essencial para ensinar?
Este episódio sobre o Professor (Indiana) Jones lembra-me a importância que tem para o professor a oportunidade e o tempo para aprender. Quem só se preocupa com o ensino pode não ter tempo de aprender. Já há muito tempo se sabe que este tempo de aprender não se pode confinar ao tempo em que o professor é aluno: é um tempo em que o professor é pessoa.
É uma banalidade dizer que se aprende toda a vida. Claro que sim. Mas nós, que somos especialistas em aprendizagem, sabemos que esta aprendizagem que se faz muito mais eficientemente se for organizada segundo dois ou três princípios muito simples e talvez por isso sejam tão frequentemente negligenciados.

1. Aprendemos melhor com base em casos que conhecemos, que vivemos e que nos dizem respeito. Aprender modelos gerais e genéricos ajuda a organizar a experiência mas dificilmente contribui para melhorar práticas. Assim, quando se fala em desenvolvimento profissional dos professores era bom que os processos através dos quais se faz este desenvolvimento, fossem situados na prática e em problemas concretos. Uma prática encarada como desencadeadora de necessidades e orientada para a busca de respostas. Queremos aprender, por exemplo, sobre "problemas de comportamento"? Vamos então polarizar a formação sobre aqueles que temos, os que conhecemos e os que efectivamente podem fazer parte da nossa vida profissional.

2. Aprendemos melhor também quando enriquecemos a nossa experiência usando a experiência e as soluções dos outros. O trabalho cooperativo é muito raro e deficitário entre os professores. Se conhecermos melhor casos passados com outros colegas, o que foi feito, o que funcionou bem ou menos bem, enriquecemos exponencialmente o nosso conhecimento. A socialização e a troca que ela implica é antes de tudo uma poderosa ferramenta de aprendizagem a todos os níveis.

3. Aprendemos melhor também quando a vivemos ligados ao ambiente, ao contexto em que a aprendizagem tem lugar. A aprendizagem faz mais sentido quando suscita a ligação entre a escola, os pais, as famílias, as comunidades, os grupos profissionais e as autarquias. Uma escola que conhece e reconhece o ambiente em que está, aprende melhor e mais.
O Professor (Indiana) Jones já sabia disto quando disse aos alunos (no mesmo filme) que se queriam aprender Arqueologia tinham que sair da biblioteca. E sabia também que sem a sua vida de Indiana seria um desinteressante Jones que, enfatuado e obcecado com o ensino se tinha esquecido do blusão e de aprender. Sempre.

David Rodrigues


  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Edição:

N.º 183
Ano 17, Novembro 2008

Autoria:

David Rodrigues
Universidade Técnica de Lisboa e Coordenador do Fórum de Estudos de Educação Inclusiva
David Rodrigues
Universidade Técnica de Lisboa e Coordenador do Fórum de Estudos de Educação Inclusiva

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo