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Em jeito de rap do medo ao director

Colegas

Eu não quero director na minha escola porque tenho medo.
Medo do seu olhar severo e penetrante, sábio e simultaneamente compreensivo, conhecedor das realidades deste mundo e do outro.
Tenho medo que o director não me deixe faltar e exija atestados médicos a torto e a direito, mesmo quando eu tiver adormecido porque andei na borga toda a noite.
Muito medo vou ter do director, principalmente que ele me bata, o seu olhar feroz e a palmatória especada na parede logo por cima do seu cadeirão, mais parece um trono, uma longa mesa envernizada a fazer-me lembrar, por oposição, as secretárias de trabalho dos antigos conselhos executivos, um tinteiro de prata e uma fotografia do primeiro-ministro, ministra da educação e respectivas sumidades adjuntas; tenho medo porque me sinto intimidado perante tanta grandeza a apontar constantemente a minha pequenez e o meu mau carácter.
Tenho medo de ser mulher e humilhar-me na minha masculinidade, o seu olhar de troça fixando-se algures dentro de mim, onde não haveria de ninguém entrar.
Tenho medo do director porque tenho medo dos deuses, da sua imaculada moral, superior sabedoria, juízo à prova de qualquer erro, sem margem para dúvidas e hesitações, receio a sua determinação e a sua excelência.
E receio sobretudo o que ele me pode fazer se não gostar de mim, sei lá, se não for com a minha cara. Pode arranjar um quarto escuro num lugar recôndito da escola e deixar-me lá sem comer nem beber até eu dizer "sim Sr. Director, certamente, Sr. Director, sempre que queira Sr. Director, a qualquer hora, Sr. Director, para quando, Sr. Director, lembre-se de mim Sr. Director quando for da avaliação, tenho mulher e filhos, por favor Sr. Director, apelo à sua magnanimidade Sr. Director, tudo que quiser Sr. Director, mesmo tudo.
Por favor colegas, salvem-me do director. Por uma questão de humanidade. Tirem-me deste filme!!


  
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Edição:

N.º 174
Ano 17, Janeiro 2008

Autoria:

Paulo Gonçalves
Professor, Porto
Paulo Gonçalves
Professor, Porto

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