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D. João VI e a retirada da família real para o Brasil
Em 27 de Novembro comemoram-se os 200 anos da partida da Corte Brigantina para o Brasil, saída que salvaguardou a Monarquia Portuguesa da "fúria" napoleónica. Obrigada a partir, por conta da invasão das forças franco-espanholas e do bloqueio marítimo inglês, a família real em 1807 embarca com destino ao Rio de Janeiro, capital da sua mais rica colónia, e que, segundo D. Luís da Cunha, talvez o mais importante diplomata português do séc. XVIII, era geograficamente a cidade mais bem posicionado para ser a nova sede do império.
Tal partida, planeada por um lado, pois se sabia das intenções francesas, mas feita às pressas por outro, pois em poucos dias tudo estava pronto para o embarque, foi vista por alguns como sendo uma fuga caótica. Raul Brandão, historiador português no início do século XX no seu livro "El-Rei Junot" satiriza a retirada da família real.
Brandão e Oliveira Martins são dois dos historiadores que fizeram escola ao apresentarem D. João VI como um homem fraco, comilão, tedioso, inofensivo e incapaz. No século passado a historiografia tentou mudar esta imagem grotesca do monarca, que de facto era indeciso, tão indeciso que apesar dos preparativos para a trasladação da Corte esta só partiu com as tropas francesas já em território português. Oliveira Lima, historiador brasileiro, é um dos primeiros que procura colocar o homem no seu tempo, as acções no seu contexto, mostrando a partida não como uma debandada desorganizada e sim como uma acção política inteligente.
O certo é que a Corte rumou para o outro lado do Atlântico e tal facto mudou a história do império português. Pela primeira vez um monarca europeu saía do seu continente para visitar, conhecer e residir em suas terras no Novo Mundo, deslocando o centro do império para os trópicos, transformando as relações colónia-metrópole irremediavelmente. A abertura dos portos, a criação de instituições, a elevação do Brasil a Reino Unido, cria uma nova relação com a antiga metrópole invadida e com as outras partes do império. Do Rio de Janeiro a monarquia portuguesa vai reinar, legislar e até expandir o seu império.
As relações entre Brasil e Portugal foram completamente alteradas, e isto constata-se através da análise da documentação sobre o período. No Arquivo Histórico Ultramarino, situado em Lisboa, precisamente nas séries Reino, Rio de Janeiro e Ultramar, é possível compreender como era a relação entre a Junta que governava o Reino e o Conselho de Estado que estava no Rio de Janeiro. Percebe-se como os secretários de Estado repassam as ordens régias para que a Junta em Lisboa pudesse resolver questões administrativas, pedidos de particulares, da nobreza que ficou, de jurisdição entre instituições e até pequenos motins.
Tudo passava pelo Rio de Janeiro, cabendo a quem ficou cá governar da melhor forma e manter viva a questão da integridade da monarquia portuguesa e de todo o império. As consequências que advieram deste facto são bem conhecidas, a revolução de 1820 iniciada no Porto é o sintoma mais característico da insatisfação com a escolha do rei em não retornar a Portugal em 1815. Mas isto é uma outra história.

  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 172
Ano 16, Novembro 2007

Autoria:

Érika Simone de Almeida Carlos Dias
Mestre em História do Brasil Colonial. Professora e Investigadora do Projecto Resgate no Arquivo Histórico Ultramarino (AHU)
Érika Simone de Almeida Carlos Dias
Mestre em História do Brasil Colonial. Professora e Investigadora do Projecto Resgate no Arquivo Histórico Ultramarino (AHU)

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