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Em busca de uma alternativa credível

Avaliação do desempenho

O Ministério da Educação apresentou a sua proposta relativamente à avaliação do desempenho docente. Pese os problemas técnicos do documento apresentado, importa reconhecer que estes são problemas que derivam, acima de tudo, dos problemas políticos da proposta ministerial. Isto é, não vale a pena discuti-los se não os compreendermos como expressões de uma opção que entende a avaliação do desempenho docente como uma operação que visa discriminar os educadores de infância e os professores deste país pelas manifestações exteriores do seu desempenho como profissionais da educação. É para isto que queremos a avaliação de desempenho? É para cumprir tal função que necessitamos da mesma?
A proposta do Ministério, tal como se encontra formulada, não deixa de afirmar uma concepção de avaliação de desempenho que valoriza a função do controlo em detrimento da função de reflexão. Basta, por isso, definir um conjunto de listas de verificação de comportamentos e uns roteiros de auto-avaliação que o problema parece ficar resolvido, mesmo quando essas listas são ambíguas quanto às suas intenções e nos oferecem bastantes dúvidas quanto aos riscos subsequentes que se correm no âmbito do seu processo de operacionalização.
Há alternativa? Há certamente uma alternativa que, no entanto, não se circunscreve à reformulação das grelhas e dos roteiros atrás referidos. A alternativa que necessitamos de construir obriga-nos a conceber o processo de avaliação de desempenho em função de outros parâmetros conceptuais e praxeológicos. Um processo cuja finalidade não se circunscreve à produção de julgamentos de uns sobre a actividade desenvolvida por outros, mas, tal como afirma Kemmis (1986), como um processo através do qual se projecta, obtém, confere e organiza informações, bem como argumentos que permitam às pessoas participar numa reflexão sobre os problemas em debate. De acordo com esta última concepção, o controlo sobre a acção profissional dos professores é menor, ainda que possa potenciar a sua capacidade de intervenção perante situações e desafios que, deste modo, podem deixar de lhes ser indiferentes ou estranhos.
O que se reivindica aqui é que a avaliação de desempenho não se converta num expediente, mais ou menos burocrático para se manter um controlo sobre os professores que os desqualifica como profissionais. Um controlo que, como demonstrou Licínio Lima na última «Página» a propósito do concurso dos professores titulares, não prima pela lisura de procedimentos e que, como depressa se constatará, funciona mais como um factor de dissuasão de comportamentos não desejáveis, por parte dos professores, do que propriamente como um factor capaz de estimular o seu investimento e a sua inventividade pedagógica.
O que se reivindica, então, é que a avaliação do desempenho possa constituir, a prazo, um factor capaz de contribuir para que os docentes se assumam quer como profissionais mais exigentes, quer como profissionais mais capazes de animar intervenções de natureza pró-activa. Sendo importante compreender que tais finalidades não dependem, apenas, de um projecto de avaliação do desempenho, por mais qualidade e competência que este revele, também é fundamental constatar que tal projecto pode assumir, neste âmbito, um papel estratégico nuclear.
A proposta do governo não responde, no entanto, a estes propósitos, ainda que cumpra um papel político inestimável, no momento em que contribui para fazer passar, junto da opinião pública, uma imagem respeitável e competente do Ministério da Educação, mesmo quando se sabe que tal imagem se constrói, por um lado, à custa da imagem dos educadores e dos professores deste país e, por outro, à custa da adopção de medidas políticas que sejam credíveis e que, a prazo, contribuam para mudanças substanciais no quotidiano dos nossos jardins-de-infância e das nossas escolas.
Definida uma concepção de avaliação de desempenho, alternativa à do Ministério da Educação, importa agora demonstrar como é que a mesma pode ser concretizada, de forma a respeitar-se os compromissos atrás enunciados. Será no próximo número de «a Página» que enfrentaremos este desafio, tentando demonstrar como o mesmo não só é necessário, como, igualmente, é exequível.


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 172
Ano 16, Novembro 2007

Autoria:

Ariana Cosme
Fac. de Psicologia e Ciências da Educação, Univ. de Porto
Rui Trindade
Faculde de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto
Ariana Cosme
Fac. de Psicologia e Ciências da Educação, Univ. de Porto
Rui Trindade
Faculde de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto

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