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Professores? e agora?
No Rio de Janeiro, numa manifestação de professores, gritava-se, diante da Prefeitura da cidade, «Viva a reprovação!». Foi a resposta que esses professores encontraram para reagir a uma decisão política da Secretaria Municipal de Educação que determina que, no que corresponde, em Portugal, ao Ensino Básico, só se pode reter os alunos no fim de cada um dos ciclos de escolaridade que integram esse nível educativo. Salvaguardadas as devidas proporções, lembramo-nos do grito maldito dos falangistas quando se faziam ouvir, na Espanha de Franco, com um «Viva la muerte» tão sinistro quanto hediondo.
O que fazer? O que fazer quando os professores reivindicam a reprovação dos seus alunos como um requisito da sua afirmação como profissionais? Para onde é que vamos?
Por outro lado, os que se colocam no papel de redentores do nosso sistema público de educação, a começar pela equipa da Professora Maria de Lurdes Rodrigues, o que propõem em troca? Reivindicam a necessidade de democratização do sucesso dos nossos alunos como arma de arremesso e oferecem-nos o concurso de professor titular. Uma medida que, ousamos profetizar, não só não vai resolver nada do que anuncia vir a resolver, como, pelo contrário, vai contribuir para agravar a qualidade da vida dos professores nas nossas escolas. Os líderes pedagógicos não se encontram por concurso. É demasiado arriscado. Um risco que não compensa a subida ao trono de um número sempre excessivo de burocratas que vão empalhar projectos e vontades em nome de uma ordem que impede a afirmação do educativo e do humano. O que fazer?
Confessamos que, neste momento, andamos como o tolo no meio da ponte. Indecisos e descrentes, só nos resta aguardar, neste momento, pelo congresso do Movimento da Escola Moderna Portuguesa (MEM) para sentir o sopro de vida e de esperança que a partilha de experiências profissionais concretas acalenta e a boa cumplicidade entre colegas que acreditam que a Escola pode ser mais do que um espaço de sofrimento inútil, suscita. Em todos os Julhos, desde há uns anos a esta parte, é para essas termas das almas que nos dirigimos.
Eis uma das respostas que encontramos. É no seio de companheiras e de companheiros de profissão que nos dispomos a escutar, a aprender, a apoiar e a interpelar e, assim, a participar na construção de uma profissão, sem intrigas, sem desculpas, mas também sem negar pressupostos e compromissos com a construção de uma Escola que contribua para que possamos viver numa sociedade mais democrática. E é assim que, por exemplo, quando uma educadora de infância nos mostra como é que as crianças, com as quais trabalha, participam na avaliação quotidiana, relativamente ao espaço e ao trabalho que lhes diz respeito, acaba por nos convocar para participar, desse modo, num exercício de cidadania que se caracteriza por não atribuir aos outros aquilo que só a nós compete fazer. Os exemplos são inúmeros e diversos. Não vale a pena enumerá-los, até porque aquilo que nos interessa afirmar é que a quase centena de educadores e professores que arriscam partilhar com os seus colegas, ano após ano, a reflexão sobre as suas práticas nem abdicam de ser professores, sem que com isso possam ou queiram abdicar dos seus alunos, nem esperam que sejam outros a prescrever os caminhos que eles decidiram trilhar. Com ou sem professores titulares, competentes e incompetentes, há que continuar a vida, há que continuar a luta, há que continuar a ser professor. É, por isso, que apesar do cansaço, esperamos esses quatro dias de Julho onde nos podemos afirmar como profissionais e como gente.

  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 169
Ano 16, Julho 2007

Autoria:

Ariana Cosme
Fac. de Psicologia e Ciências da Educação, Univ. de Porto
Rui Trindade
Faculde de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto
Ariana Cosme
Fac. de Psicologia e Ciências da Educação, Univ. de Porto
Rui Trindade
Faculde de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto

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