Página  >  Edições  >  N.º 166  >  Choque tecnológico ou telemobilístico?

Choque tecnológico ou telemobilístico?
Um rapaz caminhava de um lado para o outro na rua. Aspecto de quem estava mesmo cansado. Não tanto de andar mas de ouvir o interlocutor. Olhos por tudo quanto era distracção ? pessoas, carros, graffitis ?, auricular na orelha e telemóvel na mão.
? Olha, já nem tenho vontade de ir aí!
Do outro lado adivinha-se alguém bastante insistente. Mas o rapaz não recua.
? Olha, já nem vou ter vontade de ir aí amanhã!
A impaciência cresce e a mão que segura o telemóvel já sobe e desce num gesto ameaçador.
? Olha, já nem vou aí nunca mais! Adeus!
E fecha a tampa ao telemóvel.
Uma rapariga tira da carteira o telemóvel novo para o mostrar à amiga. Despe-o da bolsinha com desenhos das «Powerpuff Girls» e começa a chorar. Confessa à amiga que o comprou apenas para poder mudar de rede e de número. Diz-lhe que tem de ser. Que não pode continuar à espera que o ex-namorado lhe ligue a dizer que a ama. Prefere saber que ele não lhe vai ligar porque simplesmente ela não lhe deu o novo número. Mas ainda assim não se dá por confortada e não pára a choradeira.
A amiga consola-a:
? Liga-lhe só mais uma vez, diz-lhe o que verdadeiramente sentes!
A rapariga não consegue conter as lágrimas e continua a explicar o drama do fim do namoro que decididamente não queria acabar.
? Já lhe disse!! Estou farta de passar horas e horas com ele ao telemóvel!!!
Depois relata à amiga que ainda na noite anterior saíra de casa às 4 da manhã para telefonar ao ex-namorado de uma cabine. Isto depois de ter ficado sem saldo no telemóvel "velho". E sem saldo no telemóvel "novo", de onde ainda lhe telefonara mas com o número não identificado no destinatário. Cheia de boas intenções a amiga argumenta uma solução mais económica:
? Manda-lhe uma sms!
A rapariga exalta-se num misto de revolta e vontade de partir violentamente o telemóvel no chão.
? Já mandei milhentas sms, esgotei os kolmis e ele nada, simplesmente não me liga! Nem me atende!
Um rapaz chega a casa. Tem o telemóvel desligado há três dias. Desligou-o depois de uma sms enviada à namorada para acabar o namoro sem grandes discussões. A mensagem fora vaga:
? Sorry, período de luto! N sei qto tempo vai durar.
Depois saíra da cidade rumo a casa de um amigo que morava na aldeia, deixando o telemóvel pousado na mesinha de cabeceira. De volta, fitava-o ali quieto, ainda onde o deixara.
Crescia-lhe uma ansiedade no peito em relação ao que fazer. Se ligasse o telemóvel sabia que teria de ler sms insultuosas ou mensagens de «voice mail» histéricas da namorada aturdida por tal comportamento. Se não ligasse nunca saberia qual a sua reacção, algo que no fundo ele queria saber...
Duas horas passaram. Depois passaram mais quatro. A coragem surgiria ao fim da tarde quando finalmente marcou o PIN. Esperou pelo sinal de sms. Meia hora. Uma hora. Nada. Então ligou à namorada. O telemóvel dela estava desligado.

  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Edição:

N.º 166
Ano 16, Abril 2007

Autoria:

Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação
Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo