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Comida de lixo

Para Nuno Fernandes, que tomou conta da minha delicada doença estes meses. Tem-me feito não apenas ser agradecido, bem como amá-lo.

Era um caixote de lixo. Era o prato desses que nada tinham para comer. Era o sítio onde procuravam alimento porque despensas não tinham para os guardar. Era o caixote de lixo. O armário do desamparado. Comida podre que ajudava a manter a vida em solidariedade aos solitários sem trabalho, sem amparo, sem cunha para procurar alternativas de criar trabalho já tão dividido entre a população. Não foi em vão que em 1775, na Grã-Bretanha, Adam Smith provou a necessidade de partilhar a actividade de construir sítios de oferta do que não se tinha, mas sabia-se construir e vender por um valor definido pela população capaz de organizar uma actividade de artesanato por eles determinada; e procura do que não se tinha e não se sabia construir, mas que se podia vender/comprar pelo que ele denominara valor ? trabalho.
Esta não é uma hipótese, é toda a síntese da teoria liberal, do que desde esse dia passou a denominar-se Economia. Economia de acumulação de lucro, Economia de procurar trabalho produtivo e remunerado, antes de entrar em depressão ou em suicídio para obter um ordenado já bem dividido entre a solidariedade da família e dos vizinhos a saber corresponder à fugida ao caixote de lixo. Muitas ideias ocorreram entre as de Smith e o dia em que Émile Durkheim, espantado pelos delitos da Comuna de Paris, a guerra Franco Prussiana, leitor do sucessor de Gracchus Babeuf, fundador da Comuna para Governar Paris - Karl Marx orientador de Émile Durkheim e Marcel Mauss nas suas ideias socialistas que fundam, baptizada pelos seus fundadores já mencionados, a Ciência da Sociologia.
Socialismo ou Sociologia? Acaba em Sociologia, o nome da Ciência que explica a interacção social, a procura de alternativas, de construção de ideias para a formação do grupo e a sua capacidade. Não é em vão que em 1892 Durkheim acaba a sua tese de Doutoramento, orientada por Tönnies e é publicada no mesmo ano. Esse é o texto que debate com o liberalismo e faz lembrar a todos eles que existe a divisão do trabalho, mas que esta é social. Por outras palavras, o trabalho está dividido em capacidades e espaço para se poder ter um lugar remunerado e não ir comer ao caixote do lixo nem se deprimir por falta do mesmo.
O caixote do lixo não é apenas a solidariedade para comer a comida do pobre. É partilhar o que se sabe, dentro de uma casa denominada escola, na qual toda a criança aprende a subordinar-se às regras legais definidas pelo caixote de lixo. Subordinação que permite, ou não, o entendimento da vida em sociedade, dentro do Direito, da Ordem Social e da Paz.
Durkheim debate com Smith e salienta as ideias de Marx, colabora com a queda dos Czares da Rússia e faz parte do Parlamento Menchevique, prévio ao parlamento leninista, ou Duma, em conjunto com Mauss, fundador de l'Humanité.
O caixote do lixo é um processo baseado na estrutura do entendimento da divisão social do trabalho e da sua existência.

*Devido a um problema delicado de saúde, fui pela primeira vez, em 13 anos, incapaz de escrever um texto para a Página.


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 164
Ano 16, Fevereiro 2007

Autoria:

Raúl Iturra
Instituto Superior das Ciências do Trabalho e da Empresa, Lisboa
Ana Paula Vieira da Silva

Raúl Iturra
Instituto Superior das Ciências do Trabalho e da Empresa, Lisboa
Ana Paula Vieira da Silva

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