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Uma outra Escola é possível
A escola, como espaço híbrido, tornou-se o lugar da construção da esperança e da desesperança. Nesse contexto, as professoras e professores que habitam as escolas públicas de nosso país, ora se sentem parte do processo de transformação dessa sociedade, ora sentem-se como sujeitos que compactuam com o sistema atual e ora se sentem impotentes diante das diferentes demandas que o sistema nos impõe.
Nesses diferentes lugares muitas vezes assumimos posturas que, apesar de estarem em consonância com os ideais voltados para a construção de uma outra escola e uma outra sociedade, nos fazem sentir isoladas em nossas próprias escolas, em nossas próprias salas de aula. Para sanar parte dessa angústia, resultante da solidão pedagógica em que nos encontramos, muitas vezes buscamos dialogar com os autores que escrevem e compartilham connosco essas mesmas expectativas. Mas, por não acreditarmos ser suficiente a reflexão solitária, procuramos o coletivo do qual somos parte em busca de dialogar, de aprender junto sobre o que temos realizado e defendemos.
Nesse sentido, o Seminário Fala Outra Escola, organizado pelo GEPEC - grupo de professoras e pesquisadores da Universidade de Campinas, revelou-se para nós um importante espaço de troca de experiências através do diálogo que reafirma a importância da construção de outras práticas educativas e da interlocução entre diferentes sujeitos como elemento imprescindível à nossa busca.
Ter estado nesse evento permitiu-me compreender, no diálogo com outras e outros professores que, apesar de estarmos inseridas em um projeto global que subalterniza e oprime as professoras e professores, desqualificando nossos saberes, fazemos parte também da construção de um outro projeto que visa romper com esse projeto hegemônico. Reconhecer a existência e artimanhas desse projeto global foi um primeiro passo para a possibilidade de construção de um outro projeto contra-hegemônico.
Os três dias do evento serviram, entre outras coisas, para reacender a esperança das que lutam pela democratização da gestão, do acesso e permanência das crianças oriundas das classes populares numa escola que se pretende de qualidade social. Mostrou-me que não somos poucas e poucos, visto que foi preciso suspender as inscrições dias antes do início do evento por ter sido atingida a capacidade máxima do auditório onde seria realizado. Mostrou-me que não estamos paradas, visto que para as mesas de diálogos foram aceitos 113 trabalhos deixando, infelizmente, muitas experiências interessantes de fora. Mostrou-me que é importante o que fazemos em nossos micro-espaços e que é importante socializarmos o que fazemos para que essas experiências atinjam outros espaços, outras pessoas e se mesclem com outros saberes. Mostrou-me que há algo a fazer e que algo já está sendo feito. Mostrou-me que, apesar de meu sentimento de estar sozinha em minha escola e outras colegas também se sentirem sozinhas em suas escolas, existem espaços onde podemos nos encontrar e não nos sentirmos mais sozinhas, nem pedagógica nem politicamente. Mostrou-me que, apesar de sentir que meus pares muitas vezes não estão próximos, e me entristecer com isso, o fato de estarmos espalhados permite que, estando em diferentes espaços, do norte ao sul do Brasil, a rede que estamos construindo se amplia a cada encontro de professoras e professores. Mostrou-me que apesar de sermos diferentes e pensarmos a partir de nossos diferentes contextos e virmos de diferentes lugares, mesmo assim podemos agir visando aos mesmos propósitos.
O Fala Outra Escola mostrou-se um espaço facilitador de reflexões que só foram possíveis por terem o diálogo como eixo norteador. A reflexão entre os outros e nós, sem a hierarquização que comumente separa os que estão ali, uns para ouvir, dos que estão para falar. Ali estávamos interagindo num espaço construído para aprender-ensinando e ensinar-aprendendo através do diálogo, vivido e experimentado, por aqueles que o constroem por já trazerem essa concepção em seus saberes de professoras.
Mais do que tudo isso, o Fala Outra Escola mostrou-me que a possibilidade de construção de uma outra escola não é apenas uma possibilidade, mas uma realidade que vem sendo construída cotidianamente em diferentes espaços. Que esse outro projeto não é um sonho solitário com o qual os sem-esperanças costumam se identificar, mas um sonho coletivo de uma professora em meio a tantas outras professoras que se reúnem porque acreditam em si mesmas e no potencial de nossas crianças, portanto acreditam na possibilidade de uma outra educação numa outra escola pública, e por isso persistem na luta.

  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 164
Ano 16, Fevereiro 2007

Autoria:

Daniela Pereira da Silva
GRUPALFA ? Pesquisa em educação das classes populares. Universidade Federal Fluminense, Rio de Janeiro
Daniela Pereira da Silva
GRUPALFA ? Pesquisa em educação das classes populares. Universidade Federal Fluminense, Rio de Janeiro

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