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Sobre a importância de uma licenciatura em educação básica
O anteprojecto de decreto-lei sobre o Regime Jurídico da Habilitação Profissional para a Docência preconiza a formação inicial de educadores e de professores dos ensinos básico e secundário, em dois ciclos de formação, fazendo corresponder aquelas formações ao grau de mestre, depois de uma licenciatura. O anteprojecto pouco traz de novo acerca da formação de professores para o 3º ciclo e ensino secundário. Como já referi noutro artigo, na formação ? universitária - de professores para estes níveis de ensino, tem predominado uma lógica bi-etápica e, nesse aspecto, é facilmente ajustável à estrutura bi-ciclica agora proposta: 1º ciclo de formação científica de 3 anos (licenciatura), seguido de percursos especializados (mestrado) em que se inclui a formação para a docência. No quadro de Bolonha, o 1ºciclo de formação corresponde a uma licenciatura com identidade científica, aberturas a novas etapas académicas ou adaptação, através de estágios e formação no contexto de trabalho, a desempenhos profissionais baseados na formação científica adquirida na licenciatura. Significativas e, em alguns aspectos, inadequadas à nossa realidade, são algumas mudanças propostas para a formação de educadores e professores do 1º ciclo do EB. De cursos organizados e consolidados, em toda a extensão, para a profissionalização nesses níveis de ensino, pressupondo claras opções profissionais, desde o início, por parte de quem neles ingressava, passa-se, com esta proposta, para formações ao longo de dois graus académicos (licenciatura e mestrado) em que o primeiro é sobre generalidades e só o 2º atribui um diploma profissional. A questão coloca-se, sobretudo, na identidade e utilidade do 1º ciclo de formação, designado, no anteprojecto, como licenciatura em Educação Básica. A designação é, em si própria, vaga e generalista e pouco atractiva para jovens que procuram formações superiores, curtas e de cariz profissional. Para que serve? A quem poderá interessar um curso de licenciatura como o que é descrito no anteprojecto? Certamente que só a quem deseja, desde o início, vir ser educador ou professor. Este espaço temporal de 3 anos (180 ECTS) parece artificial e com frágil significado e utilidade a não ser para finalidades estritamente docentes. Porquê, então, dividir a formação em dois ciclos-graus para uma finalidade, em vez de manter um curso com unidade, continuidade e coerência que tivesse no seu horizonte, com as necessárias opções, a realização de perfis de educadores e de professores dos 1º e do 2º ciclos? Mas, ao considerar um grau inicial de licenciatura, com é o caso do anteprojecto, seria desejável que constituísse o fim de uma etapa formativa que dotasse o diplomado com um conjunto de competências para ingressar no mercado de trabalho ou, se assim o desejasse, continuar, em seguida ou mais tarde, a sua formação numa área de um conjunto de opções em que também se incluiria a docência. Quem faz a opção por um curso profissionalizante deseja ver, no horizonte de uma etapa académica, a sua utilidade prática. Existem, no espaço social alargado em que se inclui a docência, outras áreas específicas de intervenção que necessitam de profissionais habilitados: trabalho com jovens e crianças, com comunidades imigrantes, em autarquias, em estruturas de apoio social, em diversas formas de mediação e de animação, na produção de materiais de natureza educacional, etc. Sem profundas alterações da matriz de formação apresentada no anteprojecto, e através de opções para aprofundamentos em áreas profissionalizantes específicas, seria possível realizar essa finalidade. O grau de licenciatura tem, na sociedade portuguesa, importância e impacto social que não fará sentido desbaratar enquanto etapa de passagem, sem evidente identidade e utilidade para os potenciais candidatos.
Como recomenda o recente relatório de avaliação da OCDE, deve ser mantido o sistema binário no ensino superior Português e assegurada a oferta ? sobretudo pelos politécnicos - de cursos vocacionados para públicos que, cada vez mais, procuram formações superiores curtas e de cariz vocacional e profissional. Escasseiam em Portugal tais cursos que atenuem as conotações elitistas do ensino superior e contribuam para inverter a alta percentagem de jovens portugueses que nele não ingressa. Para não falar da premente necessidade de recuperar formações técnico - profissionais de qualidade, no espaço entre o ensino secundário e cursos superiores de curta duração. É de crer que muitos jovens, que actualmente não realizam formações superiores, o fariam se as ofertas formativas tivessem aquelas características.

  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 163
Ano 16, Janeiro 2007

Autoria:

Carlos Manuel Neves Cardoso
Escola Superior de Educação de Lisboa (ESEL). Centro Interdisciplinar de Estudos Educacionais (CIEE)
Carlos Manuel Neves Cardoso
Escola Superior de Educação de Lisboa (ESEL). Centro Interdisciplinar de Estudos Educacionais (CIEE)

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