Página  >  Edições  >  N.º 160  >  A criança e a mídia: produzindo cultura

A criança e a mídia: produzindo cultura

As crianças que já nascem imersas na cultura da mídia já são outras crianças, com uma organização do pensamento advinda dessa nova vivência. Muitos professores, pais e escolas ainda não se deram conta de que as crianças mudaram e encaram negativamente essa diferença, buscando para ela um bode expiatório. Ora culpam a TV, ora a internet, ora os vídeo-game como se todas essas tecnologias não fizessem parte de um contexto maior que mostra que a infância de hoje está se constituindo de outra forma. No entanto, o exame em perspectiva histórica dessa mudança aponta porque as crianças de hoje não podem constituir sua infância da mesma forma que as crianças de gerações precedentes a constituíram. A criança, que nasce e cresce em meio a esse universo midiático, constrói saberes, habilidades e costumes diversos dos que nós adultos construímos quando pequenos. Fala-se muito hoje, por exemplo, que as tecnologias acabaram com as brincadeiras das crianças, mas o que se percebe é que as brincadeiras são outras, como as falas abaixo apontam:
GUSTAVO: Se não tivesse TV eu ia sentir falta, não teria nada para fazer em casa... A não ser jogar computador, brincar de Lego, jogar Totó e fazer outras coisas mas a TV é o principal.
PHILLIPE: Quando eu era pequeno eu pegava meus carrinhos, pegava umas casinhas de papel e pelo assunto que eu estava vendo na TV eu discutia com os carrinhos... É... Inventava alguma história.
Tais falas mostram que a TV faz parte da brincadeira e, às vezes, é a brincadeira principal. Ver TV é também uma brincadeira. Brougère, estudioso do brincar, aponta que há uma relação de reciprocidade entre TV e brincadeira. A TV alimenta a brincadeira e, ao mesmo tempo, a brincadeira  permite à criança apropriar-se dos conteúdos da TV. O autor nos mostra como a TV, e também outras tecnologias, transformaram a vida e a cultura lúdica da criança. Como a cultura não está fechada em torno de si mesma, está sempre integrando elementos externos que influenciam a brincadeira. Como, então, dizer que as crianças não são produtoras de cultura, criadoras de novos modos de brincar e de constituir a infância? Normalmente, a relação da criança com a mídia é vista sob dois pontos de vista opostos: ou a criança é totalmente dominada/manipulada pela mídia ou a criança é mais inteligente e esperta por causa da mídia. A relação dela com a mídia parece ser determinante para o bem ou para o mal. Qualquer um dos pontos de vista é radical não  permitindo discernir as diferentes faces da questão. Urge pensarmos com bom-senso: a criança é produtora de cultura e pode fazer um bom uso da mídia, mas esse uso também depende da intervenção do adulto, da nossa mediação e da nossa responsabilidade. O que vamos oferecer para que ela possa ampliar seu olhar e sua imaginação, criando cultura cada vez mais a partir de sua vivência com as pessoas e com os produtos culturais? Esse é um desafio que é de todos nós.


  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Edição:

N.º 160
Ano 15, Outubro 2006

Autoria:

Adriana Hoffmann Fernandes
Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro/UERJ. Membro do Projeto ?Infância, Juventude e Indústria Cultural-sociedade, cultura e mediações.
Adriana Hoffmann Fernandes
Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro/UERJ. Membro do Projeto ?Infância, Juventude e Indústria Cultural-sociedade, cultura e mediações.

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo