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Gémeo ? uma identidade dilemática

Procuramos compreender o processo de (re)construção identitário nos gémeos, concretamente a forma como percepcionam e integram a diversidade do grupo na individualidade da identidade do elemento. Propomo-nos desocultar de que modo as representações sobre os gémeos, bem como deles sobre si próprios, assim como o processo de socialização (Santiago, 1996; Crespi, 1997; Dubar, 1997; Cortesão, 2001), interferem na construção da imagem e da identidade dos gémeos, sendo esta o resultado de um processo de transacções objectivas e subjectivas. Sendo a gemelaridade uma condição objectiva, em que medida pode ser subjectivada pelo sujeito na construção da sua identidade? Quais as estratégias a que recorre para se construir e reconstruir? Como e por que é que agencia a sua identidade?
Marcada pela dualidade, a identidade é simultaneamente um processo biográfico e relacional, podendo ser entendida num contexto espácio-temporal. O meio está repleto de significados sociais e culturais que permitem que cada um construa, em relação com os outros, uma experiência própria e particular do mundo, dando início à construção do conhecimento do mundo e do eu.
Poderemos falar de identidades para o outro, atribuídas, referentes ao reconhecimento atribuído pelo outro, que será sempre incompleta, já que «não posso colocar-me no lugar do outro, tentando adivinhar o que pensa de mim» (Dubar, 1997), e de identidades para si, reclamadas, resultantes do bricolage dos diferentes selves, do maior ou menor grau de reflexibilidade do indivíduo (Stoer, et al, 2004). A pluralização das identidades do indivíduo não pode ser reduzida à existência de personalidades múltiplas. Poder-se-á, então, falar de identidades compósitas, híbridas, mestiças, sobrepostas, novas.
A identidade e a alteridade constroem-se num processo de interacção em que o indivíduo percorre o caminho que vai do eu, ou nós, ao outro que vai descobrindo, sendo o eu ou nós construções interculturais (cf. Vieira, 1999). A identidade pessoal é uma construção social.
O modo como, em geral, os gémeos são olhados, não facilita a diferenciação. A separação de identidades relativamente a alguém tão próximo poderá ser complicada, principalmente nos gémeos idênticos.
Consideramos o caso dos gémeos paradigmático para pensar a complexidade do processo identitário, pois não considerar a diferença nos gémeos, reduzi-los a uma mágica igualação, pode ser uma decisão simplificadora. O que se exclui é a própria alteridade pela qual se constitui um sujeito face ao outro. O sujeito, no acto de conhecer, encontra fora de si e oposto a si não apenas o mundo, mas também a si mesmo no outro.
Conforme Lévi-Strauss «o indivíduo acede à consciência de si, por diferenciação dos outros e assimilando a identidade do grupo que designa e identifica como seu» (1974, in Vieira, 1999a). A propósito desta definição de Lévi-Strauss, consciência de si, parece-nos importante desvendar a partir de que momento, em que fases, o gémeo que é outro mas que é tido como o mesmo, passa a ser visto como ?outro? e serve de alteridade para a reflexividade do eu mesmo. «Os traços do Outro permitem um melhor conhecimento do nosso próprio rosto» (Nicollescu, 2000: 82).
Recolocamos, na condição pós-moderna, a questão da (re)construção e individualização/individuação da identidade nos gémeos,  na assunção de que a pessoa ?auto-consistente? que ?tem? uma ?identidade? é produto de um processo histórico distinto desta condição (Verdery, 2004).
«Nada é nunca tão simples quanto parece no domínio da identidade» (Kaufmann, 2005: 221)


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 160
Ano 15, Outubro 2006

Autoria:

Isabel Miranda
Professora do 1.º Ciclo do Ensino Básico. Mestranda em Educação e Diversidade Cultural - (ESE-Leiria)
Isabel Miranda
Professora do 1.º Ciclo do Ensino Básico. Mestranda em Educação e Diversidade Cultural - (ESE-Leiria)

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