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Linguagens e representações em luta

O«mundo arruinado» da educação

Os sistemas educativos, percebidos como contextos de pensamento e de acção sobre o papel e o sentido da educação, são construídos no âmbito de colectividades sociais e políticas heterogéneas. A sociedade, o mundo, é possível porque existem comunidades de crenças, de hábitos e linguagens e o mundo da Educação pertence a todas estas comunidades, justamente porque requer um sentido comum partilhado que, na sua génese e desenvolvimento, prende-se com a Intencionalidade das acções pensadas e levadas a curso. Porém, e porque se trata de uma Intencionalidade que confere sentido à acção humana, a sua lógica só é possível de ser compreendida a partir da construção subjectiva dos agentes e dos actores que a protagonizam, não propriamente em torno de um ambiente de incerteza fabricada ao gosto da especulação. Sendo o discurso educativo e pedagógico, na opinião do filósofo Olivier Reboul, por exemplo, o mais ideológico de todos os discursos, mesmo, e paradoxalmente, por relação ao discurso político, percebe-se pois que a Educação, como discurso ideológico, integra um sistema complexo de representações baseadas na linguagem, de origem, por um lado, comunitária e, por outro, porque sendo um discurso pedagógico sobre educação, moral, mercê de uma verdade e de uma ordem prática que se pronunciam na legitimação de um determinado poder.
Assim sendo, a crise que hoje parece estar a dizer-se (não no sentido de uma história que se está a finalizar) implica, em contrapartida, que se recupere a discussão filosófica da educação, na medida em que, actualmente, os Projectos de e em Educação, vistos como utopias práticas, vêem-se ocupados no ?conflito das diferenciações?, desde logo, porque a representação que se constrói sobre a acção é também diferenciada e plural. As propostas de políticas educativas de inovação possuirão sempre um êxito inseguro, na medida em que, ao pretenderem incidir sobre a experiência real dos sujeitos da educação (pais, professores, estudantes) e, para além disso, sendo que a acção humana é também por si ética, torna-se praticamente impossível desenvolver uma acção baseada no que se tem de ?pedir? ao sujeito: aos professores, por exemplo, não se lhes pode ?pedir? apenas que obedeçam ou se adaptem à introdução de uma ?solução da crise?, porque as suas acções são representações suas, não constituem acções pré-determinadas. De facto, ao considerar-se a educação e, particularmente, a educação escolar nas suas vertentes criadora, regenerativa, extraordinária, parece ser uma incoerência querer regular o que ainda está por vir. A crise actual em educação é uma crise cultural de dispersão de expectativas, onde as fracturas visíveis na ideia de um projecto universal para a educação devem-se também à dispersão de razões e de sentidos políticos sobre o ensinar e o aprender, próprios da razão, dos fins e dos desejos colectivos, mas, cada vez mais, individualmente apropriados.


  
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Edição:

N.º 159
Ano 15, Agosto/Setembro 2006

Autoria:

Paulo Nogueira
Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto
Paulo Nogueira
Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto

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