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"Morangos e a Construção da Identidade do (futuro) Adolescente"

Há poucos dias, em reunião de estágio com uns alunos que estão a desenvolver a sua prática num ATL (dirigido a crianças e pré-adolescentes), fui surpreendida com a seguinte notícia ?O ATL, desde a semana passada, proíbe os seus alunos de brincar aos ?Morangos com Açúcar?. Perplexa, indago o motivo e responde-me que após dois meninos terem sido surpreendidos na casa de banho, com as calças pelos joelhos e perante a questão usual de um educador (quando se depara com situações deste tipo) ?O que estão a fazer??, os meninos tenham respondido ?Estamos a brincar aos Morangos?. Assim, a partir daquele momento, estabeleceu-se a regra proibitiva.
Perante esta situação e tantas outras que nos fazem perceber a dimensão e o impacto deste programa, resolvi analisar atentamente alguns episódios do ?Morangos? e retirei as seguintes impressões:
Alguns dos protagonistas são adolescentes (com idades compreendidas entre os 12 e talvez os 18 anos), todos diferentes, todos muito bonitos (carecendo isto duma apreciação objectiva), com roupas, adornos, penteados diferentes (demonstrando uma certa heterogeneidade desejável, pois, os nossos adolescentes também são todos diferentes). Outros protagonistas (quanto a mim, secundários) são adultos, de várias idades, que ocupam diferentes papéis (pais, professores?).
As relações interpessoais: entre pares, entre professores e alunos, entre pais e filhos. Relações mais próximas versus relações mais distantes.
As famílias: muito unidas, outras separadas, com pais presentes ou com pais ausentes.
Profissão, Estudante: as avaliações (?os bons alunos, os alunos mais ou menos, os alunos medíocres), as disciplinas, a sala de aula, a disposição das cadeiras na sala de aula (contexto menos frequente na novela), o bar, o recreio?
Contextos extra escola (lazeres): saídas à noite, discotecas, bares, músicas, Hip Hop?
Histórias de vivências, experiências e sentires (tão comuns em todas as fases do ciclo vital, mas exacerbadas na adolescência): amores e desamores, encontros e desencontros, a segurança do relacionamento versus a insegurança, dúvidas e certezas?
Perante esta análise, é de salientar o próprio conteúdo das mensagens veiculadas, este é apelativo pois envolve as pessoas. É um programa pensado para adolescentes e, desta forma, é emitido num espaço e horário televisivo adequados (à semana, ao final da tarde, quando os alunos terminaram as aulas, quando, talvez, tenham finalizado os TPC?s; e ao fim-de-semana, também ao fim da tarde, dose dupla de ?Morangos?).
Em relação à linguagem, ela é compreensível, remetendo para narrativas, palavras, frases comuns nas conversas entre pares, sendo uma linguagem personalizada e directa (pode não o ser para alguns, mas para muitos sim). A este respeito não posso deixar de salientar que o seu impacto parece ser tão forte pois, algumas das frases emitidas pelos seus protagonistas, são, posteriormente, reproduzidas em contextos vivenciais e relacionais dos próprios adolescentes. 
Todo este impacto me leva a sugerir duas acções: uma delas é a necessidade de, enquanto agentes educativos (pais, professores e outros), proporcionarmos às crianças e aos adolescentes condições para discutir os assuntos e temas narrados nos episódios, de forma a promovermos um espírito crítico em relação aos mesmos e assumirmos o compromisso formativo e informativo (desconstruindo e desmontando mensagens, estereótipos). Diria mais, sentarmo-nos com eles a ver os Morangos e ir devolvendo e questionando os seus conteúdos e representações (em contraposição de uma postura proibitiva e de rejeição).
Outra das sugestões é o estabelecimento de parcerias com instituições relacionadas com a Saúde, nomeadamente, o Ministério da Educação, A comissão de Luta contra a Sida, a Abraço, a Associação para o Planeamento da Família, Instituto das Drogas e Toxicodependências, entre outros, com o objectivo de fazer deste programa televisivo, mais que uma novela, um meio de Promoção da Saúde que englobe a real unicidade, a percepção de controlo real, a percepção de vulnerabilidade, promovendo mensagens que envolvam o sentido de responsabilização individual (a este respeito ver Igatúa, 1997; Petty & Cacioppo, 1986).


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 155
Ano 15, Abril 2006

Autoria:

Carla Serrão
Mestre em Psicologia da Saúde, Docente na Escola Superior de Educação do Porto
Carla Serrão
Mestre em Psicologia da Saúde, Docente na Escola Superior de Educação do Porto

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