Uma breve e despretensiosa observação sobre a vida daquele que é considerado o pior cineasta do mundo, Ed Wood. Vida retratada pelo diretor Tim Burton (Filme Ed Wood, 1994, Touchstone Pictures).
Por que Ed Wood não ?enxergava? o quanto era péssimo cineasta. (Será que ele era um péssimo cineasta?). Talvez seu cinema seja ?ao sol?. Assim como existe o teatro ao sol, feito na rua ou mesmo no palco, mas que mostra tudo o que tem por detrás da coxia. Podemos entender Ed Wood assim: o cineasta do cinema ao sol! Coisa um tanto bizarra para uma época holliwoodiana, na qual o cinema naturalista e realista impera(va). Alguém como Ed Wood não podia ter espaço naquela época, 1950. Será então que Ed Wood nasceu póstumo, assim como Nietzsche, Van Gogh e tantos outros gênios? Esta é uma visão, uma explicação para minha tanta estranheza. Mas sou mais propenso a pensar como a maioria ? talvez, porque não nasci póstumo, sou fruto maduro de época bem definida. Penso que Ed Wood seja o pior cineasta do mundo. E aí retomo a pergunta: como ele podia não enxergar isto? Acho que quando nosso ego é de tal forma predominante, perdemos a autocrítica.(1) Ninguém pode ser referencial para si mesmo. Somente tendo-nos como modelo, tudo o que fizermos será melhor que bom. Seremos deus de nosso próprio mundo, e quem mais perfeito que Deus? Quem pode ser modelo para Deus senão o próprio Deus? Eis aí, creio, um dos grandes motivos de sermos lançados no mundo e termos tanta dificuldade de conviver com o outro, de incorporar a diferença, já que isto exigiria amar o próprio inimigo. Quantas e quantas vezes não fiquei deslumbrado com o que fiz, com o que escrevi ou com o que falei. Deslumbrado pelo meu ego, não via nada melhor que eu, porque me tinha como a referência suprema. No dia seguinte, ou semanas depois, olhava o que produzi (agora de ego menos inflado) e via o produto de mim numa dimensão bem menor do que tempos atrás. É provável, que via, agora, na sua dimensão mais ?verdadeira?. Parece que temos milhares de níveis de consciência (modos de ser e estar no mundo). O que vejo e faço hoje é diferente de amanhã, porque o outro (o mundo) desorganiza, permanentemente, minha harmonia, a minha suposta unidade. Por outra, Ed Wood era um profundo empreendedor! Sua insistência em fazer filmes ? mesmo sem orçamento ? ?caçando? dinheiro e produção, é intrigante. O que o fazia ser assim? Talvez fosse seu grande auto-amor! Pergunto: Será besteira dizer que o ego é um ótimo trabalhador? Acredito que não! O ego é um grande empresário, um grande operário. Mas por que? Penso que seja porque o ego é o que TEM. E só tem, ou terá se fizer, se construir, trabalhar. Vivemos uma época assim, o produto, a construção, é de imensa importância ? é assim que o mundo está cheio de ?grandes? edificações e ?grandes? realizações, mesmo que prejudiciais à maioria. Essa talvez seja a função principal do ego, construir o mundo, fazer o mundo a sua imagem e semelhança. O mundo será saudável, talvez, quando o seu ?construtor? gozar de boa saúde, física e, principalmente, mental.
1) Podemos entender (de forma breve e simples) o que seja o ego, pela perspectiva de Freud, ou seja, o ego é o produto das experiências contínuas que constituem uma pessoa (um indivíduo) diferençando-a das outras e em si integrada, intermediando a realidade interior com a exterior. Cfr. Roudinesco, Elisabeth. Dicionário de Psicanálise, Rio de Janeiro: Zahar, 1998.
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