?...Hoje, em Portugal, não se percebe o que é a educação ou, por outras palavras, para que se educa ou, mais precisamente, o que deve produzir a escola (e a universidade). A excelência académica e científica? Uma inteligência média exercitada, flexível e aberta ao mundo? Técnicos para a "modernização"? Um mínimo (ou um máximo) de conhecimentos para o maior número possível de portugueses? O pacote inteiro? Ou mesmo assim não chega? O quê, então?. (...) Não se educa no vácuo ou a benefício de estatísticas. O que se educa é, afinal, um homem ou uma mulher, para o que gostaríamos que eles fossem.?
Valente, Vasco Pulido ; Que Educação? In Público, 8 de Maio de 2005
Dentro de um mês aproximadamente, iniciar-se-ão os Exames de 12º ano. O mesmo é dizer que se iniciará o processo de construção de resultados que, cruzados com os dados finais da avaliação interna das diversas disciplinas, darão a posição relativa de cada estabelecimento de ensino face ao outro. A azáfama será grande tanto mais que se jogam as condições de acesso ao ensino superior. As escolas, por sua vez, esforçar-se-ão em obter os melhores resultados de forma a garantir a sua posição no ?ranking?. É sabido de algumas perversões legais (sem ignorar as ilegais) para o concretizar tais como: reprovação dos alunos ?mais fracos?, o incentivo à anulação de matrícula obrigando a exame como autoproposto, ?inflação? das classificações somativas finais. E o que poderá significar isso? Não resisti a ler o livro ?No silêncio somos todos iguais?, de David Justino (ex-ministro da Educação), onde entre outros assuntos expõe as razões da insistência em divulgar publicamente os resultados dos exames. Assim, assume que: ?A publicação regular das classificações de exame, escola a escola, disciplina a disciplina, para além de consignar um direito dos cidadãos, confere maior transparência ao processo de escolha das escolas e atenua a real desigualdade social no acesso à informação. Condicionar esse acesso apenas potencia a diferença de capacidade de cada indivíduo, cada família ou cada grupo, em aceder e utilizar de forma eficaz essa informação.?(1) Reconhece contudo que o risco da análise pública dos resultados pode levar a conclusões precipitadas mas inevitáveis como: os melhores resultados serão de escolas particulares, o risco de discriminação positiva (mérito) para as melhores, incentivando a escola ?exclusiva? (leia-se elitista) e, de discriminação negativa (segregação) para as piores, comprometendo os ideais da escola ?inclusiva? . Admitamos, a hipótese (adiantada por Marçal Grilo, também ele ex-ministro da Educação) de trocar os alunos da Escola de Pampilhosa da Serra - última na ordenação de 2004 com os do Colégio de S. João de Brito, de Lisboa ? uma das primeiras na referida ordenação? Será que os resultados se manteriam? Não sendo visionário, facilmente concluiria que estes seriam muito diferentes dos actuais, apesar dos níveis socioeconómicos e culturais dos alunos e das suas expectativas. David Justino apesar de exaustivo em justificar as suas análises, ao confrontar a sua posição com opiniões e publicações de sentido oposto reconhece que a discussão não pode ser apenas técnica, interrogando-se: ?Como é possível empreender um debate sem condicionantes ideológicas a partir destas conclusões??(2) De facto, não foi justamente por isso que, durante o Estado Novo, após um estudo fundamentado, o Governo de então reconheceu por bem reduzir a despesa da educação, fechando escolas (quando, nessa altura, o país tinha um taxa de analfabetismo elevada)? Obviamente, não proponho medidas cegas e sem controlo das despesas de educação, da ratio entre professor/aluno, ou do custo médio do aluno/a mas, antes defendo que se garanta um desenvolvimento sustentado da Educação. Contudo, não posso ignorar que a Educação é um investimento (veja-se a aposta dos grandes grupos económicos na criação de institutos educativos). E sobretudo devo ter presente que o processo é complexo e que os seus efeitos não são imediatos. Devemos analisar a valorização excessiva dada aos exames, retomar a Avaliação Integrada das Escolas(3), reconsiderar a admissão de modelos diversificados de escolas, novas formas organizacionais, e de novas relações com a tutela a que não são alheias as Cartas educativas e os Contratos de autonomia. Teremos de reconhecer todavia a necessidade de entender o sentido estratégico e prioritário da Educação do País (reformulação da Lei de Bases)(4).
1) JUSTINO, David, No silêncio todos somos iguais, Gradiva, Lisboa, 2005, pág. 10 2) Conclusões dos seus opositores - op. cit., pág. 24 3) Sendo uma avaliação essencialmente formativa, foi muito contestada por David Justino, por incidir sobre um nº reduzido de escolas, envolver muitos recursos, ser dispendiosa e ineficaz. 4) Não confundir com a revisão da Lei de Bases ( aprovada pela maioria simples da Assembleia da República anterior) dado que aquela deve corresponder às necessidades do País e não do Governo em exercício.
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