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Mistério

Para o efeito deste texto, restringimo-nos ao ?mistério? das tribulações havidas com as complexidades do funcionamento da ferramenta informática para o caso[das colocações] empregue pelo Ministério da Educação.

Adelino Gomes (AG), ao falar nos Prós e Contras de 20 de Setembro passado - e fê-lo no seu comentário de fecho a um debate sobre a Educação, colocado em agenda na sequência do processo da colocação de professores, relativo ao ano lectivo 2004/2005 -, referiu-se a dois mistérios que o deixaram perplexo. Para o efeito deste texto, restringimo-nos ao ?mistério? das tribulações havidas com as complexidades do funcionamento da ferramenta informática para o caso empregue pelo Ministério da Educação. 
Afirmou ele que, numa época de sucessos científicos e tecnológicos - e deu exemplos da área da exploração espacial -, o estranho seria verificar que ainda parece estarmos na pré-história da informática. Impressionado - até pela eficácia comunicativa - com a descrição efectuada pela Ministra da Educação sobre os trabalhos inerentes a uma ferramenta que deve computar, ordenar, cinco dezenas de milhar de itens - a cada um o seu candidato - de acordo com um complexo algoritmo. Foi a conclusão a que ele chegou. Deixou assim transparecer - pareceu-me -, sem o explicitar como acusação, a suposição de que teria havido - de entre outros factores - incompetência ?técnica? ao nível de utilização do programa. É de agradecer a AG a formulação da sua perplexidade, uma vez que ela parece representar um sentimento espalhado na população, cumprindo assim o seu papel de jornalista. 
A questão ficou no ar, estava-se no fim da sessão e ninguém poderia já comentar as suas afirmações. Pelo que penso estar a bola nas mãos de quem a quiser apanhar, o que vou fazer antes de a devolver?
Na verdade, mesmo sem conhecer a ferramenta empregue, mas sabendo de tantas situações ?engenheirais? complicadas, parece que a complexidade e as dificuldades vividas no Ministério da Educação configuram tratar-se esta de uma situação ?trivial? perante um problema complexo - o trivial, portanto, é estas coisas não correrem bem sem mais nem menos! E diga-se - de passagem - que o facto de esta acção não ter um carácter espectacular como o possuem as façanhas científico-tecnológicas ligadas à aventura espacial da Humanidade e, portanto, o facto de tal acção - desde uma perspectiva mediática - parecer à primeira vista tratar-se de matéria rasteira, simples, não deve inibir o entendimento que as façanhas requeridas terão ser de elevado calibre.
Com efeito, hoje em dia, e já desde há décadas - para não dizer desde quase sempre -, muitas coisas tecnicamente difíceis de realizar aparecem feitas, sem mais, aos olhos de toda a gente - à gente que, não as tendo feito, crê que tudo aquilo é natural. É uma marca do orgulho de quem as fabrica (!), das qualidades do seu actuar, que os clientes - pessoas e organizações - não se tenham de aperceber das complexidades científico-tecnológicas e das complicações e subtilezas das implementações dos seus produtos. Um não se aperceber que toca também - é claro - os altos responsáveis das instituições - e as respectivas estruturas - ao decidirem. E em particular num país onde as coisas já de usual aparecem feitas, isto é, vindas de ?fora?. Um país em cujo ?inconsciente? prevalece uma mentalidade de caçadores re-colectores.    
Daí a frequência com que ?profissionais? julgam estar uma coisa feita quando apenas foi esboçada. Daí a dificuldade em avaliar quanto tempo leva uma coisa a ser acabada, a poder ser utilizada. Daí o crer-se estarem os produtos adquiridos, por princípio, prontos a ser vestidos. Se há problemas, estará o utilizador errado. Daí, antes dos problemas acontecerem, o nem passar pela cabeça ter de verificar e avaliar as ferramentas antes de as introduzir ao serviço. Etc.   
A desadaptação será ainda mais relevante ao tratar-se com ?complexidade? - como poderá passar-se com o nosso caso. Como chegar, neste caso, à colina do procurado ?atractor?, poderá ser um objectivo não atingível a 100%, e menos ainda com ligeireza. Daí, talvez, o ?mistério?.
(As reflexões acima, partidas de um concreto caso - notório -, não se entendem movidas por anseios quer de apuramento quer de branqueamento de responsabilidades específicas, antes tão só o são enquanto pensar na C&T no seu caldo de cultura!)


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 139
Ano 13, Novembro 2004

Autoria:

Francisco Silva
Engenheiro, Portugal Telecom
Francisco Silva
Engenheiro, Portugal Telecom

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