Página  >  Edições  >  N.º 137  >  Discutir a Cidadania Multicultural à luz de Paulo Freire

Discutir a Cidadania Multicultural à luz de Paulo Freire

O Instituto Paulo Freire de Portugal surgiu há dois anos no Porto para dar a conhecer a vida e obra de um dos mais influentes pedagogos do século XX e debater algumas das grandes questões que preocupam os educadores e a sociedade em geral no início deste novo século. Para nos dar a conhecer mais acerca deste projecto e do congresso ?Caminhando para uma Cidadania Multicultural?, que terá lugar na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação do Porto de 19 a 22 de Setembro, nada melhor do que ler a curta entrevista que se segue com Luiza Cortesão, presidente e principal impulsionadora desta instituição.

Em que contexto surge o Instituto Paulo Freire de Portugal?

O Instituto Paulo Freire de Portugal foi criado há cerca de dois anos e surge no contexto de um congresso de eco-pedagogia realizado com o apoio do instituto Paulo Freire de São Paulo (IPFSP), que se realizou na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação do Porto em 2001. A ideia de fundar em Portugal um instituto congénere teve o apoio de alguns dos elementos fundadores do IPFSP ? entre eles Moacir Gadotti, José Eustáquio Romão e Carlos Alberto Torres ? que mostraram vontade em que o primeiro Instituto Paulo Freire do nosso país ficasse instalado na cidade.
Devo referir que a existência de institutos ou núcleos de estudo ou centros de investigação ligados à obra de Paulo Freire, seja na Europa, na Ásia, em África ou na América do sul e do norte, não implica que eles estejam necessariamente circunscritos ao estudo do trabalho de Paulo Freire, já que o interesse e a pertinência actual da obra deste pedagogo deve ser explicado à luz da importância dos campos que ele abordou e da forma como o fez.

O objectivo inicial era constituir um centro de estudos ou ser algo mais abrangente?

O Instituto Paulo Freire de Portugal é um centro de estudos mas tem igualmente a ambição de assumir-se como um centro de investigação e de intervenção. Através dele procura-se debater diferentes temas, sob as mais diversas abordagens, e organizar projectos que estejam directamente relacionados com as problemáticas abordadas pelo Paulo Freire, nomeadamente as questões dos direitos humanos e das condições de vida dos grupos minoritários face aos grupos dominantes.
As propostas de intervenção com grupos minoritários têm sido, aliás, um objecto permanente dos nossos projectos - nomeadamente através da formação de pessoas que trabalham directamente com migrantes - estando igualmente em ligação com o centro de investigação da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação, onde se têm desenvolvido, entre outros, projectos em torno da cidadania.

Este congresso surge com que objectivos?

A cada dois anos, o Fórum Paulo Freire ? uma espécie de identidade virtual coordenada pelo Instituto Paulo Freire de São Paulo ? organiza um encontro internacional num dos seus institutos afiliados. O último teve lugar em Los Angeles e ficou decidido que o seguinte decorreria no Porto.
A principal meta deste congresso é a de tentar provocar um debate vivo e profundo sobre um conjunto de problemáticas bastante actuais, cruzando temas populares e eruditos, num encontro que se pretende muito aberto e onde se privilegie a discussão entre os próprios convidados e entre estes e o público (ao contrário do habitual modelo de exposição unidireccional), tecido num ambiente de confraternização, festa, alegria e cultura.

?Caminhando para uma Cidadania multicultural?: porquê este mote?

Porque esse é um dos grandes problemas da sociedade actual. Repare-se que ao mesmo tempo que a multiculturalidade se acentua de forma crescente um pouco por todo o mundo ela entra em conflito com afirmações identitárias de grupos minoritários - veja-se os exemplos do País Basco, da Irlanda do Norte ou do Iraque, que, apesar de terem diferentes origens e propósitos, são afirmações de cultura nacional que coexistem muitas vezes em tensão num contexto multicultural, num processo que se revela muito complexo. ?Caminhando para uma Cidadania Multicultural? é, assim, uma tentativa de abordar através de Paulo Freire, mas não só, um problema que se revela de uma extrema actualidade.

 E que continua a ser negligenciado?

Sim. A multiculturalidade é ainda um fenómeno perturbante para muitas pessoas e a forma de o encarar resume-se habitualmente a um de dois caminhos: através de uma postura etnocêntrica que julga os outros como errados se não partilharem dos nossos valores e dos nossos padrões e que pode chegar até ao racismo, ou através de um fenómeno que se tem vindo a acentuar na Europa e que nas ciências da educação se designa por multiculturalismo benigno ou condescendente, isto é, abordar a diferença através dos seus aspectos folclóricos sem atender às verdadeiras questões de fundo, as culturais, que são muito sérias e por vezes muito difíceis de resolver.

Entrevista conduzida por Ricardo Jorge Costa


  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Edição:

N.º 137
Ano 13, Agosto/Setembro 2004

Autoria:

luiza Cortesão
Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Univ. do Porto, Presidente da Direcção do Instituto Paulo Freire de Portugal
Ricardo Jorge Costa
Jornalista do Jornal A Página da Educação
luiza Cortesão
Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Univ. do Porto, Presidente da Direcção do Instituto Paulo Freire de Portugal
Ricardo Jorge Costa
Jornalista do Jornal A Página da Educação

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo