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Situação no Haiti propicia abolição da escravidão infantil

"É preciso aproveitar a mudança de regime no Haiti para acabar com a escravidão infantil". Este é o apelo que Jean-Robert Cadet - ex-menino escravo, ou "restavec", como são chamados naquele país, actualmente professor universitário ? faz às forças internacionais presentes naquela ilha das Caraíbas. "O Haiti depende da ajuda internacional e os países ocidentais podem fazer depender a sua ajuda da eliminação da escravidão", explica Cadet, revelando que o fenómeno dos "restavecs" atinge cerca de 300 mil pessoas no Haiti, país de oito milhões de habitantes.
"Os restavecs são os meninos que ficam à mercê de um dono. São vendidos ou dados pelas famílias, não são pagos, não vão à escola, não podem brincar e sofrem maus-tratos e abusos sexuais. São escravos", denuncia Cadet, de 48 ou 49 anos ? ele próprio não sabe ao certo - hoje professor de Literatura em Cincinnati, nos Estados Unidos. "As meninas são mais numerosas. São chamadas 'làpourça' (a para isso): leia-se ?a para o sexo".
Desde há cinco anos que Cadet tem vindo a conduzir uma campanha a favor destas crianças escravas, dirigindo-se especialmente aos Estados Unidos e à França, países que, juntamente com o Canadá e o Chile, mobilizaram tropas de interposição no Haiti depois da saída do presidente Jean Bertrand Aristide, em 29 de Fevereiro passado. A sua associação, Restavec Children Foundation, acaba de reunir cem mil assinaturas para uma petição que será entregue no Senado americano.
"Os haitianos orgulham-se de terem sido os primeiros a romper as correntes da escravidão. Assim, quando se fala nos restavecs, ficam furiosos", conta. "No ano passado a legislação do país foi modificada, substituindo a palavra restavecs por ?adoptados informais?. Mas a situação não se modificou de todo", afirma.
Salvo da escravidão, Cadet contou a sua história no livro "Restavec", publicado em inglês pela editora University of Texas Press. "O meu pai era um branco que exportava café. Eu sou filho natural da cozinheira dele. Quando ela morreu, eu tinha quatro anos e o meu pai entregou-me a uma ex-amante que me escravizou. Eu dormia debaixo da mesa da cozinha, acordava às cinco da manhã para ir buscar água, lavar os pratos e fazer outras tarefas. Era emprestado aos amigos da família e sofri abusos sexuais", lembra.
Aos 16 anos, a partida da família para os Estados Unidos e uma boa dose de sorte permitiram que ele mudasse de vida, frequentasse a escola e ingressasse na universidade. Hoje, divide o seu tempo entre o trabalho de professor e a militância para devolver uma vida normal às mais de 27 milhões de crianças escravas que se calcula existirem no mundo.


  
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Edição:

N.º 136
Ano 13, Julho 2004

Autoria:

AFP
Agence France-Presse
AFP
Agence France-Presse

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