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Das políticas educativas ao projecto de escola...

IDENTIDADE VOCACIONAL

Procurei reflectir sobre a forma como os alunos?  gerem os factores que sabemos influenciar a sua decisão [vocacional]: o contexto familiar, a trajectória escolar, as redes de sociabilidade, as suas expectativas e representações.

Muitas vezes, o momento da passagem do 9º para o 10º ano de escolaridade parece condicionar as opções futuras, sendo poucos os jovens que, arrependidos com o caminho escolhido, têm a coragem de voltar atrás e corrigir o seu percurso. O resultado é, em certos casos, um acumular de decepções e frustrações que colocam o jovem numa ?teia? que inconscientemente teceu.
É evidente que esta decisão não é definitiva, que o processo não começa aqui e que este momento está longe de ser o único em que o jovem terá de fazer opções. Trata-se, no entanto, de uma primeira decisão de entre as muitas que terá de tomar ao longo da vida e que, enquanto tal, poderá condicionar as decisões posteriores.
Reconhecendo a construção de um projecto vocacional como produto de constrangimentos sociais vários, procurei então reflectir sobre a forma como os alunos, tidos como actores sociais e portanto dotados de alguma liberdade para fazer escolhas de entre um conjunto necessariamente limitado de opções, gerem os factores que sabemos influenciar a sua decisão: o contexto familiar, a trajectória escolar, as redes de sociabilidade, as suas expectativas e representações.
Em causa estava a compreensão do significado que a decisão vocacional à saída do 9º ano tem para os jovens e o sentido que a ela atribuem. Por isso, procurei dar voz aos alunos e às suas famílias, fazendo recair a minha análise sobre o processo de decisão e não sobre o seu produto final. Daqui resultou um conjunto de diferentes formas de conduzir o processo de decisão, encaradas como expressão de diferentes racionalidades, que se prendem, em última análise, com diferentes processos de construção identitária. A forma como cada um articula os diferentes factores e o peso que atribui a cada um deles parece ser o resultado da sua história de vida e do significado que cada um atribui às suas experiências.
Neste sentido, a ideia que defendo é a de que quanto mais diversificadas e significativas forem as experiências proporcionadas aos jovens: maior será o seu envolvimento no processo de decisão, envolvimento que se traduzirá em atitudes exploratórias e de investimento; maior será a reflexividade presente no processo de decisão, já que esta parece resultar da exposição a quadros de referência alternativos ao familiar; e maior será a possibilidade de  romper com a reprodução da estrutura social.
A partir do trabalho empírico, realizado em três escolas de meios distintos, foi possível constatar a influência da origem social no processo de tomada de decisão: por um lado, pelo proporcionar de experiências diversificadas favoráveis à exploração e ao investimento num projecto vocacional; por outro, pela clivagem detectada na forma como é percepcionado o sucesso escolar obtido durante a escolaridade obrigatória. Uma clivagem sociológica que a escola parece não conseguir combater, já que é nos meios mais desfavorecidos que os recursos são mais escassos, nomeadamente no que diz respeito a mecanismos de orientação escolar e profissional.
Desta análise resulta a centralidade das políticas de escola, que traduzem a forma como estas, enquanto instituições, gerem e apropriam as políticas macroeducativas, mas também a pertinência de uma educação intercultural, capaz de desenvolver a tomada de consciência para a diversidade. Neste sentido, a capacidade de cada escola promover processos de transformação social parece passar por assumir a construção da identidade vocacional como um projecto de escola, mobilizando a sua autonomia no sentido da promoção de quadros de referência alternativos, afim de contrabalançar o efeito reprodutor das políticas educativas.


  
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Edição:

N.º 135
Ano 13, Junho 2004

Autoria:

Susana Faria
Escola Superior de Educação de Leiria
Susana Faria
Escola Superior de Educação de Leiria

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