Página  >  Edições  >  N.º 127  >  Presos em Guantánamo: entre isolamento e vazio legal

Presos em Guantánamo: entre isolamento e vazio legal

O governo norte-americano mantém há quase dois anos, em isolamento total, centenas de detidos na base militar de Guantánamo, em Cuba, numa situação de vazio legal que preocupa cada vez mais os juristas daquele país. "Uma justiça pária!", afirma Michael Ratner, advogado do Centro de Direitos Constitucionais, referindo-se à expressão "Estados párias" utilizada pelo departamento de Estado americano para qualificar os países acusados de apoiar o terrorismo. Um dos seus clientes, um inglês capturado no Afeganistão, afirma que só viu a luz do sol por sete minutos durante os últimos sete meses, conta o advogado. "Moazzam Begis? foi autorizado a ler apenas uma carta da família durante todo este período", acrescenta Ratner, que também defende David Hicks, um prisioneiro australiano.
O futuro de 660 detidos de 42 nacionalidades é incerto, pois o governo de George W. Bush não lhes concedeu o estatuto de prisioneiros de guerra, conforme expresso pela Convenção de Genebra. O secretário de Estado da Defesa, Donald Rumsfeld, deixou já por várias vezes subentender que estas detenções continuarão enquanto durar "a guerra contra o terrorismo".
"A administração Bush está a fabricar um procedimento para justificar estas detenções prolongadas, sem um julgamento à vista", explica por sua vez o professor de direito internacional da American University, Emílio Vianno. Este argumento é rejeitado pelos militares, que prometem julgamentos militares, sem júri, estabelecidos para a ocasião pelo Pentágono e pelo departamento de Justiça. Porém, mais de 20 meses depois da instalação deste campo de prisioneiros e do anúncio da criação de tribunais militares, os detidos ainda não beneficiaram da visita de advogados e nenhum processo de instrução foi iniciado ou sequer agendado.
"Não é por acaso que os Estados Unidos escolheram a base de Guantánamo, porque dessa forma não precisam de aplicar a estes prisioneiros os princípios de direito consagrados na constituição americana", refere o professor Vianno.
Segundo jornalistas, únicos autorizados a chegar até ao local, prosseguem os trabalhos para a construção de uma sala de tribunal num velho edifício da base, chamado "palácio rosa". Os responsáveis pelo campo estarão também encarregados de examinar a viabilidade da construção de uma verdadeira prisão, com "corredor da morte" e sala de execuções.
"Os detidos são submetidos regularmente a interrogatórios que incluem um sistema de recompensas, como a ridícula promessa de um hamburger", explica Michael Ratner.
"O estado físico e psicológico destas pessoas é francamente deplorável", garante o advogado, que contou 32 tentativas de suicídio entre os prisioneiros. Estes permanecem trancados por 24 horas em celas de quatro metros quadrados, com grades que filtram o ar e a luz, sendo autorizados a esticar as pernas duas ou três vezes por semana, durante 15 minutos.


  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Edição:

N.º 127
Ano 12, Outubro 2003

Autoria:

AFP
Agence France-Presse
AFP
Agence France-Presse

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo