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Professor de Verão

Benedicto Garcia, 55 anos professor primário na Galiza

Começou por ser professor dos primos. A pedido das tias, Benedicto Garcia passava as manhãs das suas férias de Verão  - passadas na praia de Barraña, no Conselho de Boiro, Corunha - a dar explicações de matemática.

Tinha 12 anos e ao contrário do que poderia sentir um garoto da sua idade as aulas improvisadas das 10 às 12h eram dadas com ?vontade?. Até porque para além do gosto que lhe dava o ensino da sua matéria preferida Benedicto ainda recebia uma recompensa monetária das tias. ?Foram os meus primeiros dinheiros como quase professor?, recorda Benedicto. Na escola, a aptência pela matemática fazia-o tirar sempre nota máxima. ?Nesse sentido a nota nem era merecida porque o esforço a que a matéria me obrigava era pequenino?, explica sorridente.
Em Setembro de 1982 Benedicto deixa de ser quase e passa a ser professor. Uma daquelas coincidências da vida faz com que inicie a sua carreira de docente primário na Escola Santa Baia, situada no Conselho de Boiro, a região onde deu os primeiros passos como ?professor? dos primos. Para trás ficaram alguns anos dispersos pelos cursos incompletos de Engenharia de Telecominicações e Economia. E o curso de Professor de Ensino Primário acabado em 1974 na Escola do Magistério [responsável pela formação inicial de professores primários], na Galiza.

A indisfarsável paixão pela matemática?

Enquanto professor a sua especialidade é o ensino da matemática, a área da sua preferência mas uma das que mais resistência cria entre os alunos. ?Há uma rejeição inicial de base à matemática?, reconhece o professor. ?Mas  isso acontece sobretudo porque não se preparam bem os professores de matemática. Uma percentagem elevada dos professores que lecciona esta disciplina podia leccionar outra coisa qualquer.? Logo, tal como os alunos não têm muito interesse pela matéria. Um interesse que Benedicto não consegue disfarsar.
?Quando se ensina a matemática não se pode ficar só na abstração é preciso mostrar a aplicação, dizer o que foi possível construir e inventar com aqueles conhecimentos matemáticos.? Essa é a metodologia que Benedicto utiliza na sala de aula. ?No outro dia informei os alunos do 4º ano da primária que o zero tinha sido inventado há alguns séculos. E que não fazia parte nem da numeração romana, nem da árabe. E quando os miúdos se aperceberam do quanto tinha sido inventado sem que o zero fosse utilizado ? as pirâmides egipcias, os aquedutos romanos ?  ficaram extasiados??
Episódios como este, passados entre quatro paredes, fazem Benedicto acreditar que a sua função enquanto professor de matemática  é ?a de eliminar o medo e a sombra que ela gera entre os alunos.?  Coisa que faz, tal como fazia com os primos, com ?vontade?.

?E a desilusão dos computadores empacotados

A informática é outra das suas paixões. Na escola primária Lópes Ferreiro onde lecciona actualmente, Benedicto é ainda responsável pelo acompanhamento extra-curricular dos alunos na área da informática. E é precisamente por saber o quão importante é o computador  - tanto para os alunos do pré-escolar como para os do primário  - que Benedito se diz chocado com a má ou a pouca utilização que se faz deste instrumento de trabalho um pouco por todas as escolas. Curiosamente não está em causa a falta de equipamentos.
A situação é no mínimo caricata e de acordo com Benedicto afecta muitas das escolas dos diversos ciclos da Galiza. ?Temos escolas que possuem 20 a 30 computadores que estão armazenados num canto, ainda empacotados, porque ninguém da administração [Conselheria de Educaión da Xunta da Galicia] os vem instalar e porque os professores não os sabem utilizar?, denuncia Benedicto. ?E se não há na escola um professor ?entendido? que os queira instalar de livre vontade não há como os pôr a funcionar?, explica.
Mas ainda que a escola consiga resolver o problema da instalação dos computadores há ainda que contar com um outro problema. ?Só uma pequena parte dos professores possui qualificação conferida através dos cursos de formação contínua da administração para ensinar os alunos a utilizar o computador de forma adequada?, garante o professor.
A raíz do problema ? aponta Benedicto Villares - pode ser encontrada numa certa desarticulação entre a frequência de cursos de formação contínua e as necessidades reais dessa formação no contexto da sala de aula. ?Quando peço à administração para fazer um curso, seja de desenho artístico ou de cestaria, ninguém pergunta se preciso de utilizar essa formação com os meus alunos na sala de aula e depois de a ter ninguém me exige que a aplique?, explica Benedicto. Esta não ingerência da ?conselheria? pode ser positiva ou negativa para os alunos. Em última análise, observa: ?Tudo depende da vontade do professor.?


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 123
Ano 12, Maio 2003

Autoria:

Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação
Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação

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