Página  >  Edições  >  N.º 120  >  Portugal versus Polónia

Portugal versus Polónia

Começam pela mesma letra, tudo o resto é diferente

Diz que em Portugal se sente ?fora da Europa?, sobretudo, quando vê as pessoas a cuspir para o chão, na rua. Arek Dziewónsk, 24 anos, deixou a Polónia rumo ao Porto para fazer um estágio de dois anos na área dos computadores. Sandriana Araújo, 24 anos, fez o caminho inverso. Viajou até à Polónia para durante três meses dar aulas de inglês numa escola secundária em Cracóvia e ficou surpreendida por as dicotecas polacas passarem música dos anos  60, 70 e 80 ?como se fosse a última moda?. A Página juntou-os e jogou com eles o ?descubra as diferenças?.

Ainda a cuspir para o chão

Quando pensa nas razões que o levaram a escolher Portugal como destino Arek Dziewónsk ironiza: ?Quis ir para fora da Europa!? Sandrina Araújo olha-o com desagrado. Afinal o seu país é europeu de direito e até pertence à União Europeia. O que não deixa margem para qualquer ironia.  Mas Arek não está a pôr em causa a geografia, nem tão pouco a geo-política. O que faz Arek sentir-se fora da Europa que lhe está mais próxima, a Central, é um hábito que ainda persiste na sociedade portuguesa: cuspir para o chão. ?É nojento!?, queixa-se enquanto torce o nariz. Sandrina suspira e contrapõe: ?Os jovens não fazem isso, só as pessoas mais velhas.? Arek não se deixa convencer pelo fraco argumento da idade. E por isso Sandrina avança com uma explicação ?cultural?. ?Esse hábito faz-me lembrar o Norte de África e os povos Árabes?? , reflecte enquanto olha o infinito. ?Talvez o hábito de cuspir para o chão seja uma influência dos mouros.? A indignação de Arek enfraquece depois da explicação. Sandrina sorri e entre dentes lá vai dizendo que reparou que na Polónia ninguém cospe para o chão.

Á espera de um autocarro 

A primeira vez que Sandrina teve de apanhar um autocarro deparou-se com uma cena curiosa. A entrada e a saída de passageiros faz-se sem diferenciação por qualquer uma das portas. ?É uma confusão?, sorri. ?Dá  ideia que não há controle de quem tem ou não bilhete de transporte, mas os revisores andam ?à paisana? e podem entrar a qualquer momento?, adverte Sandrina.
Também Arek tem algo a dizer sobre os autocarros portuenses. ?Não compreendo por que as paragens não têm os horários dos autocarros?, reclama Arek. ?Porque os autocarros nunca chegam a horas!?, ironiza Sandrina. Arek, habituado à lógica precisa dos computadores estranha a resposta ?ilógica? de Sandrina. Mas ela ignora a estranheza do polaco e continua a sua teoria: ?Em Portugal não temos horário para nada! Se uma conferência está marcada para as 21h, já se sabe que só começa às 21h30?? O raciocício é interrompido. Sandrina vai à carteira e tira um dos horários dos STCP. ?Aqui está! Tens aqui um horário?, diz mostrando o papel a Arek. ?Entre as 9 e as 14h o autocarro passa de 10 em 10 minutos. A partir das 14h já passa de 30 em 30 minutos.? Arek arregala os olhos: ?Ok, já percebi. Mas isso quer dizer que tenho de esperar 30 minutos pelo autocarro. É muito tempo! Por isso é que ando quase sempre a pé!? Apesar de levar os reparos de Arek na ?desportiva?, Sandrina dá razão às queixas do colega. E confessa que na cidade onde esteve para além de existirem horários nas paragens, havia imensos autocarros, logo o tempo de espera era muito menor do que no Porto.

Contacto interpessoal

Menos visível mas mais susceptível de causar mal entendidos, são as diferenças ao nível do contacto interpessoal. ?Aqui as pessoas tocam-se muito. Enquanto conversam, por exemplo, põem as mãos no braço ou no ombro da outra pessoa?, repara. É algo a que já está habituado, mas no início Arek estranhou. Para melhor explicar a razão da sua observação Arek continua a dar exemplos. ?Reparei que quando duas pessoas são apresentadas cumprimentam-se com beijos na cara. Isto desde que não sejam dois homens?, sorri. ?Mas na Polónia estende-se sempre a mão, tanto para os homens como para as mulheres!?
Até agora calada, Sandrina confirma ter sentido na Polónia uma estranheza contrária à de Arek. ?Há uma ausência de contacto incrível!? Uma diferença comportamental  à qual, tal como Arek, se habituou. De tal modo que ?ao fim de algum tempo se alguém me tocava até me assustava?, confessa Sandrina. Susto apanhou Arek quando, ainda ?caloiro? em matérias de interelacionamento, entrou num restaurante e o empregado lhe pôs uma mão nas costas para com a outra lhe indicar a mesa. ?Na Polónia, isso nunca aconteceria?, confirma Arek. ?Se acontecesse ? diz em jeito de brincadeira (?) ­? o cliente tirava uma faca do bolso e apontava-a ao empregado.?
Sandrina também teve alguns embaraços nos seus tempos de ?caloira? na Polónia. Uma vez ao despedir-se de um rapaz polaco deu-lhe um beijo na cara. Um gesto simples mas que levou a que uma rapariga polaca pensasse que o rapaz era seu namorado. ?Isso nunca aconteceria em Portugal?, sorri Sandrina.


  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Edição:

N.º 120
Ano 12, Fevereiro 2003

Autoria:

Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação
Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo