Este ano, na Faculdade de Arquitectura da Universidade do
Porto, com os alunos do 5º ano da cadeira de Ecologia Urbana, resolvemos
fazer um trabalho escolar que visasse intencionalmente o interesse público
da universidade.
A Faculdade de Arquitectura está implantada naquele
território do Campo Alegre a que chamam o Pólo III da Universidade
do Porto. Ali se concentram, para além da FAUP, as Faculdades de Letras,
Ciências, Psicologia e Ciências de Educação, o Planetário,
o Jardim Botânico, o Clube dos professores e o CDUP.
Mas essa estrutura universitária é um gueto num território
esfarrapado por vias e viadutos que dilaceram o lugar afugentando, com o denso
trânsito automóvel, qualquer devaneio pedonal. Nos magros passeios
à volta dos edifícios universitários, acumulam-se viaturas
estacionadas e no arvoredo abandonado, crescem as ervas e acumulam-se lixos.
Não existe nenhum arranjo paisagístico.
Assim, os edifícios de arquitectos prestigiados implantam-se naquele
lugar abandonado, onde à noite ninguém se atreve a penetrar...
O exercício pedagógico consistia em projectar uma mudança
para aquele território. Programaram-se três etapas interligadas:
- Diagnóstico da situação e estudo de potencialidades
Fazer um levantamento da situação mostrando os problemas mais
graves do campus: trânsito, arranjos paisagísticos, gastos
energéticos e simultaneamente procurar descobrir potencialidades;
- Alternativas ecológicas - Eco-Design
Pôr em marcha o estudo de alternativas ecologicamente sustentadas
que promovessem uma área de abertura à comunidade com equipamentos
e envolventes paisagísticas que tornassem aquele local em interacção
com a cidade;
- Intervenção participada
Estabelecer um processo participado, através da discussão
em torno de uma maqueta de trabalho e intenções, para que
e extraíssem novas ideias, críticas e sugestões tendo
em vista um balanço das propostas.
Ousar imaginar um outro campus, torná-lo um processo
mobilizador de outras vontades e transformar as intenções num
trabalho de propostas para toda a universidade, foi este o objectivo estratégico
do trabalho escolar deste ano.
Processo Prático de Investigação
Depois das primeiras visitas ao terreno e duma primeira síntese
das várias “imagens-desejo” elaboradas através do
primeiro impulso de mudança em relação ao diagnóstico,
os alunos constituíram-se em grupos de investigação sobre
temas relacionados com a estratégia de desenvolvimento ecologicamente
sustentado.
Elaboração de dossiers
Essa investigação permitiu a elaboração
de vários dossiers sobre:
- Ecodesenvolvimento e energias renováveis;
- Ecodesign e bioconstrução;
- Silvicultura, agricultura biológica e biodiversidade;
- Ecotecnologia e transportes;
- Estudo de casos: eco-aldeias, eco-cidades e eco-urbanismo;
- Tratamento e reciclagem de águas residuais;
- Participação social nas propostas de urbanização.
Maqueta de Trabalho
Depois do estudo realizado, começaram-se a desenhar
propostas que vieram a ser representadas. Construiu-se uma maqueta de trabalho
com cerca de 3 metros por 2.
E assim foram surgindo, na maqueta feita de papel reciclado e pintada com tintas
ecológicas, as primeiras propostas para discussão.
Houve propostas divergentes para um mesmo lugar. Aceitaram-se várias
alternativas como processo mais rico no debate a organizar com os potenciais
utentes da área.
Pouco a pouco a maqueta foi mostrando um circuito pedonal feito de passarelas
que se sobrepuseram às vias rodoviárias reduzidas ao mínimo
de trânsito. Parques periféricos de estacionamento estabeleceram
os pontos limites dos carros no campus.
A organização paisagística foi dotada de intenso arvoredo
para despoluir a atmosfera urbana, criaram-se jardins, hortas, pomares e espelhos
de água.
Um jardim de aventuras para crianças foi projectado como sendo simultaneamente
uma eco-estação de tratamento de águas residuais. A recolha
de águas pluviais foi pensada graças a uma cisterna e um lago.
Num lugar central do campus planeou-se uma estrutura de múltiplos usos:
centro transdisciplinar, recepção e contacto com a comunidade,
cantina, serviços culturais, etc.
Este coração pretenderia articular e animar as várias instituições
que actualmente funcionam dum modo corporativo.
Pequenos habitats estudantis foram pensados para a escarpa que desce do Campo
Alegre até ao rio. E um plano de energias renováveis e melhoria
bioclimática dos edifícios iria diminuir o carácter energetívoro
do campus.
Os jardins, as hortas e os pomares, além do carácter didáctico
e lúdico, dariam apoio à cantina e ao mini-mercado biológico.
Reflexão com especialistas
Não se pense contudo que só de utopia se tratava.
Procedeu-se ao debate com os técnicos que vieram discutir as propostas:
arquitectos, um engenheiro e um economista vieram expor alguns exemplos de sustentabilidade
ecológica em edifícios e comunidades: debateram-se questões
de reciclagem, questões de silvicultura e paisagismo e ainda a problemática
da participação social nos projectos.
Participação
Para divulgar e mobilizar os alunos, plantaram-se 3 árvores
no terreiro da Faculdade e deu-se início a um debate no Dia Mundial do
Ambiente.
Exposta a maqueta de trabalho e reveladas as principais ideias do projecto,
começou uma nova etapa do processo que procura ainda um balanço
desta experiência pedagógica.
Conclusão
- Será que este esforço se perdeu e ficou-se
apenas por um exercício académico?
- Que impacto pode ter um exercício destes nos alunos que o realizaram
e na comunidade para a qual o exercício foi pensado?
- Será um catarse gratuita ou bandeira reivindicativa de uma população
universitária?
Tudo isso vai depender da consciência e capacidade de mudança do
meio universitário.
A breve prazo, se não surgirem alternativas, o campus poderá tornar-se
ainda mais dilacerado por uma cidade sedenta de especulação imobiliária
neo-liberal e por uma universidade cada vez mais afastada dos interesses públicos
e submetida aos modelos da globalização hegemónica ou seja
dos “business school”.
Para evitar este cenário é necessário que a universidade
se soerga do marasmo em que se encontra e que uma nova Reitoria protagonize
a dinâmica necessária para os desafios deste novo milénio:
capacidade de promover um paradigma de desenvolvimento durável ou seja,
que tem em conta as necessidades actuais sem comprometer as necessidades das
gerações futuras.
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