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Família e cidadania

O aumento da taxa de divórcio, do número de mulheres no mundo do trabalho e o baixo índice de nupcialidade e de natalidade produzem mudanças na estrutura familiar que precisam de ser pensadas. É que a família continua a ser a unidade primeira de educação.

É na família que sentimos os primeiros amores e os primeiros ódios, com ela fazemos as primeiras aprendizagens, e é nela que principia o desenvolvimento da nossa personalidade.
Dito de outro modo: é no seio da família, a mais antiga mas também a mais importante instituição social, que a maior parte de nós realiza o processo de socialização, isto é, a aprendizagem das dimensões mais significativas da interacção com os outros. São, sobretudo, as relações com os pais e com os irmãos que constituirão as nossas primeiras experiências relacionais e, como tal, servirão de base ou moldarão as nossas relações sociais posteriores.
Pode, então dizer-se, utilizando o sentido mais amplo do conceito, que a Educação começa, primeiramente, na família.
Ora, a família de hoje já não é a família de ontem. Como resultado de profundas transformações ocorridas na sociedade no decorrer das últimas décadas (aumento da taxa de divórcio e do número de mulheres no mundo do trabalho, baixo índice de nupcialidade e de natalidade, etc.), assistimos actualmente a uma enorme alteração das estruturas familiares, nomeadamente a um aumento de famílias monoparentais e a um decréscimo do número de filhos.
Sobre as família monoparentais (que decorrem do pós-divórcio mas também do aumento do número de mães celibatárias) sabe-se que elas se constituem, geralmente, em torno da mãe, isto é, são famílias que podemos designar como sendo de base matrifocal. Esta feminização das pessoas de referência, como é fácil supô-lo, terá prováveis consequências nefastas no desenvolvimento das crianças. Mas não nos deteremos hoje aqui nesta problemática. O que queremos destacar neste breve artigo são as consequências que advêm da redução das fratrias.
É na relação com os irmãos que experienciamos, pela primeira vez, alguns padrões transaccionais (afectos, comportamentos interpessoais...) constituintes da nossa personalidade. É nesse importante sub-sistema familiar que adquirimos, sobretudo, competências relacionais básicas, tais como: saber competir, partilhar, negociar; aprender a fazer e a lidar com amigos e com inimigos; saber aprender com os outros e como obter reconhecimento, ... Em suma: saber dar e receber.
A importância da fratria como contexto de aprendizagem de competências relacionais é posta em relevo no caso dos filhos únicos: a sua inexperiência com estes pares parece justificar que, em média, tenham menos capacidades para se relacionarem com os outros, comparativamente com os indivíduos que têm irmãos.
Assim sendo, neste presente cenário de fratrias mais reduzidas – esta tendência, parece-nos, inscreve-se numa outra: de mais individualismo da família nuclear e de restrição dos elos sociais –, implica um requestionamento sobre a importância deste sub-grupo familiar para o desenvolvimento individual: como a fratria é importante para o desenvolvimento de competências relacionais fundamentais, quanto menor ela for não será mais pobre este meio vivencial?
E, se calhar, um requestionamento sobre o papel complementar que a Escola deve ter face a esta nova realidade familiar: a Educação para a Cidadania, para sentir e respeitar o Outro, não será uma prioridade?


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 115
Ano 11, Setembro 2002

Autoria:

Otília Monteiro Fernandes
Univ. de Trás-os-Montes e Alto Douro, Chaves
Otília Monteiro Fernandes
Univ. de Trás-os-Montes e Alto Douro, Chaves

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