A Página tem vindo a divulgar os resultados de um inquérito
inédito promovido à escala mundial pela Organização
Não Governamental dinamarquesa Gallup International, realizado em 1999,
através do qual se pretendeu saber a opinião dos habitantes do
planeta sobre o modo como são governados e quais as expectativas que
encerram sobre as suas condições de vida. Neste número,
encerramos este dossier temático, esperando ter podido dar uma imagem
geral do mundo em que vivemos.
Uma das notas mais salientes deste estudo é o facto de a nível
global apenas um terço da população acreditar que o respectivo
país é governado de acordo com a vontade do povo. Neste aspecto,
e comparando as respostas obtidas a nível nacional, são os cidadãos
da Malásia - acima de três terços (77%) - os que mais se
consideram governados de acordo com a sua vontade. Outros países onde
a maioria concorda com esta afirmação são a Nigéria,
a Tailândia, Taiwan, Filipinas e Noruega, o único país da
europa ocidental que o afirma. A desilusão com a democracia nos países
do leste da europa ficou bem patente neste estudo. Mais de uma década
depois do colapso da União Soviética, são poucos os povos
desta parte do mundo que acreditam serem governados de acordo com a sua vontade,
com a Rússia no fundo da lista, seguida de países como a Arménia,
o Cazaquistão, a Lituânia ou a Ucrânia.
Outras das questões colocadas neste inquérito dizia respeito à
liberdade e justiça do processo democrático, mais particularmente
no que se refere ao acto eleitoral. Globalmente, 48,6% dos habitantes do planeta
diz-se satisfeito com as condições em que são realizadas
as eleições no seu país. Se excluirmos a percentagem de
inquiridos que responde "não sabe" (8,4%), há um maior
número de pessoas a considerar que o processo eleitoral é habitualmente
feito em condições de equidade e justiça.
Analisando as respostas por região, verificamos que é na Europa
Ocidental, com 73,3% de respostas afirmativas, onde o escrutínio é
visto pelo maior número de cidadãos como sendo livre e justo.
Segue-se a América do Norte, com 61,8%, a África Ocidental (49,7%),
o Sudoeste Asiático (40,4%) e a América Latina, onde apenas 39,8%
afirma ter eleições livres e justas. Mais uma vez, são
os povos da Europa de Leste os mais cépticos em relação
a esta questão, já que apenas 25,8% dos inquiridos acredita na
imparcialidade das suas eleições.
A nível nacional, são os holandeses quem mais acredita na transparência
do seu processo eleitoral. Aliás, todos os países onde esta marca
ultrapassa os 80% situam-se na Europa Ocidental (Dinamarca, Suécia, Noruega
e Luxemburgo). O menor número de respostas afirmativas pode uma vez mais
ser encontrado nos países do leste europeu (Arménia, Rússia,
Ucrânia), e nos Camarões, país da África Ocidental.
A actuação dos governos
Outra das questões levantadas por este inquérito
mundial pretendia apurar de que forma caracterizavam as pessoas a actuação
dos seus governos. Para isso, foi elaborada uma lista com cinco hipóteses:
eficiente; burocrático; corrupto; justo; sensível à vontade
do povo. Os resultados mostraram que os termos corrupto e burocrático
são os mais usados para caracterizar a actuação dos governos,
ao passo que designações positivas como eficiente, justo e sensível
à vontade do povo são apenas apontadas por aproximadamente um
em cada dez cidadãos.
A avaliar pelas respostas dos inquiridos, os governos mais corruptos situam-se
na Europa de Leste, onde mais de metade dos cidadãos assim o considera.
Na Ásia, África e América Latina, a designação
corrupto é igualmente encarada por mais de 40% dos cidadãos como
o termo apropriado para caracterizar os seus governos. Esta perspectiva é
consideravelmente menos utilizada na Europa Ocidental (22%) e na América
do Norte (29,3%).
Burocrático é uma característica geralmente associada aos
governos na maioria das regiões, sendo mencionada por cerca de um terço
dos respondentes a nível mundial. Justa é como um terço
dos africanos e um em cinco dos norte-americanos descrevem a actuação
do seu governo, enquanto que na Europa de Leste, no Sudoeste Asiático
e na América Latina menos de 10% assim o considera. A Suiça é
o único país onde mais de metade da população acha
que o seu governo é justo. O termo eficiente não é uma
característica muito referenciada em qualquer das regiões.
Quanto à última hipótese, sensível à vontade
do povo, ela é particularmente citada em África, onde cerca de
um terço da população considera que os seus governos correspondem
às expectativas do povo, muito acima da Europa de Leste e do Sudoeste
Asiático onde este termo é eleito apenas por um em cada oito cidadãos.
Em resumo, os governos do mundo são caracterizados na sua maioria como
burocráticos, corruptos em muitas regiões e em geral são
pouco eficientes ou justos.
Ecologia e Direitos Humanos
De acordo com os resultados obtidos pelo estudo da Gallup International,
a população mundial é praticamente unânime nas suas
críticas aos governos no que concerne à protecção
do ambiente. Dois terços dos cerca de 1,25 mil milhões de inquiridos
representados no maior painel mundial até hoje realizado, diz que os
governos fazem muito pouco para resolver os problemas ambientais no seus países.
Apenas em cinco deles (Dinamarca, Noruega, Suécia, Finlândia e
Islândia) a maioria concorda numa apreciação positiva quanto
à actuação dos respectivos governos.
Uma das principais conclusões deste painel refere a crescente preocupação
pelo meio ambiente no seio dos eleitores, já que em apenas três
países (Arménia, Camarões e Hong Kong) uma pequena maioria
de 56% da população considerou que o crescimento económico
é mais importante do que a protecção do meio ambiente.
Porém, nos países onde a população se sente insatisfeita
tanto com o governo como com a situação do ambiente, exemplo das
economias sob influência da ex-União Soviética, as pessoas
tendem a preferir o crescimento económico.
Questionados acerca da satisfação em relação ao
estado geral do ambiente nos respectivos países, quatro em cada cinco
cidadãos referem que estão insatisfeitos ou muito insatisfeitos,
como é o caso do Chile, Arménia, Coreia do Sul, Ucrânia,
Peru, Paquistão e Hungria. Também na Rússia, Cazaquistão,
Equador, República Dominicana e Colômbia as populações
sentem-se igualmente muito descontentes, com três em cada quatro inquiridos
a expressarem essa insatisfação.
Não constituirá novidade que o ambiente se encontra mais ameaçado
nos países em desenvolvimento por comparação com a Europa
ou a América do Norte. O que este estudo revelou, porém, é
que as populações das economias emergentes estão plenamente
conscientes desta ameaça e começam a estar entre as nações
mais críticas relativamente às iniciativas governamentais neste
campo.
No que respeita aos direitos humanos, o panorama é igualmente desencorajador.
Em termos gerais, a parte do mundo onde a insatisfação parece
ser menor é a Europa Ocidental. Porém, este facto não impede
que dois em cada três cidadãos acredite que os direitos humanos
nem sempre são completamente respeitados nos seus países.
Os problemas mais graves parecem ocorrer na América Latina. Aqui, menos
de uma em cada oito pessoas crêem que os direitos humanos são respeitados
integralmente, cerca de um terço afirma que eles não são
respeitados de todo e pouco mais de metade (56%) acredita num respeito parcial.
O país com o testemunho mais pessimista é a Colômbia, onde
dois terços dos inquiridos admitem que eles não são respeitados.
De forma semelhante, os africanos e os europeus de leste têm uma confiança
extremamente baixa na observação geral dos direitos humanos nos
seus países.
Pelo contrário, o país com mais altos índices de confiança
é a Holanda, onde praticamente 70% da população é
da opinião de que aqui eles são cumpridos integralmente. A seguir
à Holanda, aparecem países como o Luxemburgo, a Noruega, a Dinamarca
e a Alemanha. Por estranho que os observadores ocidentais possam considerar,
os cidadãos de Singapura - onde as sanções incluem castigos
corporais -, mostram-se bastante satisfeitos com a observação
dos direitos humanos no seu país.
No entanto, é de sublinhar que em muitos países da Europa Ocidental
e da América do Norte os cidadãos sentem que os direitos humanos
não são completamente respeitados em várias áreas,
nomeadamente no que respeita à discriminação das mulheres,
referida por uma elevada proporção de cidadãos norte-americanos,
e à discriminação racial, mencionada frequentemente pelos
respondentes britânicos.
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