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Necessário mas incómodo

O anúncio do aumento de 2% no IVA dos produtos até agora taxados a 17% tem gerado alguma inquietação na sociedade portuguesa. Para perceber o porquê desta medida e as suas implicações, a Página da Educação falou com o economista Álvaro Aguiar, director do Centro de Estudos Macro-económicos e Previsão da Faculdade de Economia do Porto.

No contexto económico português, acha que esta é a medida mais correcta para resolver o problema do défice?
Não há dúvida de que esta é uma medida necessária. No entanto, eu preferia que tivesse sido acompanhada por medidas que visassem a redução das despesas. O problema do défice português está essencialmente ligado à elevada despesa.

Que implicações podemos esperar deste aumento?
O aumento do IVA pode ter efeitos contraccionistas na economia, vai diminuir a despesa por parte das famílias que vão gastar menos e talvez poupar mais. Com esses menores gastos, as empresas vão vender menos produtos, talvez fazer menos investimentos e pode haver uma contracção do crescimento económico. Com a contracção da procura e do crescimento económico a taxa de inflação também tem tendência a baixar, porque a procura das famílias reflecte-se no nível de preços. Mas o grande problema com o aumento da taxa do IVA é que depois vai ser muito difícil reduzi-la. Isto se este aumento puder ser visto como uma medida temporária, só para vigorar até 2004, data limite para equilibrar o orçamento [de Estado] e se entretanto as despesas baixarem... Porque senão, uma vez que subimos de 17% para 19% vai ser sempre uma tentação manter esta taxa do IVA. Até porque uma descida da taxa de 19% para 17% vai significar uma grande perda de receitas.

A competitividade das empresas portuguesas poderá ser afectada?
Não, porque a capacidade delas produzirem os bens ou melhor ou mais barato do que os seus concorrentes internacionais não vai ser afectada. Numa perspectiva optimista podemos ver neste aumento do IVA algumas virtudes. Se houver uma certa contracção no mercado interno, talvez algumas empresas desloquem as suas actividades mais para a exportação do que para o mercado interno. Claro que só o poderão fazer se tiverem competitividade, mas acho que pode haver uma certa mudança de agulhas do mercado interno para o externo. E de facto nós precisamos de aumentar as nossas exportações, neste momento isso seria muito positivo.

Mas corremos o risco de desacelerar o crescimento económico português?
Se não se fizesse nada e continuasse-mos com este défice enorme, provavelmente a crescer, seria desastroso para a economia portuguesa. No entanto o aumento do IVA vai ter aspectos contraccionistas, as famílias vão viver pior, vai criar um desaceleramento do crescimento económico, espero que temporariamente. Ainda assim pode ter um efeito positivo se implicar alguma propensão para a exportação nas empresas portuguesas. Através das exportações, podemos recuperar uma parte da dívida que os portugueses e os bancos intermediários, têm relativamente ao exterior. Enquanto andávamos a pedir empréstimos para a habitação e para crédito pessoal, os bancos estavam, por sua vez, a pedir emprestado ao exterior. Esta dívida paga-se exportando mais do que importando. Mas continuo a dizer que o melhor seria que não se tivesse de fazer este aumento e se fosse cortando as despesas, mas neste momento é inevitável um aumento das receitas.


  
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Edição:

N.º 113
Ano 11, Junho 2002

Autoria:

Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação
Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação

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