Le monde me répugne même si je suis solidaire des hommes qu`y souffrent.
Albert Camus
A educação multi-intercultural é uma necessidade e uma exigência
da sociedade actual.
É evidente e demasiado óbvio que o tema da interculturalidade/educação
continua actual.
O mundo em que vivemos é cada vez mais complexo e multicultural. Um mundo em
que as migrações são um fenómeno global, em que os grupos minoritários reclamam
o direito à diferença, mas que, ao mesmo tempo, sofre das maleitas da homogeneização.
As sociedades estão, hoje, confrontados com novos desafios e problemas provocados,
em boa medida, por aquilo que se designa por globalização. Acelerador das migrações
humanas, a globalização acentua a necessidade de se aprofundar a reflexão sócio-antropológica
em torno das questões étnicas e culturais.
É imperioso repensar o papel da Sociedade, do Estado e das instituições educativas
e a acção dos educadores e dos professores neste contexto económico, social
e político mais complexo, trespassado por desigualdades e exclusões dos mais
variados tipos, nomeadamente as que se relacionam com a identidade e a diversidade.
Falamos da educação para os valores, para a paz, para a cidadania, para os direitos
humanos e igualdade de oportunidades, para a tolerância e convivência, de educação
anti-racista e anti-xenófoba, etc. - Educação multi-intercultural. Porém, no
nosso dia-a-dia, somos, amiúde, confrontados com estereótipos e preconceitos,
com manifestações de intolerância, marginalização, racismo, xenofobia nos mais
variados espaços sociais.
Não obstante, como em tudo, é importante reconhecer que há maior sensibilidade
para a integração estrutural dos diferentes grupos minoritários (étnicos, migrantes,
culturais,...) na escola. Mas também sabemos que na sociedade não há uma preocupação
efectiva com os problemas dos mais desfavorecidos e dos novos pobres e excluídos.
A globalização económica, cega pela cultura do consumismo e individualismo,
tem dificuldade em respeitar a natureza, a dignidade humana e as culturas contra-hegemónicas.
E ao sacralizar o consumo, quebram-se os vínculos de cidadania e solidariedade,
espalhando o medo, o terror e o ódio.
Perante este cenário, há que lutar com valentia cívica e vigilância crítica
pelas convicções em que acreditamos: promover os direitos humanos e democratizar
as sociedades para além do Estado-nação, numa perspectiva transnacional.
Frequentemente, a propósito dos modelos de educação multi-intercultural, pensamos
nos contributos de John Dewey, já lá vão 50 anos, em relação à educação democrática.
Citamos de memória: A educação como uma tarefa da sociedade e a sociedade como
uma tarefa da educação. Este imperativo de ligar a educação à sociedade é fundamental.
Alguém tem que fazer esta ponte. É que sem educação não há cidadão e a cidadania
global não se constrói discriminando os grupos sociais subalternizados, violando
os direitos políticos e civis, económicos e sociais, ambientais, todos eles
interdependentes e a necessitarem de políticas que os legitimem.
Urge (re)inventar uma nova realidade política, económica, social e educativa.
Esta refundação de uma nova ordem mundial, transformadora/emancipadora e não
adaptadora, exige novas perspectivas críticas em educação que nos ajudem a encontrar
respostas a questões como as que enunciamos: como encontrar um passado para
o futuro, criando e reconstruindo tempos e espaços existenciais para unir e
não dividir?
Como lutar contra as desigualdades sócio-económicas e as exclusões sócio-culturais,
mostrando que outro mundo é possível?
Como encontrar coerências de sentido que conciliem a identidade com a diversidade,
promovendo a educação para a cidadania e a cultura solidária?
Como desocultar factos, processos e discursos que nos impedem de aprender a
viver juntos?
Este inventário de questões não é exaustivo, mas serve de pedra de toque para
orientar a construção da cidadania intercultural que vimos defendendo: um processo
partilhado que exige paz, segurança, habitação, igualdade, equidade, justiça,
solidariedade, liberdade, responsabilidade. Uma viagem em direcção ao outro
que só acontece quando aprendermos a gostar de nós e a superar as barreiras
entre o "nós" e o "outro".
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