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(En)cantos da leitura

Ler.
Este é, frequentemente, um verbo difícil para crianças e adultos. Não pela sua ortografia (3 letras apenas), não pela sua dicção (diz-se de uma assentada), mas pela acção que implica. Para uns ler é um prazer, um vício, uma necessidade, para outros é uma imposição, normalmente desagradável (da escola ou da profissão), uma verdadeira "dor de cabeça".
O gosto pela leitura está intrinsecamente associado aos estímulos que desde muito cedo se proporcionam à criança, antes mesmo do seu nascimento. O contexto familiar é de grande importância. Crescer no meio de livros e ver, à sua volta, as pessoas a ler pode ser um excelente início na formação de um leitor. Mas à escola cabe um papel primordial no desenvolver de actividades de reforço e/ou iniciação ao gosto pela leitura.
Os alunos não gostam muito de ler. Esta é uma opinião partilhada por muitos professores. Também na minha escola assim se pensa (apesar da Biblioteca Escolar aí funcionar há 4 anos). Este ano lectivo, tendo a responsabilidade de a coordenar, naturalmente que esta questão se tornou uma das minhas preocupações centrais. E foi neste quadro que decidi elaborar e aplicar, no passado mês de Outubro, um inquérito destinado às famílias de todos os alunos da escola. Teve uma dupla finalidade: diagnosticar os seus hábitos de leitura e envolvê-las num processo onde a cooperação entre escola e família é fundamental.
Esta minha iniciativa foi muito bem acolhida, considerando a alta taxa de retorno (dos 197 inquéritos distribuídos, receberam-se 146).
Foram as mães quem mais respondeu (73%), seguidas, de longe, pelos pais (19%); as mulheres continuam, assim, como primeiras responsáveis por tudo quanto de relaciona com a escola dos seus filhos. Também preencheram os inquéritos irmãos, tias e avós.
"Gosto muito" e "Gosto razoavelmente" foram as opções mais seleccionadas (97%) para responder à pergunta "Gosta de ler?". Dois terços dos inquiridos (69%) afirma ler "Todos os dias ou quase" e apenas uma pessoa nunca lê.
O género literário preferido é, sem dúvida, o romance, sendo o teatro o que menos lêem.
Elegendo como factores determinantes para a compra de um livro o tema (25%) e o autor (22%), 28% dos inquiridos leu entre 3 a 5 livros no último ano, havendo 11% que leu mais de 20 e 12% que não leu nenhum.
Relativamente ao hábito de leitura em conjunto (ler para ou com os filhos), a hipótese mais assinalada (37%) foi "Sim, todos os dias ou quase" sendo, na maior parte das vezes, por iniciativa da criança; só 6% afirma não ter esse hábito.
A última pergunta do inquérito era aberta e desafiava à escrita de actividades de incentivo à leitura na escola e em casa, o que foi feito por 62% dos inquiridos. Entre outras sugestões apresentadas, destaque-se: ouvir ler; ler em diferentes suportes, sozinhos e em grupo; falar sobre os livros, resumi-los e dramatizar as histórias; realizar debates temáticos, concursos, jogos; ir à Biblioteca; copiar o modelo do pai ou da mãe que lê; comprar livros desde muito novos. A maioria das sugestões formuladas pelos pais apontam para a escola.
Perante estes resultados, que concluir?
Em primeiro lugar, sobressai a importância que as famílias dão à leitura: afirmam gostar muito de ler e dizem fazê-lo frequentemente, no entanto, lêem poucos livros por ano (24% não leu mais que 1 ou 2 livros).
Em segundo lugar, é interessante constatar que são as crianças quem mais propõe a leitura acompanhada desafiando, provavelmente, as vidas atribuladas e cheias de afazeres dos seus pais.
Por último, e numa leitura comparada com os resultados do estudo Hábitos de Leitura - Um Inquérito à População Portuguesa (Eduardo de Freitas, 1997), pode-se concluir que os valores locais que obtive não estão longe dos nacionais.
As conclusões parecem insuficientes e levantam-me outras tantas questões: Que leitura faltará? Será a dos livros? Ler, para dar o exemplo. Seguramente que haverá muito a fazer no tempo da não leitura, mas as crianças agem muito por imitação, é preciso não esquecer. E se, num contexto familiar favorável à leitura, as crianças pouco lêem, o que estará então a falhar? O que deverá a Biblioteca Escolar reformular ou inventar para que o número de leitores aumente?
Várias são as estratégias que a Biblioteca da minha escola tem em curso, nomeadamente elaboração de um jornal on-line, troca de mensagens via e-mail entre a escola e a família, correspondência entre escolas de diferentes regiões, actividades plásticas que requerem a leitura de livros, requisição de livros para ler em casa, concursos de leitura, encontros com escritores, feira do livro..., além de sessões lúdicas regulares acerca de histórias.
Uma coisa é certa, criar hábitos de leitura não é tarefa fácil. Há que unir esforços, especialmente entre a escola e a família, para que as crianças sintam os encantos da leitura.

Betina Astride / Escola EB 1 nº 1 de Montemor-o-Novo

  
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Edição:

N.º 108
Ano 10, Dezembro 2001

Autoria:

Betina Astride
Agrupamento Vertical de Montemor-o-Novo
Betina Astride
Agrupamento Vertical de Montemor-o-Novo

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