Página  >  Edições  >  -  >  Docência e Investigação Universitárias São Incompatíveis

Docência e Investigação Universitárias São Incompatíveis

José Azevedo é professor e técnico de investigação na Faculdade de Letras. Concluiu a licenciatura em Psicologia na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação do Porto, ministrando posteriormente um curso de formação de professores na Universidade do Minho, na área de Psico- desenvolvimento, onde era ainda responsável pela cadeira de "Análise de Relação Pedagógica". De regresso ao Porto, realizou provas de aptidão pedagógica para integrar o curso de sociologia, leccionando um seminário no campo da investigação psicosocial. Após um período em Inglaterra, onde elaborou e apresentou a tese de Doutoramento, voltou ao Porto e iniciou a carreira de docência universitária na Faculdade de Letras, onde actualmente dirige um seminário de investigação em "Formas Sociais e Culturais de Modernidade" e a cadeira "Processos de Comunicação na Construção Social da Realidade". Divide a sua actividade profissional entre a docência e a investigação.

Um dos primeiros aspectos que insistiu em clarificar é a diferença entre o conceito de psicólogo e psiquiatra. Os nomes são parecidos, as actividades similares, mas têm um campo de acção bastante distinto. Mesmo a intervenção a nível dos modelos terapêuticos poderá ser semelhante, mas há que saber distinguir as abordagens: a primeira corresponde a uma componente orgânica e a outra a uma componente farmacológica. Existe também a tendência para pensar que a psicologia é uma área de intervenção "mais leve" do que a psiquiatria, mas tal não é verdade se se tiver em conta a "abordagem psicanalítica ou psicodramática".

Quando questionado acerca da investigação universitária em Portugal, aponta como principal crítica a escassez de dotação orçamental e de recursos humanos. As linhas de financiamento obtidas a partir dos fundos comunitários têm facilitado a criação e manutenção de projectos de investigação, mas continua a haver inúmeras restrições de ordem económica que impedem um verdadeiro salto qualitativo em relação ao desempenho e produção dos técnicos portugueses.

Além disso, "existem áreas de investigação onde as pessoas ainda não estão habituadas a participar, onde há falta de voluntários que se disponibilizem a servir de objecto de estudo". Um problema que, explica, se baseia no facto de ser ainda uma prática muito recente no nosso país e de haver uma certa distanciação e falta de abertura da sociedade pública portuguesa a estas questões. Os estudos que incidem sobre o comportamento dos casais, por exemplo. "É claro que não deixa de ser por isto que a investigação não possa continuar a ser desenvolvida, mas é um factor limitador", refere.

Por outro lado, existe um problema estrutural de carreira. Grande parte dos Professores Universitários envolvidos em actividades de investigação fazem-no para trabalhar na sua tese de doutoramento ou dividem o resto do seu tempo pela docência. Desta maneira, considera, "acaba por haver falta de pessoas que participem em linhas de investigação. Para concursos públicos, por exemplo, torna-se quase impossível constituir uma equipa".

Para contrariar esta tendência seria necessário reduzir a carga horária dos tempos lectivos e reforçar o estatuto da carreira de investigador em Portugal através da homologação da "carreira de técnico de investigação". Estabelecer um esquema mais flexível, em que as pessoas possam manter uma dinâmica investigacional e não se limitar à sua condição de funcionários de uma universidade".

NOVO ESTATUTO NÃO TRAZ VANTAGENS

No que respeita à docência, José Azevedo pensa que o nosso sistema de ensino é ainda muito "magistral", um sistema onde os alunos têm pouca autonomia e os seus trabalhos e métodos de avaliação se encontram muito centrados na figura do professor. "É um ensino tipo sebenteiro, em que os alunos estudam apenas pelas fotocópias e pelos apontamentos dados na aula. Não existe uma tradição de investigação fora desse espaço. Penso que os alunos estão demasiado socializados por este sistema, pelo que é urgente investir, não só nas bibliotecas e na variedade e número de títulos disponíveis, mas também na mudança de atitude".

Também aqui o problema de carreira subsiste: além de não existirem vagas em número suficiente, torna-se difícil progredir . Uma situação que a manter-se, diz, coloca problemas na revitalização e renovação dos quadros e impede o sistema de se auto-dinamizar. "Está-se a perder uma série de gerações de jovens que podiam estar a ocupar lugares e a desenvolver trabalho, mas cuja maioria está arredada dessa possibilidade".

Nesse sentido, "as universidades não deviam contratar apenas os seus alunos, sob pena de não se renovar essa dinâmica e de se abrirem novas perspectivas a nível da docência e da investigação", refere.

O novo Estatuto da Carreira Docente também merece alguns reparos da sua parte. "Há uma grande discussão em torno do estatuto e existe uma proposta que está a ser discutido. Mas tenho sérias dúvidas quanto ao seu conteúdo, porque coloca uma série de entraves à progressão na carreira". E a carreira de docente "já tem perdido muito terreno em termos remuneratórios para outras áreas de ensino, como o politécnico ou o secundário, e inclusivamente para a magistratura. Financeiramente, não corresponde ao prestígio que tem".

Ricardo Jorge Costa


  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Autoria:

Ricardo Jorge Costa
Jornalista do Jornal A Página da Educação
Ricardo Jorge Costa
Jornalista do Jornal A Página da Educação

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo