No final de Outubro, tinha tomado posse o XII Governo Constitucional, presidido por Cavaco Silva, que fez suceder Diamantino Durão a Roberto Carneiro no Ministério da Educação. Poucos dias depois, Portugal e o mundo despertavam finalmente para a dimensão trágica do genocídio que estava a acontecer em Timor-Leste desde que a Indonésia invadiu e ocupou a ex-colónia portuguesa (1975): no dia 12 de Novembro, os militares usurpadores perpetraram um massacre no cemitério de Santa Cruz, em Díli, assassinando cerca de 200 timorenses indefesos – difundidas pelas televisões de todo o mundo, as imagens captadas pelo repórter Max Stahl contribuiriam decisivamente para desencadear o processo de libertação e de independência do território.
1991 aproximava-se já do fim, mas, ainda em Dezembro, um novo jornal começava a circular nas escolas e pelas mãos dos professores, com a manchete Adeus Roberto: entra Durão, sai Carneiro. Era o número zero de «a Página da Educação», que também destacava: Programas escolares ignoram a questão de Timor.
Partindo de uma ideia que germinou e amadureceu colectivamente no âmbito do Sindicato dos Professores do Norte – e por ele subsidiada, a título da aquisição de exemplares para distribuição gratuita a todos os associados –, o jornal começou a ser produzido mensalmente por uma equipa multidisciplinar: docentes dos diferentes sectores, jornalistas, informáticos, fotógrafos e outros profissionais da comunicação visual (designers, ilustradores, gráficos). O cabeçalho remetia para a Educação, mas, desde o início, a PÁGINA abriu-se naturalmente às temáticas da Cultura e da Sociedade – áreas também privilegiadas para a promoção e o desenvolvimento de Educação Pública de Qualidade.
Revendo, agora, essa edição primordial (16 páginas), podemos recordar que o programa do Governo para a Educação, aprovado na Assembleia da República sem que o novo ministro sentisse necessidade de o defender, não tinha mais do que 1251 palavras, sendo que a expressão “professor” não era referida uma única vez.
Mas também éramos levados a pensar que O mundo é dos inovadores, a propósito de uma experiência de comunicação escola-família que estava a ser desenvolvida numa escola da Figueira da Foz, “uma espécie de multibanco que em vez de fornecer notas do Banco de Portugal, fornece as notas e outras informações referentes aos alunos que a frequentam”. E também podíamos reflectir sobre o ofício de Escrever, publicar e criticar, a propósito do III Congresso dos Escritores Portugueses, onde Saramago defendeu que “escrever e publicar são o mesmo ofício, porque cada uma destas funções seria nada sem a outra” –, o cronista sugere que se lhes “deveria talvez juntar o ofício da critica”. Ou da divulgação.
Contudo, o enfoque da PÁGINA Zero era a Educação Pré-Escolar, com as reivindicações dos educadores na sua Luta pela Identidade e com o testemunho de um Homem em profissão de Mulher. E, oportunamente, realçava o protagonismo cívico e político de outro professor, Barbedo de Magalhães, “na primeira linha da defesa do massacrado povo maubere”.
Com profissionais próprios, utilizando as tecnologias de informação disponíveis e os serviços de agências noticiosas, o jornal respeitava a tradição do preto-e-branco, mas inovava em termos de design (na época, provavelmente um palavrão), nomeadamente, concedendo ao texto-imagem a mesma dignidade do texto escrito. “Porque a comunicação também está a mudar”, anunciava-se. E a PÁGINA lá veio caminhando e, à sua maneira, contribuindo para a mudança: propondo, ensaiando, desafiando...
Exactamente um ano depois, começaram a ser introduzidas variações cromáticas na primeira página – Importante é o trabalho de pensar o trabalho, considerava o entrevistado, António Nóvoa – e na última, com uma serigrafia do poeta-pintor Abílio, então recentemente falecido. Foi um ano em que a PÁGINA divulgou uma mão-cheia de poemas e de poetas e em que entrevistou, entre outros, Armando Castro (a história tem sempre razão), Fernando Amaral (era do título de professor que mais se orgulhava), Luísa Cortesão (como intervir face aos constrangimentos), Salvado Sampaio (ensinar é subverter), Lurdes Maia (há ensino privado de qualidade), Nuno Grande (na educação, é melhor não fazer do que fazer mal).
Um ano em que (como posteriormente também aconteceria) a PÁGINA foi ao “estrangeiro” reportar exposições mundiais, estreias de filmes ou excursões de finalistas; em que foi ver como se namora nas escolas e como são pesadas as mochilas que os miúdos carregam diariamente; em que foi a congressos, seminários e encontros sectoriais... Enfim, um ano intenso, prometedor, gratificante. Com muitas páginas de vida(s), em número sucessivamente aumentando (16, 24, 32, 40, 48...), foram-se multiplicando entrevistados e colaboradores, permanentes e ocasionais, internos ou externos, espontâneos ou solicitados – todos eles, afinal, os verdadeiros artífices desta realidade que persiste!
Como projecto nascido no seio da classe docente, a PÁGINA criou um forte vínculo com os educadores/professores e os investigadores, mas também com outros interlocutores de pensamento e conhecimento, de ciência e cultura, constituindo um caso único no país – estatuto que mantém, ainda que agora a sua periodicidade seja diferente. De facto, após 17 anos de publicação ininterrupta, a empresa proprietária do título [ProfEdições, com maioria de capital do SPN] viu-se na contingência de suspender a sua publicação mensal, abrindo um novo ciclo na vida deste periódico.
Três factores principais “justificaram” a mudança. Por um lado, o anterior Governo excluiu do “porte pago” as publicações reconhecidas como de interesse público especializado em educação – a PÁGINA era o único periódico nesta situação e, sem esse apoio os elevados portes de correio tornaram-se incomportáveis para uma publicação que tem a agravante de estar excluída do mercado publicitário, fortemente concentrado e controlado.
Por outro lado, a concentração também na área da distribuição traduziu-se num quase monopólio de uma empresa, que na prática controla as publicações periódicas e que rescindiu unilateralmente o contrato existente com a ProfEdições, considerando que o volume de vendas não era suficientemente atractivo. Finalmente, a partir de Janeiro de 2008, e por razões orçamentais relacionadas com a reorganização da actividade sindical, decorrente das restrições impostas pelos sucessivos governos, o acordo entre o SPN e a editora foi reduzido a metade, ficando abaixo dos custos de produção do jornal – que, entretanto, foram acompanhando a inflação de encargos com serviços conexos à edição. E assim, desde Junho, a PÁGINA passou a este formato e a ser publicada no primeiro dia de cada estação do ano.
A estação mudou, e a edição de Inverno aqui está. Agora com outra estrutura dirigente, mas com os mesmos colaboradores/autores, a PÁGINA completa 18 anos de vida e continua a olhar para o Futuro. Com os objectivos traçados no seu Estatuto Editorial, nomeadamente:
– contribuir para a formação integral dos educadores/professores e dos profissionais da educação social;
– favorecer a cooperação entre instituições de investigação, ensino e educação, alunos e professores e demais interessados;
– assegurar e promover a expressão e o confronto de opinião em torno das questões suscitadas nas suas áreas de intervenção;
– manter com os leitores uma relação rigorosa, transparente e autónoma face a todos os poderes;
– assumir total liberdade crítica em relação a todas as pessoas e entidades, incluindo as que detenham a sua propriedade.
Como uma brisa fresca
Ana Brito Jorge
Sem senhas nem santos
Júlio Roldão
Para os professores e não só
Adriano Rangel
O futuro já começou: É já hoje!
Henrique Borges
António Baldaia
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